segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

O dia em que Einstein morreu: fotos inéditas

[O texto abaixo é da revista americana Time.]

Albert Einstein (1879-1955), cujas teorias explodiram e reformularam nossas ideias sobre o funcionamento do universo, morreu em 18 de abril de 1955 em Princeton (EUA) vítima de um aneurisma da aorta abdominal, aos 76 anos. Seu funeral e sua cremação foram cerimônias completamente privadas, e apenas um fotógrafo conseguiu registrar os eventos desse dia extraordinário: Ralph Morse, da revista Life.

Armado com sua câmara e uma caixa de uísque -- para abrir portas e soltar línguas -- Morse fez calmamente um registro intenso da morte de um ícone do século 20. Mas, à exceção de uma foto hoje famosa -- do gabinete de trabalho de Einstein exatamente como ele o deixou, tirada poucas horas depois de sua morte -- as demais fotos que Morse tirou naquele dia nunca foram publicadas. A pedido do filho de Einstein, que pediu que a privacidade da família fosse respeitada enquanto eles o velavam, os editores da Life decidiram não publicar a reportagem completa, e por mais de cinco décadas as fotos de Morse ficaram esquecida nos arquivos da revista.

A história de como Morse conseguiu as fotos, entretanto, é um exemplo típico de tenacidade e rapidez de raciocínio.

Depois de receber uma chamada de um editor da Life naquela manhã de abril, dizendo-lhe que Einstein havia morrido, Morse agarrou sua câmara e dirigiu as noventa milhas de sua casa ao norte de Nova Jersey até Princeton. "Einstein morreu no hospital de Princeton", Morse disse à Life.com, "então, foi para lá que fui primeiro. Mas lá estava um caos -- jornalistas, fotógrafos, curiosos. Fui então para o gabinete de trabalho de Einstein. No caminho, parei e comprei uma caixa de uísque. Eu sabia que as pessoas poderiam estar relutantes para falar, mas a  maioria das pessoas fica contente em ganhar um trago em vez de dinheiro em troca por sua ajuda. Fui então para o prédio [do escritório de Einstein], procurei o zelador, dei-lhe uma garrafa de uísque e num instante ele abriu o escritório".

Ao entardecer, o corpo de Einstein foi transferido por um curto espaço de tempo do hospital para uma funerária em Princeton. O caixão simples com o corpo, já autopsiado, ficou na funerária por uma hora ou pouco mais. Morse foi para lá, e logo viu dois homens colocando um caixão num carro funerário. Pelo que sabia, Morse viu que o enterro de Einstein era iminente. Esperando conseguir um lugar perto da sepultura, ele foi rapidamente para o cemitério de Princeton. "Fui para lá para descobrir onde Einstein seria enterrado", recorda Morse. "Mas, pelo visto devia haver dezenas de sepulturas sendo cavadas naquele dia! Vi um grupo cavando uma sepultura, lhes ofereci uma garrafa de uísque e lhes perguntei se sabiam de alguma coisa. Um deles me disse: "Ele será cremado dentro de cerca de vinte minutos, em Trenton!" - "Dei-lhes então o resto do uísque, peguei meu carro e cheguei ao crematório de Trenton pouco antes dos amigos e familiares de Einstein aparecerem".

"Não tive que dizer a ninguém de onde era", disse Morse sobre o tempo que passou tirando fotos naquele dia. "Era o único fotógrafo lá, e era tido como certo que se houvesse um fotógrafo no local as chances eram grandes de que ele fosse da Life".

Em algum momento, no começo do dia, Hans, o filho de Einstein, perguntou a Morse seu nome.  Uma pergunta aparentemente insignificante e amistosa que, em poucas horas, mostraria ter implicações importantes. "À medida que o dia ia terminando, eu estava muito excitado", lembra-se Morse, "porque sabia que era a única pessoa ali com aquelas fotos.  Isso era um grande furo! Einstein era uma enorme figura pública, mundialmente famoso, e tínhamos essa história fesquinha". Morse partiu para Manhattan e para os escritórios da Life, certo de que seria festejado por seu furo.

