quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Acelera-se o aquecimento da Antártica

[Enquanto os cientistas não se entendem sobre as razões disso, o clima do planeta continua cada vez mais doido e preocupante. O desaparecimento do gelo da Groenlândia e do Ártico está começando a deixar de ser só uma profecia apocalíptica para assumir contornos de trágica realidade. Os países dominantes da Terra, e seus cientistas, vão esperar até quando?!]

A Antártica vem dando muito trabalho aos cientistas do clima, quando se trata de determinar o efeito do aquecimento global sobre ela e sua evolução futura. Mas, pouco a pouco vão se acumulando estudos e dados que mostram que, também no continente branco, estão aumentando as temperaturas médias e, em algumas de suas zonas, isso se faz muito rapidamente. De fato, na região ocidental do continente branco foi registrado um aumento de 2,4 graus centígrados desde 1958 até agora, o que significa quase o dobro do que se havia estimado para essa zona e o triplo da média do planeta, de acordo com uma pesquisa recente que conseguiu reproduzir a evolução da temperatura do ar da região no último meio século. O valor máximo ocorreu no verão austral de 2005.

"Nosssos registros sugerem que o aquecimento estival continuado na Antártica ocidental pode alterar o equilíbrio da massa superficial da capa de gelo, de tal modo que a região poderia contribuir ainda mais do que agora para o aumento do nível do mar", explica David Bromwich, cientista da Universidade de Ohio (EUA), que chefiou a nova pesquisa, apresentada na edição de 23 de dezembro corrente da revista Nature Geoscience.  Seu colega, Andrew Nomaghan, do Centro Nacional para Pesquisa Atmosférica, dos EUA, (NCAR, em inglês), também americano, enfatiza que esses dados situam a região entre as de mais rápido aquecimento da Terra, como assinala a Universidade de Ohio.

O ANO MAIS QUENTE NA ANTÁRTICA OCIDENTAL
Temperatura média em janeiro na estação antártica Byrd, em graus centígrados

Fonte: G. Picard (LGGE)/El País

Bromwich e seus colegas pesquisaram a região ocidental, frente ao mar de Amundsen, baseando-se nos dados meteorológicos registrados na base Byrd, situada a uns 1.100 km do Polo Sul.

Sabia-se que a península antártica, apelidada de o Caribe do continente branco, é uma zona de aquecimento rápido, com um incremento de temperatura superior a 2,5 graus no último meio século, segundo dados do IPCC (sigla inglesa para Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas). Entretanto, as coisas não estão tão claras em outras zonas. O problema é que a complexa circulação oceânica que circunda a Antártica dificulta muito a pesquisa e a modelagem da mudança climática que ocorre ali, a ponto de ser essa a região do planeta em relação à qual os cientistas têm mais incertezas. Mas, os estudos estão avançando em bom ritmo e foram obtidos resultados importantes nos últimos anos, de modo que uma boa parte do próximo relatório do IPCC, o AR5, é dedicada ao continente branco, reduzindo-se as incertezas de maneira expressiva.

Os registros meteorológicos na estação Byrd começaram em 1958, com o Ano Geofísico Internacional. O problema é que, desde então, as medições não têm sido contínuas, já que a base não tem sido permanente o tempo todo (ocupação no inverno e no verão) e os equipamentos automáticos de registros de dados  têm às vezes sofrido defeitos [a estação Byrd operou como estação de pesquisa o ano todo até 1972, quando passou a operar como tal apenas no verão; foi usada até 2004-2005, e em 2009 deu-se início à sua retomada como centro de pesquisas].  O que Browich e seus colegas fizeram foi restabelecer toda a série de medições de temperatura do ar próximo à superfície na zona, completando a informação através da interpolação de dados com registros de outras estações.

"Há provas inequívocas  de que a capa gelada da Antártica ocidental está contribuindo para a subida do nível do mar -- entretanto, as mudanças na temperatura em décadas recentes continuam padecendo de incertezas", escrevem os pesquisadores na Nature Geoscience, apresentando o problema. Explicam que a região provavelmente se aqueceu desde 1950, "mas não há acordo [entre os especialistas] sobre a magnitude, a sazonalidade e o alcance espacial desse aquecimento".  Sua conclusão, após a pesquisa, é que a zona está efetivamente sofrendo um aumento da temperatura, que é significativo durante o verão austral, particularmente em dezembro e janeiro, a temporada de degelo máximo.

