sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

R$ 300 milhões de obras-primas da pintura barroca doados a museus britânicos com uma condição: ingresso para vê-las tem de ser gratuito

[A reportagem traduzida abaixo foi publicada em 20/2 no jornal inglês The Independent. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]

Uma das maiores coleções de pinturas do barroco italiano no mundo foi doada a museus e galerias britânicos espalhados pelo Reino Unido (RU), mas as obras serão retiradas desses locais se eles em algum momento cobrarem do público para que sejam vistas.

A coleção privada de Sir Denis Mahon, um filantropo e um ativista apaixonado pelo acesso gratuito a museus públicos, foi doado como um legado permanente a galerias britânicas de acordo com seu desejo. Sir Denis, um herdeiro da fortuna do banqueiro Guiness Mahon, começou a colecionar pinturas do barroco italiano nos anos 1930, comprando obras então fora de moda por preços entre 100 e ₤ 200 (cerca de R$ 300 a R$ 600).  Por ocasião de sua morte em 2011, com 100 anos, sua coleção de obras-primas estava estimada em ₤ 100 milhões (cerca de R$ 300 milhões).

A instituição beneficente Art Fund [Fundação Arte, em tradução livre - uma instituição beneficente para angariar fundos para obras artísticas] anunciou que havia concluído a transferência de 57 pinturas de arte barroca italiana da coleção de Sir Denis, incluindo obras-primas de Guercino, Guido Reni, Domenichino e Ludovico Carracci, para as coleções permanentes de seis museus e galerias do RU.

A National Gallery [em Londres] ficará com 25 obras; o Museu Ashmoleano [anexo à Universidade de Oxford], com 12; a Galeria National Escocesa [em Edimburgo], com 8; o Museu Fitzwilliam [em Cambridge], com 6; os museus e a Galeria de Arte de Birmingham [em Birmingham], com 5; e a Temple Newsam House [em Leeds], com uma. Mas, a Fundação Arte disse que essas pinturas foram transferidas em caráter permanente com a condição, determinada por Sir Denis, de que aquelas instituições de arte não cobrem ingresso ao público para vê-las nem vendam as obras de suas coleções.

Stephen Deuchar, diretor da Fundação Arte, disse: "Sir Denis compartilhava de nosso compromisso com a ampliação do acesso livre do público à arte. [...] Analisaremos as condições individuais de cada caso [se ocorrer a hipótese de retirada de obras por cobrança de ingresso], e isso pode ocorrer no ano que vem ou daqui a 600 anos, para ver se a retirada de obras seria o modo correto de agir".  O compromisso é oportuno, pois algumas instituições receiam que a entrada gratuita para museus e galerias nacionais, introduzida pelo governo trabalhista em 2011, possa sofrer cortes.
 
Sir Denis, que abandonou a carreira bancária para dedicar-se à sua paixão pela arte, foi por 84 anos um membro ativo da Fundação Arte. Ele telefonava regularmente para ministros de arte, instando-os a não deixar os museus à míngua de suas verbas e não interferir em sua independência. Suas ligações eram sempre aceitas, uma prova do respeito que lhe dedicavam.

Para montar sua coleção, Sir Denis jamais gastou mais do que as 2.000 que investiu na "Apresentação de Cristo no Templo", de Guercino, que comprou em 1953 e hoje está exposta na National Gallery. No início dos anos 70, a importância dos artistas que Sir Denis patrocinava foi reconhecida por todos, em parte graças aos esforços de Sir Denis em defesa deles.

Além das 57 obras doadas, Sir Denis deixou também um legado de ₤ 1 milhão [cerca de R$ 3 milhões] à Fundação de Arte, e doou ainda ao museu Ashmoleano um conjunto de 50 obras de Guercino.

Algumas das obras doadas por Sir Denis Mahon (clique nas imagens para ampliá-las)

 A Sagrada Família, com a Virgem ensinando o Menino a ler - Bartolomeo Schedoni, cerca de 1613-1615. Óleo sobre tela, 33.6 x 28.2cm. National Gallery, Londres. - (Foto: National Gallery).

A Caverna da Eternidade - Luca Giordano, início dos anos 1680. Óleo sobre tela, 73.1 x 87.5cm. National Gallery, Londres - (Foto: National Gallery).

