O filme Senna estreou na semana passada nos Estados Unidos e conquistou a melhor estreia do ano para um documentário, informa o site Hollywood Reporter. O recorde foi calculado em relação ao número de salas onde o filme está sendo exibido. Senna já arrecadou US$ 6,6 milhões no mundo. Só no Reino Unido a bilheteria foi de US$ 5,1 milhões.
Senna (Universal Pictures), o primeiro documentário do diretor inglês Asif Kapadia (The Warrior, Far North), permanece, como o homem que focaliza, um enigma sedutor. Ayrton Senna, o piloto brasileiro que ganhou três campeonatos mundiais da Fórmula 1 antes de sua morte com 34 anos, aparece no filme como um ideal abstrato de atleta. Ele era movido pelo absoluto amor à velocidade e por um desejo de vencer tão puro como o instinto dos animais. Embora o filme nos mergulhe nos detalhes da vida de Senna e do mundo da Fórmula 1 durante 104 minutos eletrizantes, saímos do cinema querendo saber ainda quem era Senna e como funciona o mundo da Fórmula 1. A primeira das duas incógnitas permanecerá sem resposta, já que o homem não está mais entre nós para nos dizê-la. A segunda, por outro lado, é perfeitamente acessível e o filme poderia ter sido melhor para explicá-la.
Pode ser que Senna deixe o espectador que não é fã de corrida de carros carente por uma iniciação nas regras e na cultura desse esporte, mas se destaca por nos imergir nas sensações da corrida -- algumas vezes nos colocando bem dentro do carro com o piloto. Esse documentário suave e de narração livre avança veloz mas elegantemente pelos poucos últimos anos da carreira de Senna -- os anos das vitórias no pico de sua carreira, suas derrotas mais dolorosas, e sua legendária rivalidade com o piloto francês Alain Prost.
Quando se diz que a rivalidade entre Senna e Prost era "legendária", isto não é apenas um sinônimo para "bem conhecida". A relação entre os dois era a essência da lenda. Observá-los invejando, desapontando, traindo e enfurecendo um ao outro é emocionalmente tão rico como uma tragédia grega ou uma peça de Shakespeare. Prost, que pilotou junto com Senna na escuderia McLaren-Honda, já era um astro reconhecido quando o brasileiro mais jovem e mais bonito tornou-se seu companheiro de equipe e principal competidor em 1988. Conhecido como "O Mestre", Prost era um piloto cauteloso e esperto, que era mais aplicado em jogar a essência do esporte para garantir uma vitória técnica do que simplesmente chegar em primeiro lugar. Senna, por outro lado, era um poeta torturado atrás do volante, deliberadamente ingênuo sobre as políticas da disputa mas ferozmente devotado a chegar em primeiro.
Um colega de corrida de Senna o descreve como dirigindo com "inteligência". "Eu estava em uma dimensão diferente", diz o próprio Senna em uma entrevista, lembrando uma corrida crucial em 1988. "O circuito para mim era eterno -- percebi que estava bem além da minha compreensão consciente". Tempos depois, quando ganhou seu primeiro Grande Prêmio do Brasil -- uma corrida que, embora ele já tivesse conquistado o campeonato mundia, significava para ele país e lar -- estamos com ele dentro do carro quando ele solta um longo grito de alegria e depois rompe em incontroláveis soluços. Seu modo expressivo de reagir está muito longe do jeito "monossilábico" dos atletas americanos, mas o documentário prova (sem jamais fazê-lo abertamente) que o arrebatamento espiritual que Senna descreve é o objeto supremo de todo o esforço de um atleta. O documentário é um filme que a
é tanto sobre o esporte em si como pelo esporte de corrida de carros.
O filme apenas insinua as contradições do homem Senna, que era ao mesmo tempo profundamente religioso e abertamente mundano -- o playboy filho de uma família abastada, que namorou celebridades e flertava com suas entrevistadoras. A falta de um contexto social e político pode ser também frustrante. Senna surgiu no momento em que o Brasil estava lentamente emergindo de décadas de ditadura militar e de uma inflação avassaladora, o que em parte pode ter sido responsável pelo fato dele ter se tornado imediata e completamente um objeto de adoração nacional.
Ayrton Senna comemora sua primeira vitória em Interlagos (Foto: Slate).
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