Reparos caros e complexos
As barras de suporte são feitas de materiais compostos inovadores, contendo fibras de carbono. "Os suportes correspondentes é que são realmente o problema", explica McKenzie. Eles conectam as barras transversais com a superfície externa das asas, e são feitos de uma liga de alumínio especialmente leve, que tem a infeliz desvantagem de ser sujeita a fissura nesse local em particular. Com o uso desses materiais de alta tecnologia, os engenheiros da Airbus conseguiram reduzir o peso da aeronave em algumas poucas centenas de quilos, o que é considerável. Não viram como um risco o uso desses materiais. "Usamos essa liga em muitas outras aeronaves no passado", diz Williams, o projetista do A380.
O problema é que o alumínio dos suportes começa a fissurar depois de umas poucas centenas de decolagens e aterrissagens. Um espaçamento um pouco maior entre a base e a superfície externa também desempenha um papel nessa história. "Estamos falando de algo menor que um milímetro", diz McKenzie. Mas, aparentemente, resultou em tensão ou esforço excessivo. A asa do A380 é submetida a forças tremendas, que fazem com que, durante o voo, a ponta possa curvar-se para cima em mais de dois metros, ou para baixo em um metro. Diferenças de temperatura enormes também são um problema. "Enquanto a nave está estacionada na pista em Dubai, o material se aquece a 70°C", diz Williams. "E, quando o avião está voando em altitude de cruzeiro, ele se resfria para menos 50°C".
De acordo com a Airbus, o dano nas asas não é perigoso, porque há 4.000 suportes em jogo. Entretanto, as fissuras capilares têm que ser reparadas, e o grande número de suportes defeituosos faz disso um processo complexo e caro. Primeiro, o querosene tem que ser drenado dos tanques. Depois, os mecânicos entram nas asas através das pequenas aberturas de inspeção. "Quem tem físico avantajado enfrenta problemas", diz Williams.
Antes do início dos reparos, a asa tem que ser levantada para aliviar qualquer tensão estrutural. "Então, cortamos as peças e colocamos outras novas", explica o engenheiro. Mas, simplesmente substituir os suportes não é uma solução permanente para o problema, acrescenta ele, porque as fissuras capilares podem aparecer também nos suportes novos. Como a mesma liga ainda está sendo usada na produção, o reparo permanece sendo um remendo. "Estaremos enfrentando o problema todo durante anos pela frente", diz Williams.
Problemas mais demandantes
Ele e seus engenheiros estão sob enorme pressão. Mais asas defeituosas estão sendo constantemente produzidas na fábrica de Broughton, País de Gales -- asas que, então, McKenzie e sua equipe instalam nas fuselagens em Toulouse -- e mais tarde têm que consertá-las. Williams planeja propor em abril uma solução permanente à administração da Airbus. Presumivelmente, essa solução envolve o uso de uma liga mais forte, embora isso tenha primeiro que passar pelo procedimento usual de aprovação. Espera-se que a instalação das novas peças comece no final do ano e, como resultado, o A380 deverá ganhar cerca de 90 kg no peso.
Ainda não se sabe o custo final desse problema das asas para a EADS, a matriz da Airbus. A empresa, no momento, destinou no seu orçamento mais de € 100 milhões (US$ 131 milhões) para custear o reparo de todas as aeronaves produzidas até o final de 2012. Mas, esse montante pode rapidamente duplicar, ou mesmo triplicar, se as aeronaves, que são muito populares entre os passageiros, exigirem reparos adicionais. Mecânicos da linha aérea australiana Qantas estimam que a tarefa levará duas semanas, o que a Airbus se recusa a confirmar. A Emirates, com sede em Dubai, já demandou € 60 milhões em prejuízos, pelo tempo já perdido com os reparos. A competidora Qantas afirma: "A Qantas não planeja pedir compensação à Airbus". Circulam rumores de negociações secretas já em andamento com a Singapore Airlines, mas a Airbus não quis comentar o assunto.
