segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Huawei, a gigantesca empresa chinesa de telecom, pode representar um risco à segurança cibernética do Reino Unido

O Reino Unido poderá enfrentar perdas de bilhões de libras em uma guerra comercial com a China, e ver o fracasso do lançamento de serviços de internet economicamente vitais de celulares em 4G se um relatório da área de inteligência, previsto para chegar às mãos de David Cameron dentro de duas semanas, concluir que as operações no Reino Unido (RU) da Huawei, uma gigante chinesa da área de telecomunicações, representam um risco à segurança cibernética do RU.

Segundo fontes da área de inteligência, Downing Street está preparada para enfrentar um forte e caro revide comercial de Beijing se optar por colocar a multinacional chinesa na lista negra, sob a alegação de que a empresa possui vínculos com o exército chinês e com base em receios de que seus equipamentos possam servir para que o governo chinês faça espionagem cibernética no RU.  Embora não seja uma marca de consumo de alto perfil no RU, a Huawei controla um quarto do mercado de equipamentos de telecomunicações da União Europeia (UE), tendo ganho mais da metade de todos contratos para infraestrutura tecnológica de 4G fechados pela Europa afora. A multinacional chinesa está fornecendo também tecnologia de 4G para a EE, a empresa que controla a Orange [empresa francesa, com forte presença no RU] e a T-Mobile [empresa alemã, com forte presença nos EUA], e assinou contratos semelhantes com a O2 e a 3UK, ambas presentes no mercado britânico.

Há também um contrato importante com a BT [British Telecom, empresa britânica de telecomunicações, presente em mais de 170 países] para atualização de sua rede de fibra óptica de banda larga -- outros clientes da Huawei no RU incluem a Vodafone, a BSkyB e a Virgin Media.  É provável, portanto, que haja produtos Huawei na maioria dos lares britânicos.

Preocupações com o potencial de espionagem cibernética estatal chinesa envolvendo a Huawei fizeram com que recentemente o comitê de inteligência da Câmara dos Deputados americana recomendasse que a empresa sediada em Shenzhen fosse impedida de operar em solo americano. Na Austrália, ela foi impedida de cotar para fornecer equipamentos para a lucrativa rede nacional de fibra óptica. Uma atitude semelhante está sob consideração no Canadá.

A Huawei não foi citada nominalmente em um relatório sobre telecomunicações emitido pela UE no início deste ano. Entretanto, o domínio de empresas chinesas no mercado europeu de telecomunicações foi descrito como um "risco significativo".  Bruxelas acredita também que o governo chinês esteja subsidiando às escondidas suas empresas líderes em telecom, permitindo-lhes solapar e, por fim, eliminar a presença no mercado de suas concorrentes europeias.

Uma figura de proa da indústria, falando ao The Independent on Sunday  (IoS) sob condição de anonimato, disse que se o governo optar por colocar a Huawei na lista negra "os custos seriam consideráveis para empresas de celulares e provedores de banda larga. A infraestrutura seria atingida, se as empresas não pudessem usar técnicos da Huawei para atender suas necessidades constantes de melhoria e reparos. Seria uma ameaça ao RU digital".

Embora o centro de inteligência para sinais do Reino Unido em GCHQ, em Cheltenham, tenha um laborário que há mais de dois anos vem checando e monitorando equipamentos novos da Huawei, Downing Street concluiu no início deste ano que as crescentes preocupações dos EUA e da UE com as empresas chinesas de telecom predominantes mereciam, por parte dos serviços de inteligência do RU, uma aceleração na avaliação de segurança dessas empresas. O Comitê de Inteligência e Segurança deflagrou a análise no outono. Tem-se como entendido que o Primeiro-Ministro tenha sido informado das conclusões desse relatório ainda sob a forma de minuta, antes do relatório final previsto para antes do Natal.

A promessa de David Cameron, no final de 2010, de dobrar para 62 bilhões de libras em 2015 significa que as conclusões do relatório podem provocar uma mudança de jogo nas ambições de comércio do RU com o novo líder chinês, Li Jinping, se a Huawei for colocada na lista negra. Mas, se Downing Street desautorizar publicamente as preocupações dos EUA, do Canadá e da UE como uma teoria de conspiração sem fundamento, Cameron estará se expondo a ser acusado de manter Beijing satisfeita às custas da segurança cibernética do RU.

