Até o fim do primeiro semestre, as
empresas estatais conseguiram executar só 19,7% do orçamento de investimento previsto para 2012,
excluindo a Petrobras e suas subsidiárias. Mesmo tendo desembolsado R$ 4
bilhões, um valor recorde para o período de janeiro a junho, ficou
patente a dificuldade em tirar do papel investimentos já autorizados
pelo governo.
A lentidão nos gastos afeta estatais de áreas estratégicas para a
infraestrutura e a prestação de serviços, como Infraero, Correios,
Dataprev, Eletronuclear, Telebrás e seis companhias docas. Em todas
elas, os desembolsos se mantiveram abaixo de 20% do orçamento autorizado
para o ano, colocando em xeque a capacidade dessas empresas de investir
todo o dinheiro disponível em 2012.
Geralmente, a dificuldade em gastar esbarra em problemas já conhecidos
da máquina pública, como a demora nos processos de licitação. Um exemplo
disso pode ser visto na Eletronuclear, que tem R$ 2,6 bilhões para
investir neste ano, mas só conseguiu aplicar 8,4% dos recursos até
junho. A estatal é responsável pela construção da usina nuclear Angra 3, um
projeto de aproximadamente R$ 10 bilhões, com início de suas operações
comerciais previsto para dezembro de 2015.
Quadro do nível de execução de obras das principais estatais do país, face à sua dotação orçamentária - (Gráfico: Valor Econômico - clique na imagem para ampliá-la).
Na semana passada, o cronograma foi modificado, levando essa previsão
para julho de 2016 - atraso de sete meses. Tudo por causa da demora em
concluir a licitação para contratar os serviços de montagem
eletromecânica, a principal concorrência em andamento, que foi objeto de
recursos e pedidos de impugnação por empresas que participaram da
disputa. Um concorrente que não foi habilitado na fase de
pré-qualificação também recorreu ao Tribunal de Contas da União.
O assistente da presidência da Eletronuclear, Leonam dos Santos
Guimarães, está otimista com a superação dos problemas e trabalha com a
perspectiva de que os vencedores da licitação comecem a fazer seus
serviços no fim de 2012. "Os principais problemas que levaram ao atraso
de Angra 3 estão equacionados e haverá uma aceleração da execução
financeira, de forma que, em 2013, as obras terão ritmo sustentado para
cumprir o novo cronograma", afirma Guimarães.
A situação da Companhia Docas do Rio de Janeiro (CDRJ) também preocupa.
De olho na Copa do Mundo de 2014 e na Olimpíada de 2016, ela ganhou um
orçamento de R$ 377 milhões para investir neste ano, mas é campeã em
baixo desempenho: executou 0,3% disso no primeiro semestre. Os dois principais projetos da estatal enfrentam restrições judiciais. A
implantação de um píer em Y - o que permitiria a atração de seis navios
de passageiros ao mesmo tempo - e o reforço estrutural do Cais da
Gamboa estão com as licitações paradas. "O baixo desempenho da CDRJ se
justifica pelo fato de as duas principais licitações estarem com
pendências judiciais", informou, em nota, a Secretaria de Portos.
O novo píer era um dos trunfos do governo para amenizar a falta de
capacidade hoteleira e aumentar a oferta de leitos turísticos no Rio,
durante a realização dos eventos esportivos. Pelas estimativas do setor,
a atração de seis navios ajudaria a oferecer até dez mil "leitos
flutuantes", já na Copa de 2014. As obras deveriam ter começado em maio
de 2011. Depois, o início foi adiado para fevereiro de 2012, mas nem a
licitação foi concluída. Diante do impasse, o cronograma fica totalmente
ameaçado, já que se estimava em 34 meses o tempo necessário para
construir o píer.
O governo diz que, apesar de todos os obstáculos, há uma nítida evolução
no ritmo de investimentos das estatais. Em 2010, a execução foi de R$
3,143 bilhões nos seis primeiros meses do ano, excetuando os gastos da
Petrobras. Os investimentos aumentaram para R$ 3,492 bilhões de janeiro a
junho de 2011. Agora, chegaram a exatos R$ 4 bilhões.
A meta oficial é acelerar os investimentos das estatais no segundo
semestre e levar o nível de execução do orçamento para 80% a 85% até o
fim do ano. Além das barreiras que engessam historicamente a máquina
pública, como atrasos nas licitações, técnicos do governo apontam o
surgimento de um fato "novo": muitas empresas têm dificuldade, com as
rápidas mudanças no ambiente econômico, de implementar planos de
negócios formulados nos últimos meses de 2011. Conforme lembrou um funcionário do governo que acompanha o assunto, a
taxa básica de juros caiu quatro pontos percentuais e o câmbio mudou de
patamar, desde janeiro. Por outro lado, o cenário internacional se
deteriorou, aumentando a dificuldade de obter empréstimos fora dos
bancos públicos. Tudo isso exige ajustes no planejamento, o que pode
atrasar a execução.
Na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), que executou 15,9%
dos recursos para investimentos em 2012, a promessa é acelerar os
desembolsos no segundo semestre. Segundo a estatal, "diversas licitações
e projetos iniciados no primeiro semestre se concretizarão nos próximos
meses", tornando factível a expectativa de atingir uma execução de
"mais de 80%" até o fim do ano. Só na compra de terrenos para a
construção de centros de triagem - em São Paulo, no Distrito Federal e
na Bahia - a estatal pretende investir R$ 186 milhões, segundo sua
assessoria.
Os investimentos da Infraero também demoram a ganhar velocidade. Com
pressa para avançar nas obras de ampliação dos aeroportos, a empresa
desembolsou 18,4% do previsto para todo o ano. Mesmo assim, ela aplicou
R$ 369 milhões entre janeiro e junho, mais do que duplicando o valor
executado - R$ 144 milhões - em igual período de 2011. Projetos
importantes, com contratos assinados e ordens de serviço expedidas
recentemente, tendem a acelerar o ritmo de gastos. É o caso da ampliação
do terminal de passageiros de Fortaleza e a construção de uma nova
torre de controle em Salvador.
O economista Mansueto de Almeida, do Ipea, não vê com tanto otimismo as
chances de aceleração dos investimentos. "Se a execução foi ruim no
primeiro semestre, não há tantas razões para melhorar muito no segundo
semestre".
Para todo o ano de 2012, o orçamento das estatais para investir chega a
R$ 107 bilhões, dos quais R$ 86,8 bilhões são da Petrobras e suas
subsidiárias. As demais empresas têm R$ 20,2 bilhões para gastar em seus
projetos. Ambos os valores são recordes.
[As razões levantadas pelo jornal -- questões judiiciais, mudanças na economia, etc -- explicam apenas parte dos problemas para o baixo nível de execução orçamentária das estatais. Em várias destas empresas, o nível de incompetência para investir não é nada desprezível. Cabe lembrar ainda que a orgia de greves de setores essenciais da área federal que castiga o país -- uma infeliz conjugação de baderna consentida, pela falta de regulamentação do direito de greve em serviços públicos federais, com a inépcia do governo em lidar com o problema -- certamente prejudicará direta e indiretamente alguns desses investimentos já atrasados.
No quadro apresentado pelo jornal Valor Econômico e reproduzido acima, faltam inexplicavelmente duas importantes subsidiárias da Eletrobras -- Eletronorte e Eletrosul --, além de várias empresas de distribuição de energia elétrica que estão sob a administração dessa estatal. Duvido muito que estejam com investimentos em dia, ou avançados até o razoável.]
Nenhum comentário:
Postar um comentário