"Cheguei a Nova Iorque com o filme, e havia lembretes por toda parte no escritório: "Ralph, fale com Ed!". Ed Thompson era o editor-chefe da Life. Um grande jornalista.  Ed disse: "Ralph, ouvi dizer que você tem uma danada de uma notícia exclusiva". Respondi: "É, acho que tenho". Ele disse "Bem, não vamos publicar isso". Fiquei chocado. Aconteceu que Hans, o filho de Einstein, ligou para a revista enquanto eu estava a caminho e pediu-lhe que não publicasse a notícia e respeitasse a privacidade da família.  Assim, Ed decidiu matar o assunto. Você não pode tocar uma revista sem um editor que tome esse tipo de decisão, e Ed havia tomado a sua. Então pensei "Bem, assim é", e parti para minha tarefa seguinte. Imaginei que as fotos jamais fossem ver a luz do dia, e as esqueci completamente".

Aqui, quase 60 anos depois, Life mostra uma seleção das fotos daquele dia -- fotos que captam a cena em uma manhã de primavera em Nova Jersey, quando Ralph Morse se viu correndo em uma cidade da Ivy League [Liga de Hera, em tradução literal -- designação dada a um grupo de oito universidades privadas do nordeste dos EUA, entre as quais se inclui a Universidade de Princeton]  tentando descobrir o destino do falecido, grande Albert Einstein ...

Para finalizar: a história do cérebro de Einstein, mais estranha do que a ficção -- que o Dr. Thomas Harvey (que aparece na última das fotos) polemicamente retirou durante a autopsia, cuidadosamente o cortou em fatias, e cuidadosamente o guardou durante anos para ser pesquisado. As histórias há longo tempo associadas a esse órgão são complicadas para serem abordadas aqui. Entretanto, Ralph Morse, no dia em que Einstein morreu, conseguiu tirar uma fotos rápidas do Dr. Harvey no hospital. Morse diz ter certeza de que o cérebro que aparece na última foto da série, sob o bisturi do médico, não  é o cérebro de Einstein.

Então, após uma pausa, Morse diz: "Você sabe, isso foi há cinquente e cinco anos atrás. Não me lembro de cada detalhe. Portanto, o que quer seja que ele esteja cortando ali ...". Suas palavras pairam no ar. Então, maliciosamente, Morse sorri.

[Recentemente, surgiram novas constatações sobre o cérebro de Einstein. Um estudo com 14 novas fotografias do cérebro do físico Albert Einstein chegou à conclusão de que a massa cinzenta daquele que é considerado um dos maiores gênios de todos os tempos era diferente em diversos aspectos. Pesquisadores da Universidade do Estado da Flórida, nos Estados Unidos, analisaram as imagens e as compararam aos padrões estruturais de outros 85 órgãos semelhantes separados em outros trabalhos.

A descoberta mais impactante se refere aos padrões complexos de certas partes do córtex cerebral de Einstein, principalmente no córtex pré-frontal e no visual. O primeiro é importante para o pensamento abstrato e pode ter sido fundamental para a realização das experiências do físico.

Líder do estudo, a antropóloga Dean Falk também percebeu características incomuns no córtex somatossensorial, que recebe as informações sensoriais do corpo. Os pesquisadores envolvidos no trabalho sugeriram que a área possa estar relacionada às habilidades de Einstein no violino. [ver: "The cerebral cortex of Albert Einstein: a description and preliminary analysis of unpublished photographs" -- "O córtex cerebral de Albert Einstein: uma descrição e uma análise preliminar de fotografias não publicadas" -- Dean Falk, Frederick E. Lepore & Adrianne Noe, em "Brain - A Journal of Neurology" ("Cérebro - Um Jornal de Neurologia"), agosto de 2012].

Em 1955, durante a autopsia do físico, o patologista Thomas Harvey removeu o cérebro e o conservou em formol, sem antes deixar de realizar varias fotos, para só então cortá-lo em 240 blocos. Em seguida, dividiu as partes em aproximadamente 200 lâminas para estudo microscópico. As imagens e as lâminas foram distribuídas a pesquisadores pelo mundo.