Salomé recebe a cabeça de S. João Batista - Matthias Stom, 1630-1632. Óleo sobre tela, 109.2 x 155.7cm. National Gallery, Londres - (Foto: National Gallery).

Cena mitológica de Agricultura - Luca Giordano, início dos anos 1680. Óleo sobre tela, 121.4 x 193cm. National Gallery, Londres - (Foto: National Gallery).

 Madona e o Menino em aparição para São Estevão e três outros santos - Corrado Giaquinto, cerca de 1760-1766. Óleo sobre tela, 49.8 x 24cm. Scottish National Gallery, Edimburgo - (Foto: Scottish National Gallery).

Paisagem rural romana - Pierre Patel, o Velho, cerca de 1638-1639. Museu Ashmoleano, Oxford - (Foto: Museu Ashmoleano). 

 Paisagem rural romana - Gaspard (Poussin) Dughet, cerca de 1660. Óleo sobre tela, 50.7 x 67.4cm. Museu Ashmoleano, Oxford - (Foto: Museu Ashmoleano).

Paisagem com viajantes indagando sobre o caminho - Salvator Rosa, cerca de 1641. Óleo sobre tela, 108.3 x 174.2cm. National Gallery, Londres - (foto: National Gallery).  

Cena de rua romana com jogadores de cartas - Johannes Lingelbach, cerca de 1645-1650. Óleo sobre tela, 43 x 34.5cm. National Gallery, Londres - (Foto: National Gallery).

São Gregório, o Grande, com Santo Inácio de Loiola e São Francisco Xavier - Guercino, 1625-1626. Óleo sobre tela, 296 x 211cm. National Gallery, Londres - (Foto: National Gallery).

Camponeses com burros - Giuseppe Maria Crespi, cerca de 1710-1715. Óleo sobre tela, 94.1 x 53.8. National Gallery, Londres - (Foto: National Gallery).

Músicos - Giuseppe Maria Crespi, cerca de 1710-1715. Óleo sobre tela, 100.8 x 50.1cm. National Gallery, Londres - (Foto: National Gallery).

O anjo aparece para Hagar e Ismael - Gioacchino Assereto, cerca de 1640. Óleo sobre tela, 119 x 167cm. National Gallery, Londres - (Foto: National Gallery).

Cabeça de um homem com um turbante - Salvator Rosa, 1615-1673. Óleo sobre tela, 59.5 x 49.5cm. Birmingham Museum and Art Galeery, Birmingham - (Foto: Birmingham and Art Gallery).

A Virgem e o Menino furando a cabeça da serpente ("Madona da Serpente") - Giovanni Battista Gaulli, cerca de 1670. Óleo sobre tela, 142.7 x 99.6cm - Birmingham Museum and Art Gallery, Birmingham - (Foto: Birmingham Museum and Art Gallery).


Paisagem com Santo Antônio Abbot e São Paulo, o Eremita - Salvator Rosa, cerca de 1660-1665. Óleo sobre tela. Scottish National Gallery, Edimburgo - (Foto: Scottish National Gallery). 

Jefté é saudado por sua filha ao retornar de uma batalha - Giovanni Antonio Pellegrini, cerca de 1708-1713. Óleo sobre tela.  Scottish National Gallery, Edimburgo - (Foto: Scottish National Gallery).

Cabeça de um ancião - Guercino. Óleo sobre tela, 63 x 48.3cm.  Museu Ashmoleano, Oxford - (Foto: Museu Ashmoleano).

A visão de São Jerônimo - Domenichino. Óleo sobre cobre, 49.4 x 37.2cm. Museu Ashmoleano, Oxford - (Foto: Museu Ashmoleano).

 Paisagem mitológica com ninfas e sátiros - Paul Bril, 1602-1660. Óleo sobre tela, 70.6 x 92.8cm. Museu Ashmoleano, Oxford - (Foto: Museu Ashmoleano).

 A Sagrada Família com Santa Elizabete, São Zacarias e o infante São João - Pierre-Hubert Subleyras, cerca de 1726-1728. Óleo sobre tela, 63.5 x 48.7cm. Museu Fitzwilliam, Cambridge - (Foto: Museu Fitzwilliam).


 

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