sábado, 22 de dezembro de 2012

Areia movediça

[O texto abaixo é da autoria de Naerco Menezes Filho e foi publicado ontem no  jornal Valor Econômico.]

Os últimos resultados do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foram decepcionantes e pioraram as expectativas dos agentes econômicos com relação ao crescimento econômico desse ano e para o ano que vem. Os investimentos estão estagnados e estamos perdendo terreno em relação aos demais países emergentes. Em vista disso, o governo acaba de lançar mais um pacote com prorrogação dos incentivos ao consumo, novas desonerações e reduções de impostos. Quais são as chances desse novo pacote vingar? O que está acontecendo com a economia brasileira?

Apesar de conter medidas na direção correta, como a simplificação na estrutura tributária, as chances desse pacote incentivar novos investimentos e acelerar o crescimento econômico são pequenas. O nosso problema é mais estrutural, fruto da alteração nos rumos da política econômica nos últimos anos. O principal problema é a excessiva intervenção do Estado em todos os aspectos da vida econômica e a crença de que um governo hiperativo será capaz de melhorar a situação de todos.

Na primeira década deste novo século tivemos um período de bonança em termos econômicos e sociais, fruto de vários fatores: as reformas liberalizantes do período FHC, o crescimento acelerado da China e as medidas inclusivas do período Lula, que fizeram com que os mais pobres também participassem do crescimento econômico. Nesse período, o Brasil cresceu em linha com seus pares latino-americanos, enquanto o desemprego, a informalidade, a pobreza e a desigualdade diminuíram significativamente. Caminhávamos para o nirvana.

Entretanto, a crise econômica mundial e a posse do novo governo provocaram uma forte alteração nos rumos da política econômica. Queda da taxa de juros, desvalorização forçada do real, aumento do papel dos bancos públicos e das empresas estatais, aumento ainda maior dos desembolsos do BNDES, políticas industriais e setoriais implementadas a todo o momento e complacência com os índices de inflação foram algumas das mudanças mais perceptíveis. Entretanto, as coisas não estão dando certo. Éramos felizes e não sabíamos?

Parece haver um grave equívoco de diagnóstico. O governo (e seus conselheiros) achava que a situação da indústria e os baixos níveis de investimentos eram devidos às altas taxa de juros, à excessiva valorização do câmbio e à concorrência internacional. Logo, tratou de baixar os juros, desvalorizar o câmbio e acionar uma série de medidas protecionistas. Porém, a indústria não respondeu, nem o resto da economia. Por que será? 

O governo parece esquecer que os rumos da economia são ditados por milhões de pequenos consumidores e empresários, que tomam pequenas decisões de consumo e investimento todos os dias. O excesso de intervencionismo na economia paralisa essas pessoas, que ficam sempre à espera de novas medidas, sem saber como elas irão afetar seu bolso no futuro próximo. Ao conceder cada vez mais subsídios a setores específicos, o governo compromete sua situação fiscal, alimenta a inflação e cria um ambiente de incertezas. Isso faz com que as grandes empresas fechem seu departamento de P&D e abram um escritório em Brasília, para marcar reuniões com o ministro da economia e "demonstrar" como a sua situação desesperadora justifica mais proteção e incentivos.

O diagnóstico correto deveria partir da constatação de que o nosso maior problema hoje em dia é a baixa produtividade das nossas empresas. Poderíamos produzir muito mais com o mesmo número de trabalhadores. Para melhorar a produtividade, nós precisamos, em primeiro lugar, conduzir a economia de modo sereno, sem mudanças bruscas a todo o momento, nem políticas específicas para cada setor. Devemos nos concentrar em pequenas reformas horizontais, que simplifiquem o ambiente de negócios como um todo e estimulem a inovação.

A política de escolher grandes campeões nacionais também é equivocada. O aumento da produtividade tem que se dar em todas as pequenas empresas, em todos os setores da economia, incluindo comércio e serviços. Cada pequena padaria teria que produzir o máximo de pães e cafés com o menor número de trabalhadores. As que forem ineficientes têm que ser eliminadas do mercado. O processo de inovação é doloroso e implica, como dizia o famoso economista Schumpeter, um processo de destruição-criadora. Vários negócios têm que deixar de existir para que novas empresas, que tomaram decisões arriscadas de inovação, se expandam e transmitam o aumento da produtividade para o resto da economia. A busca por maiores lucros por meio de inovações tem que ser estimulada. A proteção atua na contramão.

Para que a busca por lucros não provoque desigualdade, é necessário preservar a concorrência e investir pesadamente em saúde e na qualidade da educação, para que todos possam ganhar com as inovações. Assim, os trabalhadores ganharão maiores salários nas empresas inovadoras e os empreendedores criarão novas empresas. É necessário também ter um mercado de trabalho flexível para que os trabalhadores que perderam o emprego nas empresas que não deram certo consigam se empregar rapidamente em novos setores.

Em suma, ao tentar acelerar a economia de forma atabalhoada, o governo está se arriscando a jogar pela janela tudo o que foi conquistado com árduo esforço nos últimos anos. É necessário reduzir o ativismo governamental, aumentar a concorrência e dar espaço e previsibilidade para que consumidores e empresários tomem suas decisões. O governo parece estar no meio da areia movediça, quanto mais se mexe, mais afunda. Neste momento, menos é mais. Boas festas para todos!

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