[Nesta semana que findou o jornal O Globo publicou uma notinha mínima na coluna do Noblat, atribuindo à presidente uma reclamação do tipo "tem gente que não é responsável por investimento nenhum e quer me dar lição". Esse "alguém" mencionado pela nossa ex-guerrilheira é o economista Pedro Malan, ministro da Fazenda no governo FHC, e a razão da bronca de Dª Dilma foi o artigo desse economista intitulado "Europa e Brasil, urgências do gradualismo", publicado no jornal O Estado de S. Paulo de 10 de junho, e que reproduzo a seguir, p'ra gente tentar entender o porquê do derrame de bílis da nossa ex-guerrilheira.]
Europa e Brasil, urgências do gradualismo
Pedro Malan - O Estado de S. Paulo (10/6/12)
"Não é que as lideranças políticas europeias não saibam o que fazer; o
que elas não sabem é como se reeleger, depois de tentarem fazer o que
precisa ser feito." A frase de efeito do então presidente do Conselho de
Ministros da Fazenda da União Europeia (Juncker) pode ser lida como uma
defensiva ironia sobre conflitos entre as prioridades do contexto
político doméstico e as necessidades de ação coletiva - e coordenadas no
âmbito europeu.
No mundo real, que nem sempre é o das retóricas promessas de campanha,
as "soluções" para questões de fundo exigem ações que se desdobram no
tempo e, portanto, demandam uma perspectiva gradualista. Mas - lá como
cá - há urgências no gradualismo, paradoxal como isso possa parecer.
Assim como há necessidade de que a estratégia gradualista seja percebida
como algo factível, com um mínimo de coerência, derivada de
comprometimentos críveis, e não apenas de exercícios retóricos como as
reiteradas reafirmações da intenção de "fazer o que for necessário".
Segue um breve comentário sobre o que me parece mais urgente no
gradualismo europeu, antes de outro breve comentário sobre o que
considero mais urgente no gradualismo brasileiro.
Santa Mario era o título de um relatório do Institute of International
Finance publicado às vésperas do Natal do ano passado, quando o
presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, anunciou que o
BCE estaria fornecendo empréstimos de três anos, em quantidades
ilimitadas, a bancos da região, a uma taxa de 1% ao ano, em duas
operações: ao final de dezembro e ao final de fevereiro. Centenas de
bancos se candidataram e, nas duas operações, tomaram 1,02 trilhão,
levando o balanço do BCE de 2 trilhões para 3 trilhões em dois meses. A
dupla operação acalmou os mercados por algum tempo, enquanto durou a
expectativa de que o BCE estaria pronto a fazer "o que quer que fosse
necessário", sempre.
Draghi sempre deixou claro que a ação do BCE era parte de suas
responsabilidades de assegurar liquidez ao sistema financeiro europeu,
mas que era fundamental que os governos dos países do euro chegassem a
um acordo coletivo sobre um "novo pacto fiscal", além de outras reformas
que dependiam do contexto de cada país.
"A sequência é importante", escreveu Draghi mais de uma vez. "A
restauração e/ou a preservação de confiança no curto prazo depende de
uma âncora no longo prazo". É certo que a ação do BCE precisa ser
complementada com ações em outras áreas. E o presidente do BCE insiste,
corretamente, na urgência de avançar, ainda que gradualmente, na
resolução desse problema de ação coletiva.
Hoje, junho de 2012, a principal "urgência no gradualismo" europeu é
interromper de maneira crível o processo de causação circular cumulativa
entre problemas de balanços de bancos e de dívidas de países soberanos.
Por que a principal urgência? Porque, em se tratando de bancos em
dificuldades, "as coisas acontecem mais rápido do que você pensava que
pudessem acontecer". E o espaço fiscal para um governo, sozinho, lidar
com problemas de bancos grandes pode não existir. Portanto, uma solução
cooperativa precisa ser encontrada - e rápido.
E nós? O Brasil não tem crise bancária nem crise de dívida soberana,
ambas se reforçando. Mas há uma outra urgência, não menos trivial, com
que se defronta a Europa e que, no geral, é a principal urgência no
gradualismo brasileiro: assegurar uma rápida elevação sustentada dos
investimentos privados e públicos, com elevação da produtividade e da
competitividade do País.
O debate público, no Brasil, vem mostrando uma convergência grande, para
não dizer um quase consenso, sobre a prioridade básica hoje: aumentar
os investimentos e aumentar a produtividade do capital e da mão de obra
para que o País possa crescer de forma sustentada a taxas bem mais
elevadas que os 2,5%, ou pouco mais, que podem vir a ser a média de
2011-2012.
