Na década passada os mercados emergentes se projetaram como os melhores velocistas mundiais. Enquanto crises em série derrubavam a América e, em seguida, a Europa, a China praticamente não alterou seu ritmo. Outras grandes nações em desenvolvimento fizeram apenas uma pausa rápida para respirar. Investidores apostaram fortemente em que o crescimento rápido em mercados emergentes era a nova normalidade, enquanto líderes de Pequim a Brasília apregoavam ao mundo as virtudes de seus modelos econômicos centralizados no Estado.
Mais tarde, porém, os velocistas começaram a ficar ofegantes. Na semana passada [anterior a 21 de julho], a China noticiou seu crescimento mais lento em três anos (ver artigo). Recentemente, a Índia registrou seu desempenho mais fraco desde 2004. O motor brasileiro afogou, literalmente. Nesta semana, o FMI (Fundo Monetário Internacional) reduziu drasticamente sua previsão de crescimento para três dos quatro países do chamado Brics -- apenas a Rússia foi poupada (mas, mesmo ali o crescimento é vulnerável aos preços de energia em queda). Alguns investidores se lembram sombriamente do histórico de propensão a crises do mundo emergente, e conjeturam se o pior ainda está por vir.
PIB dos países em desenvolvimento (percentual de aumento sobre o ano anterior) - (Gráfico: The Economist).
Nenhuma crise é claramente visível ou provável [?!], mas uma preocupação séria é justificada porque o mundo emergente enfrenta dois riscos distintos: uma desaceleração cíclica e uma erosão do potencial de crescimento a mais longo prazo. Lidar com o primeiro deles será razoavelmente fácil, mas com o segundo, não.
Ressurgimento dos mais preparados
Pelos padrões do mundo rico, os mercados emergentes ainda estão se desempenhando extremamente bem. O FMI avalia que as economias em desenvolvimento crescerão ainda 5,6% este ano. Além disso, essa desaceleração é parcialmente intencional. Quando a crise financeira global explodiu, as economias emergentes reagiram energicamente: a China lançou um gigantesco estímulo, os bancos estatais do Brasil facilitaram o crédito, as taxas de juros foram drasticamente reduzidas. Eles foram tão bem sucedidos, que em 2010 tiveram que reverter o curso de suas medidas. Para reprimir as pressões dos preços, elevaram as taxas de juros, frearam a especulação e permitiram que suas moedas se valorizassem. Com um retardo, esse aperto deu o resultado previsto.
Ainda assim, a desaceleração mostrou-se mais acentuada do que se esperava. A crise da dívida soberana da Europa é parcialmente culpada por isso. Ela minou a demanda pelas exportações de manufaturados dos países em desenvolvimento e reduziu o preço de suas commodities -- nesse contexto, a África do Sul é uma baixa digna de menção. Bancos europeus têm sido os canais do fluxo de dinheiro externo para os países emergentes -- agora, esses bancos estão arredios por causa dos problemas que têm que enfrentar em casa.
Felizmente, os formuladores de políticas do mundo emergente têm uma grande gama de oportunidades para satisfazer. Enquanto nos bancos centrais dos EUA, do Japão e da Europa a meta de inflação é próxima de zero, ela vale quase 6% nos países emergentes. Estímulo fiscal é um luxo com o qual poucas economias avançadas -- cujos deficits orçamentários valem em média 6% do PIB -- podem arcar. Mas, essa é ainda uma opção em muitos países emergentes, onde esses deficits têm um valor mais administrável de 2%.
O que é mais importante: as fragilidades que tornaram as economias emergentes tão suscetíveis a crises no passado, em grande parte não mais existem. Os bancos estão mais capitalizados, e dependem menos do instável financiamento de outras instituições do que seus equivalentes europeus. Taxas de câmbio fixas já foram uma vez a regra nos países em desenvolvimento. Elas eram um meio de conter a inflação, mas também estimulavam a tomada excessiva de empréstimos em moedas estrangeiras, criando tensões que acabavam por quebrar a correlação cambial da moeda. Com inflação melhor controlada, o câmbio flutuante (a China é uma grande exceção) e reservas de moedas estrangeiras bem estocadas são agora a tônica no mundo emergente, dando proteção contra exportações em declínio e investidores estrangeiros volúveis.
