segunda-feira, 22 de outubro de 2012

O álcool mata mais rápido que o cigarro, e casas noturnas no Rio fazem promoções para que nossos jovens se embebedem

[Nunca consegui entender -- entender até que dá, o que não dá é p'ra aceitar --  por que o vício do álcool no Brasil nunca recebe pública e ostensivamente a mesma carga de condenação que o vício do fumo. É evidente que o lobby da indústria de bebidas alcoólicas, a começar pelo dos fabricantes de cervejas, é fortíssimo e os governos têm sido irresponsável e criminosamente coniventes com esse setor -- e a cerveja funciona como porta de entrada para bebidas mais fortes. Recentemente, comentei o absurdo recuo do governo de Dª Dilma ao postergar para depois do Carnaval o aumento de impostos sobre as cervejas.  Nossa ex-guerrilheira só banca a valente em alvos seletivos, que dão ibope, mas no caso da venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante a Copa de 2014 ela se curvou à Fifa e à Ambev, e tornou letra morta nossa legislação vigente sobre isso. -- Reproduzo a seguir reportagem de hoje do Globo sobre pesquisa alemã sobre os efeitos letais do alcoolismo.]

Pesquisadores alemães realizaram estudos durante 14 anos para analisar os problemas do alcoolismo. A pesquisa, publicada pelo jornal “Alcoholism: Clinical & Experimental Research” apresenta o impacto da dependência do álcool por um longo período.

De acordo com os resultados, o hábito de consumir bebidas alcoólicas mata mais rapidamente do que fumar. Eles afirmam ainda que o consumo do álcool coloca as mulheres em maior risco do que os homens, uma vez que a taxa de mortalidade entre as mulheres dependentes foi 4,6 vezes maior do que as que não são dependentes da bebida, enquanto, entre os homens, a taxa de mortalidade corresponde a quase o dobro da apresentada pela população do sexo masculino em geral. A pesquisa mostrou também que pessoas dependentes de álcool vivem, em média, menos do que os fumantes. O estudo revela que o alcoólicos morrem 20 anos mais cedo, em média, do que a população geral.  "Os dados clínicos mostram uma maior proporção de óbito entre os indivíduos dependentes de álcool, quando comparados com outros da mesma idade e que não são dependentes", diz o professor John Ulrich, da Universidade de Medicina de Greifswald.

Para realizar a análise, a equipe do professor Ulrich olhou para uma amostra aleatória de 4.070 pessoas com idades entre 18 e 64 anos, dos quais 153 foram identificados como dependentes do álcool. Destes, 149, sendo 119 homens e 30 mulheres, foram acompanhados durante 14 anos.  "Verificamos que a idade média de morte entre os dependentes era de 60 para as mulheres e 58 para homens, sendo que ambos são cerca de 20 anos menor do que a idade média de morte entre a população em geral. Nenhuma dessas pessoas que foram a óbito tinha atingido a expectativa de vida", disse o professor Ulrich. — Outro dado relevante foi que, mesmo participando de tratamento para a doença, não identificamos uma maior sobrevida, o que significa que não parece ter um efeito protetor suficiente contra a morte prematura.

O professor Ulrich conclui dizendo que: "O fumo está muito relacionado ao câncer, que, de acordo com pesquisas, são diagnosticados mais tarde do que os problemas relacionados ao consumo de álcool. Além disso, beber também pode contribuir para outros comportamentos de risco, como tabagismo, excesso de peso e obesidade. O álcool é um produto perigoso e deve ser consumido apenas dentro das diretrizes".  [Não no Brasil, onde o álcool é visto e tratado como enorme fonte de receita tributária a ser paparicada e protegida.]

[Coincidentemente, a Revista O Globo de ontem publicou uma longa e estarrecedora reportagem (de Mariana Filgueiras) sobre a moda em voga nas casas noturnas do Rio frequentadas por jovens -- a revista relaciona nada menos que 16 casas desse tipo na noite carioca -- que é a de "premiar" com bebidas alcoólicas os jovens que participam das promoções e jogos desses locais. Todas as promoções têm como traço comum seu enorme nível de boçalidade e a criminosa irresponsabilidade de quem as implanta e estimula.

Na Pop Up!, por exemplo a promoção é "Welcome shots de cachaça + Megabeerbong (funil para 4 pessoas) + sorteio de barril de cerveja". -- Na Taverna Viking, "fantasiados de viking ganham hidromel [bebida alcoólica fermentada à base de água e mel] + concurso de beijo (o casal com melhor performance no palco ganha uma garrafa de bebida).  Na Battles!, batalha de bebidas variadas: quem vira o copo primeiro ganha ingressos VIP na festa seguinte. Na American Party, joga-se o Beerpong: a uma certa distância, quem acerta o copo do adversário com uma bolinha de pingue-pongue o obriga a virar um copo de bebida.

Conhecidas como "drinking games", as brincadeiras que estimulam o consumo excessivo de álcool hoje são os principais atrativos das festas com público entre 18 e 24 anos que ocupam locais como Fosfobox, em Copacabana; Espaço Franklin, no Centro; e Espaço Rampa, em Botafogo; além do Odisseia e do Espaço Acústica. A despeito da música ou do público, o chamariz são os jogos que envolvem bebida, seja como mote ou premiação. Outros exemplos que chamam a atenção são a festa Tekiller, que tem uma Batalha de Tequila, na qual ganha uma garrafa da bebida quem vira quatro doses primeiro. Em algumas edições, “o primeiro a cair bêbado ganha uma tatuagem”, como escrito na filipeta de divulgação.

"Antigamente, o mais importante era a música. Hoje em dia, para uma festa ser boa, ela tem que ter muitas atrações. Cada dia aparecem mais festas disputando o mesmo público, se não criarmos um diferencial, não atraímos as pessoas", justifica [!...] a produtora Luísa de Castro, de 21 anos, que se formou em Gastronomia e, há quatro meses, trocou o estágio numa fábrica de tortas pelo emprego na produtora de festas Blue Fish, responsável pela Tekiller, Taverna Viking e Bubble Pop, que distribui champanhe. "Festa hoje em dia é igual a cruzeiro. Antes, as pessoas queriam viajar. Hoje em dia, todo mundo quer “fazer um cruzeiro”. O que vale são as atrações, os brindes, as fantasias, os games". [Com 21 anos e esse raciocínio idiota, essa menina vai acabar comendo capim e espetando sorvete na testa em uma de suas promoções.]

Como não podia deixar de ser, a macaquice da nossa juventude está se afundando no vício do álcool em festas copiadas dos EUA e da Alemanha.  Vou alimentar a doce ilusão de que alguma autoridade se revolte também com o que foi publicado, e proíba a continuação dessa estupidez. Será que não dá para o Ministério Público, que tem se destacado por atitudes meritórias, se envolver nisso, punindo não só as casas listadas na revista (Pop Up! - Taverna Viking - Zombieland - Wonka Party - Tropical Bacanal - Tekiller - 7 Day Weekend - Bubble Pop - Chocolat Party - Battles! - Allcool Party - American Party - Game Over - Festa do Bigode - Erasmus Party - Higher!) como também quem deu alvará para esse tipo de barbaridade?

Para encerrar a lista de mediocridades, aí vai a foto de uma competição de bambolê valendo uísque na Tropical Bacanal -- presto desde já minha solidariedade à preocupação e à vergonha dos pais dos jovens nela retratados. 

Competição do bambolê na Tropical Bacanal, valendo doses de uísque para os ganhadores - (Foto: O Globo).
 





 




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