Demos por assentado que as mudanças serão graduais, como sempre, no
Brasil e alhures. Mas no momento, dadas as prioridades conferidas aos
investimentos, deveria haver um renovado sentido de urgência em, pelo
menos, acelerar, e muito, o processo de concessões ao setor privado, em
várias áreas de infraestrutura (aeroportos, estradas, portos, energias);
retomar o processo de licitação das áreas para exploração de petróleo e
gás, interrompido desde 2008; avaliar de maneira fria e objetiva se a
"política de conteúdo nacional" não poderia estar levando a atrasos nos
cronogramas de investimentos (públicos e privados); conferir prioridade
absoluta à necessidade de redução do chamado custo Brasil para os
investidores nacionais e estrangeiros (com foco no que se pode fazer no
curto prazo que seja consistente com uma estratégia gradualista, e que
não sejam meras respostas a miríades de demandas específicas); definir
as reais prioridades na efetiva execução dos milhares de obras do
chamado PAC; buscar formas para alimentar a participação dos
investimentos no gasto público em relação aos outros gastos. Esses são
apenas exemplos de coisas que a presidente Dilma Rousseff pode decidir, e
fazer acontecer, em seu mandato.
A presidente já demonstrou que tem plena consciência dessa urgência. E
que tem a coragem para fazer o necessário. A presidente sabe que não há
nenhuma pessoa séria torcendo contra o País ou desejando o fracasso de
seu governo (à diferença de certa oposição irresponsável de um passado
recente). A presidente sabe que tem de lidar com problemas com sua
amplíssima base de sustentação no Congresso Nacional, com as várias
facções do seu próprio partido e com os inúmeros corporativismos do
setor público, para avançar nas áreas acima - se é que o "objetivo" de
elevar a taxa de investimento para 22%-23% do produto interno bruto
(PIB) em seu mandato não se trata apenas da expressão de um desejo.
[Li e reli o artigo e concluí que a má vontade da nossa ex-guerrilheira com ele só pode ser atribuída à sua conhecida ojeriza contra quem a contraria ou ousa dizer-lhe verdades que a incomodam. Ambos são economistas, ela e Malan, e, embora sendo muitíssimo mais competente e rodado que ela no ramo, aqui e lá fora, o ex-ministro escreveu um texto em linguajar terreno, simples e escorreito, dando sua opinião e sua receita sobre assuntos de que entende profundamente e sobre os quais tem o direito de falar sem ter que pedir a bênção a Dª Dilma. O problema, ou o principal dos problemas, é que Malan é e sempre foi de fazer as coisas planejadamente, com visão de médio e longo prazo, com princípio, meio e fim, e a nossa ex-guerrilheira -- talvez por sequela de sua militância passada -- é do time do rompante, da administração por espasmo. Ela só consegue ver a árvore, não vislumbra a floresta que está por detrás dela. Parece que, voltando ao passado, ela quer acabar com o "sistema" derrubando o "burguês" que está à sua frente -- que já foi o juro bancário, depois foram os pátios das montadoras lotados de carros, agora são os calçados e as roupas, amanhã podem ser os guarda-chuvas chineses que nos inundam (embora nos abriguem), e por aí vai. De soluço em soluço a galinha brasileira não vai encher o papo e vai acabar numa panela, temperada com condimentos importados contra os quais a ex-guerrilheira não achará remédio em seu receituário, cujo bloco está acabando.]
Amigo VASCO:
ResponderExcluirA notícia e principalmente sua análise, espelham o que se vive hoje nessas terras tupiniquins.
Mas manifesto minha incredulidade sobre a tomada de ações/posições que possam reverter o quadro nefasto de nossa economia.
Pode ser que eu seja de uma geração à qual foi capada a liberdade de expressão. Hoje enxergamos isso.
Mas procurei/procuro criar filhas e netos com um sentido de NAÇÃO que não é o que eles veem no dia-a-dia, e talvez nem sintam que o problema existe. Afinal, sempre existe o pai/avô que os sustenta, lhes dá guarida em qualquer situação.
Tudo se deve, em minha opinião, principalmente ao descaso com a EDUCAÇÃO. Sem EDUCAÇÃO, é fácil tangir a boiada para onde se quer.
É triste!!!
Abraços - LEVY
Prezados,
ResponderExcluirNão conseguiria fazer um vatcínio mais apropriado do que o Pedro Malan fez, por falta de competência minha, para dizer o mínimo. O comentário acima também se espraia por atitudes pessoais de cidadão engajado. Assim, limito-me a ecoar o truismo: "Sem educação não dá para se discutir absolutamente nada, nem a própria educação, nem a saúde, nem a segurança e nem o futuro. Economia?!... essa, menos ainda."