quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Na decantada 6ª economia do mundo as condições de saneamento básico são catastróficas

[Estou convencido de que esse auê todo com a notícia de que somos a 6ª economia do mundo nos tem feito um mal danado, e que há interesse do governo em que isso permaneça recorrentemente explicitado nas mídias. Esse é exatamente o tipo de informação que transmite uma falsa euforia e anestesia a população, deixando-a absolutamente alienada quanto aos enormes problemas pendentes que nos afligem e à criminosa omissão dos governos em relação a eles. Nossos índices em questões fundamentais para um mínimo de vida decente para um ser humano -- educação, saúde pública, saneamento, transporte, infraestrutura, etc, etc -- são ridículos e vergonhosos. Mas continuamos comendo dobradinha e arrotando caviar -- e o governo é o principal responsável, por ação e omissão, por esse estado de coisas. E é bom não esquecer que estamos completando 10 anos de governo petista.

No item saneamento básico, o próprio governo, através do presidente da ANA - Agência Nacional de Águas, Vicente Andreu, reconhecia em abril deste ano que a situação do Brasil é "catastrófica" -- se perguntarem quem é o culpado disso, certamente os petistas vão dizer que é o FHC ... No caderno Globo Amanhã publicado ontem, só disponível para leitores e assinantes do jornal, há uma preocupante matéria da jornalista Cleide Carvalho sobre o tema, que reproduzo a seguir. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]

Águas doces, porém encharcadas de químicos

Cleide Carvalho - O Globo Amanhã - 02/10/2012

Num país em que apenas 45,7% dos domicílios têm acesso a saneamento e, quando têm, o esgoto tratado não passa de 30,5%, é de se esperar que a natureza, sozinha, não seja capaz de manter ou recompor a qualidade das águas. Mais da metade dos pontos de amostragem monitorados no país apresentam coliformes fecais termotolerantes (que toleram temperaturas acima de 40°C) e 40% registram a presença de fósforo em limites acima dos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), segundo o Índice de Qualidade das Águas, da Agência Nacional de Águas (ANA).

O assunto preocupa o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), que se reuniu em Nairóbi, na África, nos últimos dias, para discutir ações coordenadas entre governos e indústria para reduzir as crescentes ameaças à saúde humana e ao meio ambiente, oferecidas pelo manejo insustentável de químicos no mundo.

Projeções do Programa Global de Químicos do Pnuma apontam para um crescimento de 3% das vendas globais de produtos químicos até 2050. Os países emergentes e em desenvolvimento são, na opinião do dubsecretário geral da ONU e Diretor Executivo do Pnuma, Achim Steiner, cada vez mais "dependentes de produtos químicos, desde fertilizantes e petroquímicos até eletrônicos e plásticos". Bo caso brasileiro, o fósforo e o nitrogênio são considerados especialmente danosos ao meio ambiente.

Do volume de esgoto sanitário tratado no Brasil apenas 10% passam pela fase de remoção do fósforo. Nos ambientes urbanos, os detergentes de uso doméstico são os principais vilões. Nas áreas rurais, o fósforo presente nos fertilizantes pode causar excesso de nutrientes nos corpos d'água superficiais e o nitrogênio, por sua vez, pode contaminar águas subterrâneas. "Pequenas dosagens são capazes de produzir grandes estragos a longo prazo", afirma Ney Maranhão, superintendente de Recursos Hídricos da ANA.

Outro estudo da agência, sobre os afluentes da margem direita do Amazonas, manifesta preocupação com o desmatamento e a expansão agrícola na Amazônia. Além do assoreamento dos rios, a ANA alerta para a possibilidade de contaminação dos corpos d'água por agrotóxicos e fertilizantes nas bacias dos rios Tapajós, Xingu e Madeira. O documento destaca ainda a preocupação com a bacia do Alto Xingu, cujas nascentes se localizam em áreas agrícolas. As águas drenam justamente para a reserva do Parque Indígena do Xingu.

"Os índios reclamam de diarreias, mas não fica clara a relação com agrotóxicos. A área merece atenção e é preciso pesquisar a presença de substâncias químicas, para que possam ser tomadas medidas de controle e ações pedagógicas", diz Maranhão.

Nas análises feitas na região das nascentes do Xingu foram encontradas amônia  na água e perda de oxigênio, além de coliformes. Alguns trechos do Xingu já são considerados altamente críticos, na região de Feliz Natal e Claudia. A ANA alerta para problemas de baixa disponibilidade hídrica entre Altamira e Vitória do Xingu.

Pesquisa da Universidade Federal do Ceará, de 2010, detectou agrotóxicos nas águas subterrâneas do Aquífero Jandaíra, que sofre com um déficit estimado em 4 milhões de metros cúbicos por ano entre a quantidade de água retirada para irrigação e a reposição pelas chuvas. De dez amostras, seis delas revelaram resíduos de agrotóxicos carreados ao aquífero pelas chuvas. As 23 amostras colhidas na Chapada do Apodi denunciaram a presença de 3 até 12 substãncias presentes nos venenos usados para controle de pragas agrícolas. Essas águas são utilizadas para consumo humano.

[As notícias de agressões ao rio Xingu e à sua bacia se multiplicam e são muito preocupantes. Recentemente, foi fechado um garimpo clandestino no rio Fresco, um dos afluentes do Xingu, que já havia provocado um desastre considerável na região da Terra Indígena Kayapó: 160 hectares de terra arrasada, poluição por mercúrio, e pelo menos 30 minas abertas pelos garimpeiros, deixando para trás desmatamento, solo exposto e grandes lagoas de água contaminada.

O país precisa se preparar para um ciclo de cada vez maior intervenção humana na Amazônia, porque ali estão as nossas grandes e últimas reservas hídricas para aproveitamentos hidroelétricos. Quanto a isso, não pode haver hipocrisia: não fazer usina hidroelétrica é fazer usina térmica e sujar de vez nossa matriz energética. Mesmo que sejam a fio d'água, usinas hidroelétricas inevitavelmente trazem problemas e o pior deles é, invariavelmente, acarretado pelo homem -- usinas são polos de criação de centros urbanos, que são enormes multiplicadores de agressões ambientais, principalmente num país em que saneamento básico, saúde pública e educação pública são relegados a terceiro plano. A sociedade brasileira precisa urgentemente abdicar da posição cômoda de espectadora passiva e se engajar definitivamente na luta por desenvolvimento sustentável e respeito ambiental, o que no fundo e na essência é um gesto de autoestima e autoproteção.]





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