domingo, 10 de junho de 2012

Sobra de energia vai elevar conta de luz do consumidor comum

A conta de luz dos consumidores de energia atendidos pelas 63 distribuidoras do país --como Eletropaulo e Cemig-- vai ficar mais cara nos próximos anos, informa reportagem de Agnaldo Brito publicada na Folha deste sábado. A íntegra está disponível para assinantes do jornal e do UOL (empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha).

Além dos habituais reajustes anuais, há outro fator de pressão sobre os preços: a fuga de grandes consumidores para o chamado mercado livre de energia. Criado em 1995, esse mercado é um ambiente de contratação fora das distribuidoras, cujo acesso para negociação só é permitido a consumidores com demanda acima de 500 kW -- carga suficiente para abastecer 800 residências.

De acordo com a Abradee (Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica), em 18 meses o número de consumidores livres no Brasil dobrou para 670 agentes, o que inclui clientes como shoppings e indústrias. Jamais a fuga de consumidores do mercado comum de energia alcançara tamanha velocidade. Mas, qual o problema dessa debandada? O mais imediato é o furo no planejamento de compra de energia pelas distribuidoras. Elas compraram energia para um cliente que foi embora. Essa fuga tem gerado um problema: a sobrecontratação das concessionárias.

Sobra

A Abradee diz que algumas distribuidoras têm mais de 7% de sobra de energia entre 2013 e 2015. Há casos de sobras superiores a 20%. Por lei, as empresas só podem ter 3% de excedente. É o máximo que os consumidores comuns pagam. Para reduzir o excesso de energia "encomendada", as distribuidoras devolvem contratos de velhas usinas, que têm preço menor -- os contratos mais novos, mais caros, não podem ser desfeitos. É aí que o efeito da fuga de grandes consumidores para o mercado livre se materializa para o consumidor comum.

Com a saída de energia barata do mix tarifário, sobram os contratos mais caros. O resultado é que o custo de aquisição dessa energia fica maior. A compra de energia pela concessionária corresponde à metade do valor da conta de luz de um consumidor residencial. O tamanho do aumento não será uniforme, mas a questão já entrou no radar do governo e pode anular o esforço que a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) fez nos últimos anos para tentar frear a alta da tarifa de energia, com a redução do ganho das distribuidoras.

"Há tendência de elevação [da tarifa de energia], na medida em que são devolvidos contratos com preços mais baixos", diz Nelson Fonseca, presidente da Abradee.

Casos concretos

O sinal amarelo surgiu com o recente reajuste tarifário de quatro distribuidoras em abril: Celpe (PE), Coelba (BA), Cosern (RN) e Energisa (SE). O custo de compra de energia delas foi maior de 2011 para 2012. Elas gastaram entre 14,63% e 21,80% mais para adquirir o mesmo volume. O efeito desse sobrecusto resultou em aumento entre 7,71% e 10,73% na tarifa final.

A saída dos grandes clientes pesou para o consumidor não só porque terá de pagar mais pela mesma energia, mas também por ter de dividir, agora com menos clientes, o custo dos subsídios embutidos nas tarifas.

Aneel anula contratos do Grupo Bertin

Numa decisão inédita no setor elétrico brasileiro, a Aneel anulou contratos de venda de energia da Bertin com 20 distribuidoras do país, que aceitaram a suspensão. Mesmo com a inédita decisão, questionada por parte do governo -- como o presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), Maurício Tolmasquim -- muitas distribuidoras ainda enfrentam o problema de excesso de energia contratada.

Sem a anulação dos contratos, as 20 distribuidoras que adquiririam energia do Grupo Bertin ficariam com sobrecontratação de 4,16%. A anulação dos contratos reduziu esse excesso para 3,61%. Mas, a situação ainda preocupa quando se observam alguns exemplos. É o caso de distribuidoras como Eletropaulo (SP), Bandeirantes (SP), Energisa (SE), Escelsa (ES), Celtins (TO), Cemar (MA), Cemat (MT) e Cepisa (PI), de longe o caso mais grave.

Com os contratos de compra de energia da Bertin, a Cepisa, controlada pela Eletrobrás, tinha 23,09% de energia acima da sua demanda, segundo relato do diretor da Aneel Julião Silveira Coelho. A anulação do contrato com o Grupo Bertin aliviou pouco a situação da distribuidora, que atua no Piauí. Agora, a Cepisa está com um nível de 22,6% de excedente de energia contratada.

O excesso de energia [contratada] nas distribuidoras, efeito da fuga de consumidores para o mercado livre e da redução da atividade econômica, fez o governo adiar pela segunda vez os leilões para contratação de energia para 2015  e 2017. Os leilões remarcados para 28 deste mês e 16 de agosto ficarão agora para 11 e 28 de outubro, respectivamente.

A reportagem da Folha tentou falar com a direção da Aneel sobre o problema, mas não obteve resposta.

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