segunda-feira, 23 de julho de 2012

Marcos Valério deve pelo menos R$ 83 milhões a bancos -- enquanto isso, continuando faltando alguém no banco dos réus do mensalão

A dez dias do início do julgamento do mensalão, Marcos Valério e seus ex-sócios devem na Justiça pelo menos R$ 83 milhões que saíram dos bancos Rural e BMG para abastecer o PT e partidos aliados em 2003 e 2004. A Folha teve acesso aos processos no Tribunal de Justiça de Minas em que os bancos cobram o valor, mas, segundo avaliação de envolvidos no episódio, a dívida jamais será paga. O julgamento começa no dia 2 de agosto no STF (Supremo Tribunal Federal).

Apontado como operador do mensalão, Valério alega que pegou o dinheiro a pedido do PT e, para pagar aos bancos, cobra R$ 100 milhões do partido na Justiça. "Há uma responsabilidade de natureza civil do PT", diz o advogado de Valério, Marcelo Leonardo.

De acordo com a Procuradoria-Geral da República, em 2003 e 2004 o Rural e o BMG fizeram empréstimos de R$ 64 milhões ao PT e às empresas de Valério. O objetivo, sustenta a denúncia dos procuradores, era misturar esse valor ao dinheiro público desviado de contratos das empresas de publicidade de Valério com o Banco do Brasil e a Câmara dos Deputados -- e, com isso, camuflar a origem ilegal dos recursos do mensalão.

O PT nega e afirma que o dinheiro que repassou a aliados e a integrantes do partido, para atender a despesas eleitorais, vieram exclusivamente dos empréstimos feitos no Rural e no BMG.  E diz que pagou a sua parte em 2009, não reconhecendo, por consequência, a dívida cobrada hoje de Valério.

Já a Procuradoria descreve o mensalão de outra forma: como um esquema de compra de apoio político no Congresso organizado pelo PT no início do governo Lula.  E diz que os bancos liberaram o dinheiro em troca de receber benefícios do governo. Não teriam a intenção de cobrá-lo, o que só fizeram após o estouro do escândalo. O Banco Rural, segundo a Procuradoria, queria o apoio do governo na aquisição de parte do Banco Mercantil de Pernambuco. Já o BMG, diz a denúncia, teria sido beneficiado na operação de empréstimos consignados de servidores públicos.

Falta alguém no banco dos réus do mensalão

[A grande perplexidade nesse imbróglio todo é o fato de Lula, o Nosso Pinóquio Acrobata (NPA), não ter sido sequer solicitado a prestar informações e esclarecimentos sobre um lamaçal desse porte, que envolveu gente de sua direta intimidade pessoal e política, gente que atuava sob suas ordens e o partido que comanda e controla há décadas. Reproduzo abaixo trechos da coluna de hoje de Ricardo Noblat no Globo -- bem informado como sempre, ele revela alguns episódios dos bastidores dessa imundície chamada mensalão.]

Marcos Valério, um dos cérebros do mensalão, voltou a ameaçar Lula, segundo a VEJA desta semana. Em pânico com a possibilidade de vir a ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal, que começará a julgar no próximo dia dois os 38 réus do mensalão, Valério se disse disposto a contar que esteve com Lula várias vezes, o que Lula sempre negou.

Foi Paulo Okamoto, uma espécie de diligente tesoureiro informal da família Lula, que de novo dobrou Valério. Naturalmente, Okamoto nega que Valério tenha feito qualquer ameaça a Lula. Ou dito que antes do estouro do escândalo do mensalão estivera com ele na Granja do Torto, uma das residências oficiais do presidente da República.

Coube também ao advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, outra peça importante da engrenagem do PT, agir para sossegar o espírito atribulado de Valério.

Ponham-se no lugar do ex-publicitário mineiro. Era rico, riquíssimo antes de se meter com o PT de Delúbio Soares, Genoino e José Dirceu. Tinha duas agências de propaganda. E inventara uma forma de lavar dinheiro por meio de bancos para engordar o caixa 2 de políticos às vésperas de eleições. Eduardo Azeredo, do PSDB, foi um deles.

Procurado para fazer pelo PT o que fizera por Azeredo, imaginou ter tirado a sorte grande.O governo Lula estava nos seus meses iniciais. E a turma à frente do partido em busca do tempo perdido. De repente, todas as portas se abriram para Valério. E ele passou a "fartar os olhos" admirando o dinheiro que entupia as suas burras. 

Teria dado certo - não fosse o tresloucado gesto de Roberto Jefferson, presidente do PTB, que por pouco não pôs o governo a pique. Em um sábado de junho de 2005, depois de tomar uns goles a mais na Granja do Torto [p'ra variar ...], Lula falou em renunciar ao mandato. Ficara sabendo que Valério admitira envolvê-lo no escândalo. José Dirceu, então chefe da Casa Civil da presidência da República, foi chamado às pressas em São Paulo. Escalado para dar um jeito em Valério, deu sem fazer barulho.

Naquele dia postei em meu blog que Lula falara em renúncia - embora eu não soubesse por que. Nunca recebi tantos desmentidos de porta-vozes e amigos do governo.

Ainda no segundo semestre de 2006, Valério voltou a atacar. Procurou um político de forte prestígio junto a Lula. Queixou-se de estar quebrado. Acumulava dívidas sem poder honrá-las. Seus bens haviam sido bloqueados. Caso não fosse socorrido, daria um tiro na cabeça ou faria com a Justiça um acordo de delação premiada.

O político pediu uma audiência a Lula. Recebido no gabinete presidencial do terceiro andar do Palácio do Planalto, o político reproduziu para Lula o que ouvira de Valério. Em silêncio, Lula virou-se para uma das janelas do gabinete que lhe permitia observar parte do intenso movimento nas vizinhanças do palácio. Então perguntou ao visitante: "Você falou sobre isso com Okamoto?" O visitante respondeu que não. E Lula mais não disse e nem lhe foi perguntado. Seria desnecessário.  O diligente Okamoto, aquele que pouco antes pagara do próprio bolso cerca de R$ 30 mil devidos por Lula ao PT, apascentou Valério.

Falta alguém em Nuremberg!

Quero dizer: falta alguém na denúncia oferecida pela Procuradoria Geral da República sobre a "organização criminosa" que tentou se apossar do aparelho do Estado. Desviou-se dinheiro público - e não foi pouco. Pagou-se para que deputados votassem como queria o governo. Comprou-se o apoio de partidos.

Nada será capaz de reparar o mal produzido pelos que chegaram ao poder travestidos de legítimos hierarcas da decência - falsos hierarcas como se revelariam mais tarde.

Mas se a Justiça só enxergar inocentes entre eles, isso significará que também foram bem-sucedidos na tarefa de trucidar a esperança.

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