[A crise na zona do euro, provocada por má gestação da UE (União Europeia) e prolongada e agravada por falhas gritantes e surpreendentes dos seus responsáveis políticos, econômicos e financeiros, acabou inevitavelmente corroendo a credibilidade do euro como moeda de reserva no mundo. É o que nos conta a Spiegel Online International, em artigo que traduzo a seguir. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]
Quando o euro foi lançado em 1 de janeiro de 1999, havia na Europa a esperança de que cedo ele pudesse competir com o dólar como principal moeda de reserva no mundo. E, no início, parecia que esse sonho não era irrealista, à medida que países ao redor do mundo começaram a encher seus cofres com a moeda comum europeia.
Agora, no entanto, parece que essa tendência começa a se reverter. Em seguida a anos de crises, países em desenvolvimento começam a voltar-se para outras fontes para preencher suas necessidades em reservas monetárias -- e passaram o último ano e meio livrando-se de seus euros. Essa é a mensagem a ser colhida na edição mais recente do relatório habitual do FMI (Fundo Monetário Internacional) sobre reservas monetárias mantidas pelos países ao redor do mundo. De acordo com esse documento, economias emergentes livraram-se de algo como US$ 45 bilhões equivalentes em euros em 2012, e venderam algo como US$ 90 bilhões equivalentes em euros desde o segundo trimestre de 2011.
Esses números parecem indicar que a atual crise do euro, alimentada pelos altos valores de dívidas soberanas em vários países da zona do euro, corroeu a confiança global nessa moeda. Durante o mesmo período, as reservas em dólares entre os países em desenvolvimento continuaram a crescer. "O euro será a segunda moeda internacional, mas não diria que haja alguma perspectiva de que ele possa desafiar o dólar", disse ao Financial Times Jeffrey Frankel, um professor de economia na Kennedy School of Government de Harvard, quando perguntado sobre o relatório do FMI.
O nível mais baixo em uma década
O relatório do FMI indica que a retração recente nas reservas em euros marca uma quebra de comportamento, depois de mais de uma década de crescimento desses ativos entre os países emergentes. Segundo o Financial Times, esses países mantêm agora apenas um quarto de suas reservas de moeda estrangeira em euros, uma queda de 31% em relação a 2009 e o valor mais baixo em uma década.
A redução da atratividade do euro como uma moeda de reserva é quase certamente uma consequência da instabilidade do bloco da UE. Reservas em dólares americanos nos países emergentes também sofreram uma queda no último trimestre de 2011, em seguida à crise do teto da dívida pública americana [ver aqui] e ao subsequente rebaixamento da nota americana pela Standard & Poor's [ver aqui], embora o dólar tenha se recuperado rapidamente.
Para a zona do euro, é preocupante a estagnação de sua economia, uma situação sem perspectiva de melhora em horizonte visível, com vários países em dificuldades devido a rígidos e apertados programas de austeridade. Além disso, há pouco apetite entre os países do norte europeu -- particularmente na Alemanha -- para a introdução de programas de estímulo econômico onerosos. Essa postura foi enfatizada na segunda-feira (01/4) em uma entrevista dada pelo ministro da Economia alemão Philipp Rösler à agência de notícias alemã DPA: "Programas de estímulo financiados por dívidas não fazem sentido", disse ele. "Necessitamos é de reformas estruturais e orçamentos responsáveis". E acrescentou: "Acho que nós alemães mostramos que isso pode funcionar. Você pode alcançar os dois objetivos com um programa de apertar cintos bem sucedido: orçamentos sólidos e, ao mesmo tempo, a viabilização do crescimento". [Os alemães parecem esquecer-se de que regras que funcionaram e têm funcionado muito bem em um país como o deles, com uma tremenda estrutura industrial e uma invejável economia, não necessariamente dão ou darão certo em países merrecas como Grácia e Chipre, por exemplo. E esses mesmos alemães se esquecem de que têm enorme responsabilidade na estruturação de uma UE incapaz de resistir ao espirro de um país (Chipre) cuja economia vale apenas 0,2% de seu PIB. E, se dependesse deles, o caso de Chipre teria sido ainda mais funesto para a UE.]
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