[O texto abaixo é da autoria de Julia Wiltgen e foi publicado hoje no site da revista Exame.]
A rentabilidade de dois dígitos no Brasil está ficando para trás. Ao
menos por ora, pode-se dizer que ficou para trás mesmo, depois que os títulos públicos mais rentáveis passaram a pagar menos de 10% ao ano. Ou seja, a sonhada rentabilidade de 1% ao mês na renda fixa conservadora já é realmente um sonho distante. Nesse novo cenário, será que o Tesouro Direto continua sendo um bom investimento?
Quando se consideram apenas as aplicações financeiras mais seguras em
termos de garantia, a resposta é sim. “A rentabilidade caiu para todos
os investimentos de renda fixa mais conservadora, sejam títulos
públicos, CDBs, fundos ou a caderneta de poupança”, diz o consultor
financeiro Beto Veiga, autor de um livro sobre Tesouro Direto.
Ou seja, como todas as aplicações de renda fixa comparáveis entre si têm
apresentado menor rentabilidade, o Tesouro Direto conservou sua
vantagem relativa. Mas agora prestar atenção aos custos dos
investimentos tornou-se crucial. “Com a menor taxa de juros o investidor
terá que aumentar o valor dos seus aportes e, principalmente, fugir das
altas taxas de administração”, observa Veiga. Isso porque o Tesouro Direto, assim como os fundos DI e de renda fixa,
está sujeito à cobrança de taxas e de IR, enquanto que a caderneta de
poupança é isenta de todos esses custos. Em certos contextos, os títulos
públicos podem não apresentar grande vantagem em relação à poupança ou
mesmo em relação aos CDBs equivalentes que, embora sujeitos à cobrança
de IR, também não são taxados.
A vantagem do Tesouro Direto, contudo, é maior para quem deseja investir
para prazos mais longos em papéis indexados à inflação. “Para quem quer
resistir à tentação de usar o dinheiro antes do tempo, garantindo seu
poder de compra para um objetivo como a aposentadoria, as NTN-B são de
fato um bom negócio”, diz Paulo Bittencourt, diretor da Apogeo
Investimentos. Ele lembra, contudo, que para prazos mais curtos a vantagem realmente
ficou bem menor, e desaconselha a venda de títulos prefixados e
indexados à inflação antes do vencimento. “É complexo para o investidor
estimar quando haverá uma inversão da curva de juros. Para o final do
ano que vem deve haver uma elevação da Selic. Quem comprar um prefixado
hoje pode ter alguma perda se resolver vendê-lo antes do vencimento”,
explica.
Como ficou a situação de cada título público em relação à poupança
Letras Financeiras do Tesouro (LFT): As LFTs são os
títulos públicos mais conservadores, indexados à Selic e facilmente
comparáveis à caderneta de poupança em segurança e liquidez. No momento,
elas são negociadas com deságio, uma vez que o mercado ainda espera uma
maior redução para a taxa básica de juros. A LFT com vencimento em 2017
à venda atualmente apresenta uma rentabilidade bruta de 7,82% ao ano, e
não dos 8% da Selic.
Para um período de investimento de curtíssimo prazo (até seis meses), a
poupança, mesmo pelas novas regras, é mais vantajosa do que as LFTs, uma
vez que a alíquota de IR para este prazo é bastante alta (22,5%). As
LFTs só começam a ficar mais vantajosas que a poupança a partir de um
prazo maior que seis meses, e mesmo assim apenas em corretoras que
cobrem até 0,3% ao ano de taxa de administração. Se sua corretora cobra
mais do que isso, as LFTs só serão melhores que a poupança para prazos
maiores que um ano. Taxas de administração superiores a 0,5% ao ano
praticamente inviabilizam o investimento em LFTs no atual cenário.
Letras do Tesouro Nacional (LTN) e Notas do Tesouro Nacional série F (NTN-F):
Estes são títulos prefixados, ou seja, em que a taxa de juro paga no
vencimento já é conhecida no momento da compra. Esses papéis vêm
brilhando desde que começou o ciclo de queda nos juros, que é o cenário
econômico que mais os beneficia. No mês passado, os prefixados se
tornaram mais atrativos que os títulos indexados à inflação. Mesmo
assim, o prefixado mais rentável, a NTN-F com vencimento em 2023, já é
negociado com uma taxa abaixo de 10% há três leilões. No site do Tesouro
Direto o papel é anunciado a uma taxa de 9,59%.
Os prefixados não são exatamente comparáveis à poupança, pois os
princípios que regem esses investimentos são diferentes. Os prefixados
são muito voláteis e podem levar o investidor a perder dinheiro se
vendidos antes do prazo, enquanto que a poupança tem liquidez diária,
com pouca ou nenhuma perda de rentabilidade. Mesmo assim, é possível
dizer que os prefixados mantêm vantagem sobre a caderneta de poupança.
