quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Mais uma mancada do governo Dilma

Até ontem eu considerava o ministro Aloizio Mercadante um dos bons "quadros" (usando o jargão dos políticos) do governo Dilma, mas mudei radicalmente de posição depois que li ontem no Globo (pág. 32) a notícia do papelão do Brasil omitindo-se na montagem da estrutura financeira do maior telescópio do mundo, no Chile.

A história lamentável, resumidamente, é a seguinte:
  • em 2010, no governo Lula (o Nosso Pinóquio Acrobata), o Brasil comprometeu-se a participar financeiramente (e, consequentemente, ter direito aos benefícios científicos daí decorrentes) da construção do Observatório Europeu do Sul (ESO, na sigla em inglês) no deserto de Atacama no Chile;
  • orçado em 1 bilhão de euros, o European Extremely Large Telescope (E-ELT, em inglês) será o maior equipamento do tipo no mundo, capaz de gerar imagens mais nítidas que as do telescópio espacial Huble e desvendar alguns dos maiores segredos do Universo, como a natureza das misteriosas matéria e energia escuras, e analisar a atmosfera de planetas extrassolares na busca por uma segunda Terra;
  • para sair do papel, o projeto depende dos recursos que virão da inclusão do Brasil como o 15° e primeiro país não europeu do ESO (o grifo é meu). Do total do investimento, 300 milhões de euros sairiam das receitas comuns da organização, 400 milhões de euros de recursos extras prometidos pelos atuais membros, cabendo ao Brasil financiar os 300 milhões restantes. Pelos termos do acordo de 2010, o país deverá pagar uma taxa de 130 milhões de euros pela sua adesão à organização ao longo de dez anos, além de uma contribuição anual que vai variar de 30 a 50 milhões de euros no mesmo período. De acordo com o diretor geral do ESO, os valores devidos pelo Brasil representam um desconto de 30% sobre o que seria usual, já que a política da organização estabelece as contribuições segundo o tamanho das economias de seus membros.
O diretor geral do ESO, Tim de Zeeuw, diz que não pode começar o projeto sem a adesão do Brasil, o que atrasa o E-ELT. "Não podemos construir o telescópio só com a nossa receita. Precisamos do Brasil, assim como de todos os outros países membros, para ter o dinheiro adicional. Quase todos os atuais integrantes já se comprometeram em fornecer os recursos extras, mas antes querem saber se o projeto é viável. Se o Brasil já tivesse ratificado a adesão, creio que já estaríamos prontos para começar a construção", diz ele.  Abrindo um parênteses, vejo nessa declaração do diretor do ESO um certo terrorismo ao jogar sobre o Brasil, o "único país não europeu do grupo" (as aspas são minhas), a responsabilidade pelo não início da construção do telescópio, mas isso não reduz em nada o vexame de assumirmos um compromisso internacional e não honrá-lo.

O pior é que Zeeuw diz ter tentado durante todo o ano de 2011, sem êxito, uma audiência com o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aloizio Mercadante. "Tentei marcar audiência e não tive resposta, apenas silêncio", diz ele. Isso é, no mínimo, uma grosseria inaceitável e imperdoável de um ministro de Estado que se dê o devido respeito. Mercadante não tem o direito de expor assim o país.

Conhecendo a presidente Dilma como conheço -- quando chefiava a área internacional da Eletrobrás participei de várias reuniões com ela e de duas missões ao exterior (África e Argentina) chefiadas por ela quando ela era a titular do Ministério de Minas e Energia --  tenho certeza de que ministro algum de seu governo decidiria qualquer coisa da natureza desse assunto do telescópio sem consultá-la (vejam postagem anterior sobre ela). Assim sendo, por ação ou omissão, a Sra. Dilma Rousseff deve ser responsabilizada por mais essa mancada do governo na área científica. Educação, científica ou não, e cultura não são definitivamente seus esportes preferidos, a não ser por motivos eleitorais e eleitoreiros (caso de Fernando Haddad, ex-ministro da Educação, que virou candidato do PT à Prefeitura de S. Paulo) -- na Cultura, ela colocou uma ministra (Ana Buarque de Hollanda) que é um zero à esquerda. Prova do seu menosprezo à educação é que, logo ao assumir o governo no ano passado, Dilma vitimou o Ministério da Educação com um corte orçamentário de R$ 3,1 bilhões, colocando-o entre os ministérios mais afetados por corte de verbas.

É por essa e por outras que fica cada vez mais claro e explícito que o governo Dilma não tem rumo e diretriz definidos, as decisões dela dependem profundamente do volume de bílis produzido por seu fígado -- por isso, continuo firme na minha escolha da biruta de campos de aviação como o símbolo ideal para representar a constância e a firmeza de rumo do governo Dilma Rousseff. Enquanto se omite em assuntos importantes como esse do telescópio, Dilma promoveu em seu primeiro ano de governo um festival de compras sem licitação, com a cifra recorde de cerca de R$ 14 bilhões (equivalente a cerca de 6 bilhões de euros ou 6 telescópios E-ELT e a quase 20 vezes a verba com a qual o Brasil se comprometeu a contribuir para a construção daquele telescópio).  Não é impressionante?!

2 comentários:

  1. Amigo VASCO:
    Embora seja um defensor da participação de brasileros em atividades como essa, julguei inicialmente o valor muito alto para nossa presença em tal projeto. Isso só significaria um maior tempo à disposição dos cientistas/astrônomos brasileiros no uso dessa máquina.
    Confesso não conhecer quais os projetos que poderiamos tocar com as horas colocadas à nossa disposição.
    Acredito que o problema é anterior, ou seja, a decisão de participar, mesmo sem ter um plano de aproveitamento do tempo disponível que teriamos.
    Mas, pode haver outras "explicações": como se trata de uma iniciativa científica envolvendo outros países, fica difícil correr "algum" na modalidade "under the table". Se esse dinheiro fosse aplicado aqui, seguramente "algum" seria "aplicado" de outra forma.

    Abraços - LEVY

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  2. Caro Levy,

    Em princípio,concordo com você que essa participação deveria ter sido melhor ponderada antes de ter sido assumida -- agora tem que ser honrada, para não passarmos por moleques. Não pode é ministro negar audiência para discutí-la.

    Não acredito nem um pouco em que esse dinheiro seria ou seja melhor aplicado aqui, os exemplos do primeiro ano do governo Dilma não nos permitem ter nenhuma certeza quanto a isso. Além dos R$ 14 bi de compras sem licitação que citei agora, há ainda o esdrúxulo trem-bala que a Dª Dilma insiste em construir, por puro exibicionismo e teimosia, que vai nos custar uma baba e está anos-luz de ser uma prioridade em nosso país (já tratei disso em postagem anterior). A educação, em todos os níveis, clama e ruge por verbas (sem falar em saúde, segurança, infraestrutura,etc, etc).

    Outro detalhe: na medida em que cresce no cenário internacional, o Brasil será mais e mais procurado (ou, dependendo do assunto, quase obrigado) a participar política e financeiramente de grupos, políticas e decisões. Liderança não é um produto barato.

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