[O texto abaixo é da autoria de Tatiana de Mello Dias e foi publicado ontem no blogue Link do jornal O Estado de S. Paulo.]
A partir de agora, invadir ou adulterar computadores, criar programas
que permitam violar sistemas e divulgar dados obtidos sem autorização
pode dar multa e cadeia. A presidente Dilma Rousseff sancionou as leis
12735 e 12737, que tipificam os crimes eletrônicos no País.
Aprovada às pressas após o vazamento de fotos comprometedoras da atriz
Carolina Dieckmann, a lei 12.737 [que ganhou o apelido (sic) da atriz]
estabelece penas de multa e prisão para vários tipos de crimes digitais.
Quem violar mecanismos de segurança (como senhas) para obter segredos
comerciais ou conteúdos privados, por exemplo, poderá ficar preso por
até dois anos. Se houver divulgação ou comercialização dos dados, a pena
pode ser aumentada.
Quem criar um programa de computador “ destinado a permitir o crime de
invasão de computadores” poderá pegar até um ano de detenção – e a pena
pode ser aumentada se o crime foi cometido, por exemplo, contra
autoridades públicas ou resultar em prejuízos econômicos.
A outra lei, que foi aprovada pela Câmara no mesmo dia, é a Lei Azeredo
(antes, era PL 84/99), discutido desde o início da década passada. Da
redação original, considerada excessivamente restritiva (dava aos
provedores, por exemplo, a função de fiscalizar os usuários), restaram
apenas quatro artigos. A lei tipifica “condutas realizadas mediante uso de sistema eletrônico,
digital ou similares, que sejam praticadas contra sistemas
informatizados e similares”. A lei diz que os órgãos da polícia
judiciária estruturarão “setores e equipes especializadas no combate à
“ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou
sistema informatizado”.
Dois artigos foram vetados pela presidente. O 2º, que equiparava o
cartão de crédito ou débito a documento particular, e o 3º, que alterava
o Código Militar ao estabelecer punição para quem divulgasse dados
eletrônicos gerando consequências. Sem os vetos, os militares poderiam,
por exemplo, controlar os dados para tentar impedir o vazamento de
informações nos moldes do que fez o Wikileaks.
Parlamentares brasileiros discutem a necessidade da aprovação de uma lei
para definir os crimes eletrônicos desde o início da década passada. A
Lei Azeredo passou anos em discussão na Câmara dos Deputados e no
Senado, mas enfrentou uma forte oposição que resultou na apresentação de um projeto de lei alternativo, encabeçado pelo deputado Paulo Teixeira (PT-SP). O projeto foi aprovado às pressas após o episódio Carolina Dieckmann.
Marco civil
A votação dos projetos de lei que tipificam crimes digitais estava
prevista para o mesmo dia do Marco Civil da Internet, lei que definirá
direitos dos usuários de internet e padrões para atuações das empresas.
Mas, por falta de consenso, o projeto não foi levado a plenário.
[O texto acima não enfatizou devidamente um detalhe importante dessa legislação, para o qual o colunista Ronaldo Lemos, da Folha de S. Paulo, já alertava no início de novembro passado com o título "O que seria boa notícia virou problema político" quando os dois projetos de lei foram aprovados na Câmara. Diz Ronaldo:
"O que poderia ser uma boa notícia, torna-se um problema político. As
leis de cibercrimes deveriam ter sido aprovadas com o Marco Civil da
Internet, que assegura direitos no uso da rede.
Isso não aconteceu. O Marco Civil segue agora sozinho no Congresso, sujeito aos mais diversos tipos de lobby.
Com isso, inverte-se a ordem natural: primeiro regular a questão no
âmbito civil e só depois no criminal (o direito penal deve ser sempre
"ultima ratio", o último recurso quando tudo mais falha).
Fica assim a sensação de que se repetiu uma triste tradição: a de que os
problemas de "polícia" ganham precedência sobre todos os outros.
Inclusive sobre construir alicerces civis para o uso da rede, promovendo
inovação e previsibilidade. O que em si só reduziria a necessidade de
"polícia".]
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