Pode-se fazer uma comparação grosseira, assumindo que a Selic será
constante para todo o prazo (8% ao ano) e que o título será levado até o
vencimento. A LTN mais curta à venda no momento, com vencimento em
2015, paga uma taxa prefixada de 8,33%. Se comparado à poupança, o
investimento no papel é mesmo mais vantajoso para quem pagar uma taxa de
administração em conta em sua corretora, de algo até 0,5% ao ano.
Contudo, as reais vantagens dos títulos prefixados são a possibilidade
de saber exatamente quanto se vai ganhar no vencimento ou a
possibilidade de ganhar com a valorização dos títulos, para quem souber
vendê-los no momento certo. Mas aí já se trata de especulação.
Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B): Esses são os
títulos atrelados à inflação, que pagam sempre uma taxa de juro
prefixada (juro real) mais a inflação do período pelo IPCA. Embora esses papéis tenham apresentado desvalorização em junho,
esse mau desempenho só afeta quem especula com títulos públicos. Quem
os carrega até o vencimento não verá perda de capital. A maior vantagem
desses títulos permanece: preservar o poder de compra do investidor,
garantindo-lhe uma rentabilidade acima da inflação faça chuva ou sol.
Acontece que a rentabilidade desses papéis já não é mais tão bela como
outrora, quando as NTN-Bs pagavam juros reais de 5% e até 6% ao ano. Os
papéis à venda atualmente pagam entre 2,88% e 4,46% ao ano, dependendo
do prazo. Se a inflação se mantiver estável em torno dos 5% ao ano, não
há chance de conseguir retorno acima de 10%. Já se houver surtos
inflacionários, o que ainda deve acontecer algumas vezes nos próximos
anos, o governo terá de elevar a Selic, o que impactará negativamente no
preço dessas NTN-Bs que pagam juros mais baixos.
Isso porque, com a Selic mais alta, os novos títulos emitidos trarão
taxas prefixadas mais elevadas. Por isso, quem comprar NTN-Bs longas
agora deve evitar vendê-las se essa desvalorização ocorrer. “Esses
títulos já estarão garantindo um juro real ao investidor. No momento em
que forem ofertadas novas NTN-Bs de juro real mais alto, basta passar a
comprar estas, sem tirar o dinheiro das anteriores”, diz Paulo
Bittencourt. Esse papel também não é muito comparável à poupança, mas é
mais rentável que a caderneta para quem investe para o longo prazo, sem
necessidade – ou mesmo sem o desejo – de liquidez.
E se eu não estiver satisfeito com essa rentabilidade?
Para quem tinha a ambição de ganhar ao menos 1% ao mês, a renda fixa mais conservadora realmente não vai mais satisfazer. Embora sejam um pouco mais rentáveis que os títulos públicos,
mesmo os CDBs um pouco mais arriscados, como os de bancos médios, já
não estão pagando mais de 10% ao ano nem nos pós-fixados, nem nos
prefixados, nem nos indexados ao IPCA.
Mas então o que fazer? Uma opção na própria renda fixa é buscar os
fundos que tentam seguir os índices de renda fixa, os IMAs. Esses fundos
investem em cestas de títulos públicos e tentam ganhar não só com os
juros, mas principalmente com a valorização dos papéis. O IMA-B, por
exemplo, que segue o rendimento de uma cesta de NTN-Bs de diversos
vencimentos, acumulou alta de 24,49% nos últimos 12 meses. Dentre os
fundos de renda fixa, aqueles classificados como Renda Fixa – Índices na
Anbima são os mais rentáveis do ano, acumulando alta de 12,69% na
média.
O investidor também pode buscar opções fora da renda fixa, como fundos
imobiliários, ações, fundos de ações ou fundos multimercados. Mas sempre
lembrando que a liquidez e o risco dessas aplicações são bem
diferentes, sendo importante adequá-los aos seus objetivos e ao seu
perfil.
“Eu temo esse discurso que vem surgindo de que agora o investidor ‘tem
que correr mais risco’. Ninguém ‘tem que correr mais risco’. Quem
garante que você vai ganhar mais na Bolsa ou montando o seu próprio
negócio?”, questiona Beto Veiga, que lembra que o sucesso em outros
investimentos depende mais do perfil, da habilidade e do interesse do
investidor, não devendo ser tomado como uma verdade absoluta. “Tem que
ter muito cuidado com esse novo mantra. Só corra riscos se você tiver
perfil para isso. Se não, trabalhe mais ou contente-se com o novo
patamar de rentabilidade”, completa o consultor.
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