A autopsia, na época, revelou que o cérebro de Einstein era menor que a média e outras análises posteriores não descobriram algo que fosse anormal. Alguns anos depois, porém, pesquisadores descobriram que partes do cérebro continham uma quantidade anormal de um tipo de células chamadas gliais, que proporcionam suporte e nutrição aos neurónios. O lobo parietal, relacionado a funções espaciais e visuais, também possuía um padrão diferente de sulcos e rugas.]
As fotos apresentadas abaixo (excluindo as referentes ao Brasil) são todas de Ralph Morse para a revista Life, feitas no dia em que Einstein morreu e foi enterrado.  Clique nas imagens para ampliá-las.
 O escritório de Einstein -- exatamente como ele o deixou -- fotografado pouquíssimas horas depois de sua morte. Princeton, Nova Jersey, abril de 1955.

Papéis de Einstein, seu cachimbo, o cinzeiro e outros pertences pessoais em seu escritório em Princeton, 18 de abril de 1955.

O caixão de Albert Einstein, removido por curto espaço de tempo do hospital de Princeton para uma funerária, abril de 1955.

A partir da esquerda: mulher não identificada; o filho de Einstein, Hans Albert (de terno claro); mulher não identificada; a secretária de longa data de Einstein,  Helen Dukas (de sobretudo claro); Dr. Gustav Bucky (parcialmente oculto por Dukas), chegando ao crematório Ewing, de Trenton, Nova Jersey, 18 de abril de 1955.

Grupo a caminho do velório de Einstein, passando pelo carro fúnebre que levou seu caixão desde Princeton, abril de 1955.

Homem não identificado abre a porta do carro para a secretária de Einstein, Helen Dukas, após a cremação do físico, abril de 1955.

Amigos e familiares se dirigem para seus carros, após a cerimônia funerária de Einstein em Trenton, abril de 1955. A cerimônia foi rápida: Otton Nathan, amigo de Einstein,  um economista em Princeton e coexecutor do espólio de Einstein, leu algumas linhas do grande poeta alemão, Goethe. Imediatamente em seguida, o corpo de Einstein foi cremado.
 Depois dos funerais, amigos e familiares retornam à casa de Einstein na Mercer Street 112, em Princeton, onde ele morou por 20 anos - 18 de abril de 1955.

Dr. Thomas Harvey (1912-2007) foi o patologista que fez a autopsia de Einstein no hospital de Princeton em abril de 1955. Não se sabe se o cérebro que manuseia era o de Einstein.
 Foto de Albert Einstein para o Prêmio Nobel de Física, em 1921 - (Foto: Wikipedia).


Notícias e imagens da visita de Albert Einstein ao Brasil em maio de 1925 - (Fonte: Google)

Clique nas imagens para ampliá-las.










[A nota dissonante na recepção a Einstein e sua teoria da relatividade [no Brasil] foi dada logo depois da sua partida, em polêmicoartigo publicado no O Jornal de 16 de maio, de autoria de LicínioCardoso, professor de mecânica racional na Escola Politécnica. Intitulado Relatividade Imaginária, o artigo traz o seguinte comentário sobre o livro de Einstein La théorie de la relativité restreinte et genéralisée ["A teoria da relatividade restrita e geral", em tradução direta: "A cada página, pode-se dizer, da obra eu encontrava proposições análogas: umas confundindo o objetivo com o subjetivo, outras afirmando coisas de impossível realização, outras estabelecendo conceitos elementaríssimos e velhos como se fossem novos, tudo, está claro, no meu fraco entender; outras produzindo afirmações incompreensíveis como esta ‘Nous verrons plus tard que ce raisonnement qui s’appelle dans la Mécanique Classique le theorème de la composition des vitesses n’est pas rigoureux et, par conséquent, que ce theorème n’est pas vérifié en réalité’. O que tem a lei abstrata da composição das velocidades com a velocidade particular de cada corpo? Sempre a confusão entre o abstrato e o concreto (...) Demonstrei que o professor Einstein, confundindo os pontos de vista abstrato e concreto, toma por objetivo o que é subjetivo e vice-versa e não distingue entre ciência abstrata e relações particulares das existências concretas". (In: Moreira e Videira, p.131).]
Que figuraça esse Licínio Cardoso, hem?! 


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