sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Apenas uma das 426 Caixas de Poupança alemãs será controlada pelo BCE

[Mais uma comprovação do poder da Alemanha na União Europeia (UE), ratificado no recentíssimo acordo de supervisão bancária pelo Banco Central Europeu(BCE). Já fiz duras críticas à severa pressão que os alemães fazem sobre a Grécia combalida, por exemplo, mas estou me convencendo de que estão quase absolutamente certos. Eles aprenderam a lição da hiperinflação dos fins da República de Weimar, que acabou desembocando em Hitler, os horrores da guerra e as dificuldades do pós-guerra, e recuperaram a força e o prestígio do país. Não se pode esperar a condescendência deles com um país que funcionava com rédea solta e, embora valendo cerca de apenas 2% da economia da UE, ameaça arrastar para o abismo 26 outros países (os demais 16 que, com a Grécia, compõem a zona do euro e os 10 que não adotaram a moeda única). A reportagem traduzida abaixo foi publicada ontem no jornal espanhol El País.]

A chanceler alemã tinha razões para estar contente com o acordo para que o BCE se encarregue da supervisão dos bancos da UE  com mais de 30 bilhões de euros em ativos. O listão desses bancos que ficaram sob a supervisão do BCE deixa fora do controle europeu praticamente todas as caixas de poupança alemãs, cuja saúde financeira gera enormes dúvidas e acumulam ativos de cerca de 1 trilhão de euros. Apenas uma das Sparkassen (Caixas de Poupança) alemãs superava os 30 bilhões de euros em ativos no final de 2011. Em contraposição, na Espanha, Mario Draghi [o presidente do BCE] será o encarregado da supervisão de todo o setor financeiro do país.

O sistema financeiro alemão é formado por três grandes grupos de entidades. Por um lado, estão os bancos privados, com Deutsche Bank e Commerzbank na liderança. Por outro, estão os bancos regionais (os Landebanken), uma espécie de caixas de poupança de tamanho médio ou grande nas quais se concentrou boa parte da faxina feita pelo governo alemão para eliminar o lixo que contaminava seu setor financeiro. As mais importantes superam com folga o requisito do listão dos 30 bilhões de euros em ativos, mas as que tinham problemas foram saneadas  às custas do contribuinte. Em terceiro lugar estão as caixas de poupança locais, as Sparkassen, uma lista grande de pequenas entidades locais cujo estado de saúde financeira é uma grande incógnita, mas que juntas somam um volume enorme de ativos. Nenhuma delas se submeteu ao teste de resistência [stress test] da autoridade bancária europeia, e quase todas ficaram fora do alcance do supervisor único europeu.

Segundo as estatísticas mais recentes publicadas pela Deutsche Sparkassen und Giroverband (DSGV) [União das Caixas de Poupança e das Instituições de Giro Financeiro Alemãs, em tradução livre], a associação patronal das pequenas Caixas alemãs, com dados do fechamento de 2011 divulgados no mês de agosto passado, havia na Alemanha um total de 426 Sparkassen [arquivo em formato pdf acessível pelo artigo em espanhol]. De todas elas, a única que superava o teto de 30 bilhões de euros em ativos era Caixa de Poupança Hamburguesa (Hamburguer Sparkasse), da cidade de Hamburgo, com 39,467 bilhões de euros em ativos, embora houvesse também perto desse limite a Sparkasse KölnBonn (29,616 bilhões) da cidade de Colônia e, um pouco mais longe, a Kreissparkasse Köln, da mesma cidade, com 25,206 bi de euros em ativos. A partir daí, nenhuma instituição supera os 20 bilhões de euros em ativos, e apenas oito estavam acima dos 10 bi de euros em ativos. A menor de todas é a Stadtsparkasse Bad Sachsa, da cidade homônima, com 130 milhões. Uma centena delas está abaixo do 1 bi de euros em ativos.

Os principais bancos da zona do euro em ativos (clique na imagem para ampliá-la) - (Gráfico: El País).

A partir desses dados, apenas uma das 426 Sparkassen ficaria sob vigilância europeia. Dados seu caráter local e o tamanho da economia alemã, essas entidades tampouco cumprem as duas outras exigências que as fariam ficar sob a lupa do BCE: a internacionalização, ou que seus ativos ultrapassem os 20% do PIB do país.

O risco do conjunto

O problema é que, embora cada instituição financeira isoladamente não apresente grande risco, em seu conjunto no entanto somam cerca de 1 trilhão de euros em ativos, algo como os ativos somados de Santander, Caixabank e BBVA na Espanha. Segundo fontes financeiras, essas instituições equivalem a cerca de 20% dos ativos locais da banca alemã. 

Frente a essa situação, na Espanha praticamente todo o sistema financeiro ficará sob o controle do BCE. São 16 as instituições que, atualmente, ultrapassam os 30 bi de euros em ativos, incluindo aquelas nacionalizadas como BFA-Bankia, NCG Banco e Catalunya Banc.

[...]

Na realidade, o sistema financeiro espanhol já está sob intervenção e tutelado pelas autoridades europeias, razão pela qual o governo espanhol solicitou ajuda (resgate) para recapitalizar as insituições com problemas.

Ainda que o BCE vá se apoiar em supervisores locais para vigiar o sistema financeiro europeu, o fato de ter responsabilidade direta sobre umas 200 instituições o obrigará a contratar centenas de empregados -- alguns falam de um milhar -- para reforçar sua capacidade de vigilância e controle, segundo economistas e especialistas consultados pela Bloomberg.  Isso pressupõe uma ampliação significativa de sua atual força de trabalho de uns 1.600 empregados. As atividades de política monetária e as de supervisão terão que estar rigidamente separadas, para evitar conflitos de interesses.

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