Uma fonte sênior que atua próxima ao Conselho Nacional de Segurança, o comitê de gabinete responsável por supervisionar a coordenação da inteligência e da segurança, diz que se for encontrado malware  ou spyware em qualquer das operações da Huawei no RU "o governo então a colocará na lista negra".  Essa fonte disse que a situação permanece complexa, porque tecnologias novas avançadas têm frequentemente uso duplo.

Uma posição conciliatória, que se comenta estar sob consideração pelo governo, seria limitar o envolvimento da Huawei com contratos militares do RU ou contratos de Whitehall [rua londrina onde se concentram os órgãos administrativos do governo inglês]  -- a empresa chinesa fornece sistemas de defesa, como por exemplo a fiação de submarinos -- mas deixá-la livre para competir em outros setores. Mas, mesmo uma ação limitada contra a Huawei tomada pelo governo britânico seria vista por Beijing como um dano a uma de suas empresas de liderança tecnológica, com a possibilidade de retaliações pela China sob a forma de sanções comerciais.

Dr. Richard Clayton, do Laboratório de Computação da Universidade de Cambridge, disse que o foco internacional sobre o crescente domínio da China sobre infraestruturas de telecomunicações está centrado em "funções adicionadas", que podem ser secretamente embutidas em sistemas de grande porte e dar à China a capacidade de derrubar a rede de comunicação de outro pais. Ele disse ao IoS que aqueles que estão preocupados com o assunto receiam que "em períodos de tensão, portas secretas em centrais telefônicas ou em roteadores de Internet permitirão aos chineses desabilitar nossos sistemas de comunicações ou grampear as conversas de nossos líderes".

O relatório da Câmara de Deputados americana criticou a maneira pela qual as empresas chinesas, incluindo a Huawei, cooperaram com suas investigações. Ele informa que tais empresas consideravam qualquer informação interna como um "segredo de Estado", que só poderia ser tornado público com a aprovação do governo chinês. Isso, conclui o relatório, "apenas reforça as preocupações com o controle exercido pelo governo chinês sobre aquelas empresas". O relatório admite que a falta de evidências limitou a obtenção de conclusões claras e inequívocas. Entretanto, o relatório insiste em que as telecomunicações chinesas "dão ao governo chinês uma oportunidade para interferir na cadeia de suprimento de telecomunicações dos EUA".

A Huawei nega qualquer vínculo entre sua operações comerciais internacionais e espionagem patrocinada pelo governo. Em sua resposta ao relatório americano, ela disse que as alegações contra ela eram "um precedente monstruoso, que distorce o mercado e a política comercial e poderá ser utilizado em outros mercados contra empresas americanas". A Huawei considera que a crítica existente no relatório americano é mero protecionismo, tenuemente disfarçado. Um ministro acusou recentemente os EUA de retornar a uma "mentalidade de Guerra Fria".

Huawei: um negócio extremamente bem-sucedido

Zen Zhengfei, um ex-tecnólogo no Exército de Liberação do Povo (ELP), fundou a Huawei em 1988. A empresa ganhou seu primeiro contrato internacional em 1997 e é hoje o maior fabricante mundial de equipamentos para telecomunicações, com lucros perto de US$ 4 bi e operações em 140 países. Há dois anos, ingressou na Global Fortune 500 list, com vendas anuais estimadas em US$ 21,8 bi.

Huawei -- que significa "ação pela China" -- se autodefine como uma empresa "coletiva", não como uma companhia privada. Mas, um recente relatório americano alegou que ela tem vínculos estreitos com os militares chineses e apresentou documentação, dita ser oriunda de ex-empregados, vinculando-a com uma "unidade de elite de guerra cibernética dentro do ELP". A Huawei rejeita a alegação, classificando-a como uma fantasia. Há também alegações, sob investigação, de que instalações da Huawei na Índia desenvolveram equipamentos de telecom para os talibãs no Afeganistão.

A China é crucial para os planos de crescimento do governo britânico. A Huawei é parte desses planos -- investimentos no RU no final do ano passado ultrapassaram os 150 milhões de libras e devem acelerar, com seu papel de liderança na rede 4G da Internet. Uma reunião em setembro entre Ren e Cameron -- dois meses depois que pesquisadores americanos disseram ter descoberto "vulnerabilidades críticas" em roteadores da Huawei -- concentrou-se mais na expansão da Huawei no RU, novos empregos, e seu plano de dobrar para 1.000 pessoas sua força de trabalho europeia.


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