O vice-presidente executivo Williams aponta a questão das fissuras como um dos problemas mais aflitivos que sempre envolvem uma nova aeronave. "Você tem simplesmente que passar por isso", diz ele. "A Boeing enfrenta desafios semelhantes". Mas, o A380, como representante de uma nova classe de aeronave, esteve sob mais observação desde o início. Valem a pena os problemas com as aeronaves cada vez maiores? "Não siga o caminho de seu rival, quando ele estiver cometendo erros", disse o lendário ex-diretor da Boeing, Harry Stonecipher, quando a Airbus decidiu construir o A380.
A Boeing está convencida de que o futuro pertence às aeronaves de longo alcance um tanto menores, que transportam 300 passageiros, e não ao gigantesco superjumbo de 600 assentos, porque os passageiros preferem voar diretamente para seus destinos do que fazer escala em grandes aeroportos como o de Londres. De fato, as coisas poderiam ser melhores para o A380. As más notícias começaram com a instalação elétrica do gigantesco jato. No final de 2010, uma turbina explodiu num Airbus da Qantas perto de Cingapura. Os estilhaços da turbina explodida penetraram na asa, e mecânicos chocados da Qantas descobriram depois que esses estilhaços atingiram a fuselagem, e por muita sorte não entraram cabine adentro cortando tudo como faca na manteiga.
Um conflito conceitual de engenharia
Depois desse quase desastre, o tema das fissuras capilares tornou-se o problema mais recente do superjumbo. O A380 ainda não contribuiu sequer para o lucro total da empresa. No início, a Airbus disse que teria que vender cerca de 250 aeronaves para recuperar seus custos. Esse número foi, depois, quase duplicado. Agora, os executivos da Airbus nem mais se referem a um ponto de equilíbrio para as vendas (break-even point), e por uma boa razão. De acordo com estimativas mais recentes de especialistas em aviação, a Airbus terá que vender pelo menos 600 unidades do maior avião do mundo para conseguir um lucro. Mas, com um total de 253 pedidos em carteira até agora, a empresa tem ainda um longo caminho para atingir esse objetivo.
A carteira de pedidos revela também um importante ponto fraco. Embora venda grandes quantidades de aeronaves menores, como o A320neo, a Airbus vem tendo dificuldade para encontrar compradores para suas aeronaves de longo alcance. No ano passado, as linhas aéreas encomendaram apenas 19 A380. Contrariando as expectativas da Airbus, nenhuma encomenda foi feita para o A380 no mais importante evento de aviação asiático, em Cingapura, em meados de fevereiro. Em vez disso, as linhas aéreas encomendaram suas grandes aeronaves da Boeing, especialmente o B777, o mais vendido entre as aeronaves de longo alcance.
Executivos da Airbus consolam-se um pouco com o fato de a Boeing estar no momento enfrentando problemas para vender seu 747. Mas, o competidor americano parece ter tirado suas lições das fracas vendas do 747, anunciando planos para desenvolver uma versão ainda maior do biturbinado 747, que poderia levar mais de 400 passageiros ou quase tanto quanto um jato jumbo. [E a história, mencionada acima, de que a Boeing considerar que o futuro é dos jatos de 300 passageiros?...]
Com poucos modelos comparáveis a esse em sua atual linha de produção, a Airbus está trabalhando com um modelo de A350 redesenhado para longo alcance, para preencher esse vazio, mas essa nova aeronave não estará pronta para entrega até pelo menos 2014. Enquanto isso, continua a batalha para a redução do peso das aeronaves, assim como o conflito entre duas culturas de engenharia: os engenheiros devem usar ainda mais os materiais de alta tecnologia para reduzir peso? Ou eles deveriam ater-se aos materiais testados e comprovados, para evitar surpresas desagradáveis como as fissuras capilares nas asas do A380?
Williams alerta contra a possibilidade de errar demais no lado da cautela por causa apenas desse desastre isolado. "Se não tivéssemos nunca embarcado em novos caminhos, as aeronaves seriam feitas ainda de madeira e lona".
Um A380 da Airbus - (Foto: Divulgação).
Um Boeing 747-400 da Lufthansa - (Foto: Divulgação).
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