O texto abaixo, publicado no The Washington Post do dia 06/01, só faz aumentar a confusão sobre a conveniência ou não do exame rotineiro de PSA para avaliação de risco de câncer de próstata em homens de 50 anos ou mais.
Descubra cedo o câncer de próstata, salve uma vida. Esta mensagem tem sido difundida desde 1986, quando um exame de sangue para câncer de próstata chegou pela primeira vez ao mercado. Mais evidências, porém, indicam que, em muitos casos ou até na maioria deles, essa mensagem está errada.
O golpe mais recente contra o exame de PSA (sigla inglesa para Antígeno Prostático Específico) veio na sexta-feira de um estudo amplo e de longo prazo, que descobriu que esse exame de rotina em homens de 55 a 74 anos não evitou mortes por câncer de próstata. "A mensagem é que exame de rotina envolvendo um grande número de pessoas [ou seja, sistemático] não é a solução", disse um dos líderes do estudo, Gerald L. Andriole Jr., do Hospital Barnes-Judeu em St. Louis. "Mas, não precisamos rejeitar o exame de PSA por completo".
Andriole disse que a grande maioria dos cânceres detetados pelo exame de PSA foi de crescimento lento e não letais. Mas, não há exame que possa separar ou diferenciar cânceres potencialmente letais daqueles de tipo não fatal, forçando muitos homens a passar por procedimentos desnecessários de cirurgia, radioterapia e terapia por drogas. Esses tratamentos deixam pacientes com incontinência urinária e incapazes de funcionar sexualmente.
É improvável, porém, que o novo estudo decida o velho debate sobre o valor do exame de PSA, já que proeminentes defensores desse exame disseram que os resultados não alteraram sua opinião. "É um estudo imperfeito, com falhas", disse William J. Catalona, um cirurgião de câncer de próstata na Northwestern University em Chicago, que ajudou a desenvolver o exame de PSA. "Ele na realidade não aborda a questão se a avaliação do PSA salva vidas".
Iniciado em 1993, o estudo financiado pelo Instituto Nacional do Câncer acompanhou durante cerca de 13 anos 76.000 homens em 10 locais através do país. A metade fez exames anuais de PSA durante 6 anos e fez também exames retais digitais, que podem ajudar a detetar certos tumores da próstata. A outra metade, no chamado grupo de "cuidado comunitário" (community care), continuaram sob os cuidados de seus clínicos. Embora os médicos tivessem encontrado cerca de 12% mais cânceres no grupo de exame de PSA, ambos os grupos tiveram número igual de óbitos. Em outras palavras, o fato de detetar cânceres a mais não diminuiu a taxa de mortalidade pela doença.
"Há uma tendência de se achar que, se um exame encontra uma doença, isso é uma coisa boa", disse Otis Webb Brawley, um especialista em exames de avaliação de câncer e médico-chefe da Sociedade Americana de câncer. Mas, isso não é necessariamente assim, ele disse, acrescentando: "Sou muito preocupado com essa "medicina de auditório", onde se vê uma fila de pessoas esperando para serem examinadas, e não há discussão ou educação sobre os riscos e benefícios potenciais [do exame]".
O ideal seria que nenhum dos homens do grupo de "cuidado comunitário" tivesse feito o exame de PSA. Isso teria feito com que o estudo fosse um teste mais isento, ou mais elucidativo, para ver se essa avaliação salva vidas. Mas, nos anos 1990s os médicos de atendimento básico (primary care physicians -- o "primary care" refere-se, basicamente, ao tratamento feito com um clínico geral e não com médicos em um hospital ; é o nosso tratamento "particular") adotaram rapidamente a avaliação rotineira [do PSA] para homens a partir dos 50 anos de idade. Cerca de metade dos homens do grupo de "cuidado comunitário" na realidade fez o exame de PSA.
Isso prejudicou os resultados, disse Jonathan W. Simons, um oncologista e diretor executivo da Fundação de Câncer de Próstata, um grupo de apoio a pacientes. "O estudo é tão basicamente falho, que não nos faz avançar no que temos que fazer para reduzir as mortes provocadas por câncer de próstata".
O estudo, publicado no Jornal do Instituto Nacional do Câncer, foi divulgado no momento em que médicos, pesquisadores, e planejadores de política de saúde questionam cada vez mais se a multiplicidade de exames, drogas e procedimentos não está sendo feita em excesso e desnecessariamente, onerando os custos de atendimento médico. Durante anos, dúvidas têm sido levantadas sobre a sensatez desse exame muito difundido de avaliação do PSA. Muitos cirurgiões de próstata e a Associação Urológica Americana têm questionado que esse exame salva vidas.
O Instituto Nacional do Câncer [americano] nunca recomendou exame de rotina. E a Sociedade Americana de Câncer aconselha os homens acima de 50 a discutir o exame com seus clínicos. Em outubro passado, deflagrou-se um debate nacional quando um influente comitê governamental concluiu que a maioria dos homens não deveria ser examinada rotineiramente. Esse exame não salva vidas, mas sim estimula a realização de tratamento desnecessário, concluiu a Força Tarefa de Serviços Preventivos dos EUA.
Os defensores do exame de rotina acabaram suavizando sua mensagem: "Talvez não necessitemos fazer o exame [de PSA] a cada ano", disse Andrew K. Lee, um oncologista do Centro de Câncer Anderson em Houston. "Talvez possamos fazer alguns exames de PSA como ponto de partida ou referência, e depois fazê-lo a cada dois anos".
O Dr. Andriole, líder do estudo, disse que os homens afro-americanos, que têm o risco mais elevado de morrer de câncer de próstata, e homens com histórico familiar desse tipo de câncer são os que mais chance têm de se beneficiar com esse exame [do PSA].
Brawley disse que homens com 50 anos ou mais devem discutir o exame com seus clínicos. "Isso é muito mais complicado do que dizer simplesmente 'vá e faça o exame'", disse ele.
Simons diz que, embora os benefícios de exames regulares de PSA permaneçam incertos, uma coisa está clara: "Precisamos de um exame melhor que o de PSA".
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