A região estava sob suspeita dos especialistas climáticos, já que ali, na costa do mar de Amundsen, vem aumentando a perda de gelo no mar nos últimos anos devido à diminuição da espessura e ao derretimento da capa de gelo, o que desencadeia o aumento na temperatura da água. Mas, havia dúvidas quanto à temperatura do ar. A pergunta que Bromwich e seus colegas se fazem é se a Antártica ocidental está a ponto de ficar parecida à Groenlandia, no que se refere a degelo. "O aquecimento máximo registrado em 2005 é uma manifestação dessa transição?", perguntam.

Por enquanto, os dados desses especialistas mostram que entre 1958 e 2010 houve naquela região um aquecimento de 0,47 graus centígrados por década, acumulando um aumento de 2,44 graus em 52 anos. Além disso, os cientistas chamam a atenção para a necessidade de se ter na região uma boa rede para fazer observações meteorológicas de longo prazo.

Termostato do planeta

As regiões polares são como um termostato global que regula o sistema climático da Terra, explica o órgão Pesquisa Antártica Britânica (BAS, na sigla inglesa). As superfícies geladas ajudam a resfriar a atmosfera ao refletir para a atmosfera a radiação solar que é absorvida pelas águas escuras dos oceanos. As águas geladas são cruciais no sistema de correntes oceânicas que distribuem o calor por todo o planeta, e o oceano austral que rodeia o continente branco é um absorvedor natural de dióxido de carbono.

"A maior parte das séries grandes de medições das estações de pesquisas da Antártica mostram que não há uma tendência significativa nem para o aquecimento nem para o resfriamento, e as temperaturas na maior parte do continente [antártico] têm sido relativamente estáveis na última década",  assinalam os especialistas do BAS. Mas, enfatizam que a situação é totalmente diferente na Península Antártica, em cuja costa ocidental as temperaturas aumentaram quase 3 graus centígrados nos últimos 50 anos, "umas 10 vezes a média global", um aumento só igualado no Alasca e na Sibéria  [e pensar que está previsto o incremento de perfurações em busca de petróleo no Alasca ...]. E, advertem aqueles especialistas, as águas da corrente circumpolar antártica estão se aquecendo mais rapidamente que o resto do oceano global. Agora, a recente pesquisa de David Browich e seus colegas parece estender à Antártica ocidental a zona de aquecimento particularmente alto.

[O Estadão publica outros detalhes das pesquisas de Bromwich & equipe. O professor David Bromwich, da Ohio State University, acredita que o estudo revela que o planeta ultrapassou um limite crítico. "O fato de que as temperaturas estão aumentando no verão significa que a WAIS vai se derreter não só a partir da parte de baixo, como já observamos hoje, mas também a partir da parte de cima (WAIS = sigla inglesa para "placa de gelo da parte ocidental da Antártica")".

Atividade humana ou mudança natural?

Estudos anteriores publicados na revista científica Nature indicavam que a temperatura da WAIS estava aumentando devido ao aquecimento do oceano, mas a nova pesquisa indica que a atmosfera também está desempenhando um papel importante.  "Estamos observando um impacto mais dinâmico que ocorre devido às mudanças climáticas que acontecem em outros lugares do globo e aumentam o acúmulo de calor na WAIS", diz Monaghan. 

A pesquisa não revela o grau de influência da atividade humana no aquecimento registrado na Antártida.  "Esta questão ainda está em aberto. Este estudo não foi feito. Minha opinião é de que provavelmente existe [impacto da atividade humana no aquecimento da Antártida], mas não posso dizer isso com certeza". Para o professor Bromwich, um estudo para determinar esta questão específica precisa ser feito agora. 

Um dos temores dos cientistas é que aconteça desabamentos de grandes pedaços de geleiras, como ocorreu em 2002 com o segmento conhecido como Larsen B. Em apenas um mês, o Larsen B se desprendeu da massa de gelo do continente. "Essa é uma preocupação do derretimento constante do oeste da Antártida, se os padrões de temperatura continuarem assim no verão". (Vejam o vídeo do maior rompimento de iceberg já filmado no Ártico.)]

Área com degelo superficial, em janeiro de 2005 [sin deshielo = sem degelo; - días con deshielo = dias com degelo] - clique na imagem para ampliá-la - (Fonte: G. Picard(LGGE)/El País).

Imagem de satélite mostra região oeste da Antártica que está se aquecendo (em amarelo) - (Foto: NASA).


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