"É extraordinário observar que estamos no século 21 e não conhecemos ainda coisas fundamentais sobre o que vive em nosso planeta", disse Cindy Van Dover, diretora do laboratório marinho da Universidade de Duke, que vem há 30 anos estudando a vida em respiradouros nas profundezas dos mares mas não esteve envolvida em novas descobertas. "Isso é realmente excitante, porque mantém aberta a porta para ainda mais descobertas ao longo do caminho", acrescentou.
Respiradouros hidrotérmicos de extremas profundezas marinhas são fontes que podem expelir água a temperaturas de mais de 420° C. Carregada de produtos químicos e minerais das rochas abaixo dela, essa água quente se mistura com a água do mar muito mais fria num frenesi químico que geralmente provoca jorros borbulhantes negros. Alguns dos minerais formam chaminés muito altas à volta dos respiradouros.
Geólogos descobriram os primeiros respiradouros hidrotérmicos no [Oceano} Pacífico em 1977, perto das Ilhas Galápagos. Eles estavam tão despreparados para encontrar vida num ambiente tão hostil, que não incluíram um biólogo na equipe, e coletaram poucas amostras biológicas. Mas, havia vermes tubulares enormes, alguns da altura de uma pessoa, dominando os respiradouros, junto com lotes de moluscos maciços. Os geólogos colheram algumas amostras dos estranhos animais da melhor maneira que puderam, algumas vezes usando vodca russa que por acaso tinham à mão.
Um trabalho posterior mostrou que os vermes tubulares e outros animais dos respiradouros se nutriam das bactérias que se alimentam dos elementos químicos existentes nos jorros expelidos pelos respiradouros. Esse foi o primeiro sistema ecológico descoberto que se utiliza de elementos químicos em vez da luz solar para sua subsistência.
Durante anos, a maioria dos cientistas acreditou que encontraria respiradouros hidrotérmicos apenas no Pacífico, geologicamente falando o mais ativo dos oceanos. Mas, em 1985 uma equipe da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica encontrou respiradouros ao longo do espinhaço montanhoso submerso, existente no centro do Oceano Atlântico. Em vez de um grupo de vermes tubulares, esses respiradouros estavam repletos de centenas de milhares de camarões. Descobertas posteriores de novos respiradouros envolveram dezenas de novas espécies a cada ano, mas a vida nesses respiradouros marinhos foi sempre dominada pelo mesmo tipo genérico de animais.
O Oceano Antártico, que circunda a Antártica, apenas recentemente transformou-se num foco de exploração de grandes profundezas marinhas. Ele é particularmente difícil de ser atingido, e suas águas são traiçoeiras, com ondas de tempestades atingindo normalmente cerca de 15 m de altura. Chris German, um geoquímico da Instituição Oceanográfica Woods Hole, em Massachussetts, foi o primeiro a descobrir respiradouros de grandes profundidades nessa área em 1999, após detetar as reveladoras colunas de água semelhantes a plumas, mas não teve condições de explorá-las por mais de uma década.
Em 2010, um grupo que incluía o próprio Chris German utilizou um veículo movido por controle remoto para manobrar a cerca de 2.440 m de profundidade no mar gelado, e enviar vídeos de alta definição da zona proibida para um navio de pesquisas britânico na superfície. A primeira visão que a equipe teve foi do tipo que move, estimula os exploradores. Os gritos dos cientistas que olhavam os monitores rapidamente atraíram todos a bordo, para ficarem vidrados com uma paisagem coberta com o que prontamente identificaram como um novo tipo de caranguejo kiwa, também conhecido como yeti por causa de seu corpo peludo. -- "Eles lembravam uma pilha de crânios apoiada no fundo do mar", disse o chefe da equipe, Alex Togers, um biólogo de águas profundas da Universidade de Oxford. "Foi uma visão inacreditável".
A primeira espécie de caranguejo kiwa não foi descoberta senão em 2005, e uma outra foi anunciada recentemente. Mas, nenhuma delas foi encontrada viva e amontoada como as multidões que a equipe de Roger encontrou. Como muitas espécies dos respiradouros, os corpos dos caraguejos são cobertos de bactérias que se alimentam de produtos químicos dos respiradouros e, por sua vez, são comidas pelos caranguejos. Os pesquisadores viram os caranguejos, alguns tão grandes com um punho, disputando posições e até se queimando, na tentativa de manter seus membros e laterais carregados de bactérias tão perto quanto possível do fluxo nutriente que sai do respiradouro.
[...] Muitos dos cientistas que fizeram essas descobertas estão justamente regressando da exploração de novos respiradouros no sudoeste do Oceano Índico. Encontraram o que parece ser uma nova espécie de caranguejo kiwa, embora isso ainda tenha que serr comprovado por exames. Mas, esses caranguejos eram poucos. Também havia camarões, mas não em grandes quantidades. "Exatamente agora, o Espinhaço [submerso] do Sudoeste Indiano se parece com um cruzamento, um ponto de encontro", disse Jon Copley da Universidade de Southampton, que chefiou os trabalhos no Oceano Índico e estava também na equipe do Oceano Antártico.
Agora, os cientistas têm mais perguntas com que se enfrentar. Se, por exemplo, o Oceano Antártico é diferenciadamente isolado devido à água gelada ou algum outro fator, por que então os kiwas estão no Oceano Índico, e o que mantém os camarões afastados do Oceano Antártico? "A história é obviamente bastante complicada", disse Rogers. "Tem que haver uma conectividade, ou pelo menos houve uma no passado".
Diagrama químico de um respiradouro de grande profundidade - (Fonte: Wikipedia -- clique na imagem para ampliá-la).
Respiradouro de vapor branco (que emite dióxido de carbono líquido) "Champagne", no vulcão submarino Eifuku Noroeste, no Japão - (Foto: Wikipedia/Creative Commons).
Um caranguejo kiwa "yeti" - (Foto: Wikipedia).
Vermes tubulares em respiradouro de grande profundidade marinha - (Foto: Google).
Outros respiradouros hidrotérmicos, de grande profundidade - (Foto: Google).
Exemplos de seres marinhos encontrados em respiradouros de grande profundidade - (Foto: Google).
Amontoados de caranguejos yeti em respiradouros de grande profundidade - (Foto: Google).
Mexilhões em respiradouro de grande profundidade - (Foto: Google).
Um peixe ("Rotfeuerfisch") de respiradouro de grande profundidade - (Foto: Google).
Um caracol de respiradouro de grande profundidade - (Foto: Google).
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