Assim, parece improvável uma depressão nesses países emergentes. No entanto, essa não é a disposição quanto a retornar às taxas de crescimento da década passada. A China, por exemplo, não as quer mais. Sua economia tornou-se superdependente de investimentos -- seus líderes querem, agora, ingressar numa fase de crescimento mais sustentável embora mais reduzido, conduzido pelos consumidores. Além da China, torna-se cada vez mais evidente que muitas economias emergentes têm crescido acima de seu potencial implícito para tanto. Os otimistas acharam uma vez que a Índia poderia manter um crescimento do tipo chinês, acima de 9% ao ano, mas isso levou a uma inflação obstinada e a deficits de conta corrente, sinalizando que o potencial de crescimento da Índia possa situar-se mais na faixa de 6 a 7%.
Preparação para a maratona
Fazendo-se uma retrospectiva, observa-se que algumas quebras de recorde do mundo emergente se deram à custa de anabolizantes. Um estimulador de desempenho foi o apetite da China por matérias-primas, que provocou um crescimento repentino e volumoso (boom) no consumo de commoddities que sobrecarregou muitos mercados emergentes. Como esse boom está em queda, a dependência da Rússia em relação ao petróleo e ao gás torna o país particularmente vulnerável. Outra droga anabolizante foi o crédito doméstico, particularmente no Brasil, na Turquia e no leste europeu. [As críticas são em sua maioria pertinentes, o tom delas é que é desagradável -- é a velha acidez britânica. Os ingleses são tremendos defensores do "faça o que digo, não olhe o que faço", perdem status mas não perdem a pose. O problema deles é que com ou sem "anabolizantes" sua economia não consegue se erguer.]
É possível que haja um novo desempenho impressionante, mas isso depende de novas políticas que deixem os mercados emergentes preparados para a longa corrida. Aqui, os sinais são problemáticos. Na Rússia, onde a prioridade deveria ser a diversificação para evitar a excessiva dependência de petróleo e gás, o presidente Wladimir Putin propôs uma rodada de gastos sociais que em seis anos pode custar 8% do PIB. A Índia tem um deficit expressivo de 9% do PIB, no entanto, Pranab Mukherjee, o ministro de Finanças que recentemente deixou o cargo e será em breve ungido presidente (ver artigo), fracassou por não atacar os subsídios aos combustíveis, que custam ao país 0,8% do PIB. Faz sentido investir alguns frutos do crescimento numa rede de segurança melhor para aqueles que não foram aquinhoados com o crescimento. Não faz sentido retardar, em seguida -- como fez a Índia e, em certa extensão, também o Brasil -- os investimentos em infraestrutura de energia e transportes, que são um prerrequisito para um crescimento futuro [bingo para os ingleses!].
Infelizmente, muitos governos do mundo emergente interpretaram a crise nas finanças dos países ricos como uma razão para dar mais musculatura ao papel do Estado. A China reservou alguns setores para empresas estatais. No Brasil, a grande empresa petrolífera estatal Petrobras e os bancos estatais tornaram-se literalmente apêndices da política do governo. Ter tanta alavancagem sobre a economia é inegavelmente útil durante uma crise, mas a longo prazo isso sufocará a competição, matará o setor privado por falta de capital, afastará os investimentos e o know-how estrangeiros, e estimulará a corrupção.
Quando a poeira assentar, os mercados emergentes estarão ainda crescendo mais rápido do que fizeram antes de 2003. Mas, obter backup para a velocidade da década passada significará manter a disciplina macroeconômica e retornar às reformas microeconômicas que basicamente permitiram aquele avanço.
Infelizmente, muitos governos do mundo emergente interpretaram a crise nas finanças dos países ricos como uma razão para dar mais musculatura ao papel do Estado. A China reservou alguns setores para empresas estatais. No Brasil, a grande empresa petrolífera estatal Petrobras e os bancos estatais tornaram-se literalmente apêndices da política do governo. Ter tanta alavancagem sobre a economia é inegavelmente útil durante uma crise, mas a longo prazo isso sufocará a competição, matará o setor privado por falta de capital, afastará os investimentos e o know-how estrangeiros, e estimulará a corrupção.
Quando a poeira assentar, os mercados emergentes estarão ainda crescendo mais rápido do que fizeram antes de 2003. Mas, obter backup para a velocidade da década passada significará manter a disciplina macroeconômica e retornar às reformas microeconômicas que basicamente permitiram aquele avanço.
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