terça-feira, 9 de abril de 2013

Clima, um tema sensível (II)

[Ver postagem anterior.]

O exército do novo modelo

Outros estudos recentes pintam, entretanto, um quadro diferente. Um relatório inédito do Conselho de Pesquisas da Noruega, um organismo financiado pelo governo, formado por uma equipe liderada por Terje Berntsen, da Universidade de Oslo, usa um método diferente do adotado pelo IPCC. Ele conclui que há uma probabilidade de 90% de que a duplicação das emissões de CO₂ aumentará as temperaturas em apenas 1,2 - 2,9°C, com a figura mais provável sendo 1,9°C. O topo da faixa do estudo está bem abaixo das estimativas mais elevadas do IPCC para a sensibilidade provável.

O estudo não não passou ainda pela revisão por pares (peer review), ele pode não ser confiável. Mas, suas projeções não são um caso isolado. Trabalho realizado por Julia Hargreaves, do Instituto de Pesquisas de Mudança Global em Yokohama [Japão], publicado em 2012, sugere uma probabilidade de 90% de que a mudança real esteja na faixa de 0,5 - 4,0°C, com um valor médio de 2,3°C. Isso se baseia no modo como o clima se comportou há cerca de 20.000 anos atrás, no pico da última idade do gelo, um período em que as concentrações de dióxido de carbono deram um salto. Nic Lewis, um cientista climático independente, obteve uma faixa ainda mais baixa em um estudo aceito para publicação: 1,0 - 3,0°C , com um valor médio de 1,6°C. Seus cálculos reanalisaram um trabalho citado pelo IPCC e levaram em conta dados de temperatura mais recentes. Em todos esses cálculos, as chances de sensibilidade climática acima de 4,5°C tornaram-se extremamente pequenas.

Se essas estimativas estiverem corretas, elas demandarão revisões na ciência da mudança climática e, possivelmente, nas políticas públicas. Se, como ensina a sabedoria convencional, as temperaturas globais pudessem aumentar em 3°C ou mais em resposta a uma duplicação das emissões, então a resposta correta seria aquela que a maior parte do mundo defende mas não pratica: refrear o aquecimento e o efeito estufa que as provocam. Isso, no jargão, é chamado de "mitigação". Além disso, se houvesse uma possibilidade externa de ocorrer algo catastrófico, como um aumento de 6°C por exemplo, isso poderia justificar a efetivação de intervenções drásticas. Isso seria semelhante a fazer um seguro contra desastres. Ele pode parecer uma despesa desnecessária quando você está pagando os prêmios correspondentes, mas quando você precisa dele ele é realmente necessário. Muitos economistas, incluindo William Nordhaus da Universidade de Yale, endossaram isso.

Se, entretanto, as temperaturas tiverem a probabilidade de subir apenas 2°C em resposta a uma duplicação das emissões de carbono (e se a probabilidade de um aumento de 6% for trivial), o cálculo pode mudar. Talvez o mundo devesse buscar ajustar (não interromper) o espalhafato em torno dos gases de efeito estufa. Não há sentido em comprar um seguro contra terremotos, se você não vive em uma região em que eles ocorrem. Nesse caso, mais adaptação em vez de mais mitigação pode ser a política correta, marginalmente falando. Mas, isso será um bom conselho apenas se essas novas estimativas forem realmente mais confiáveis que as anteriores. Modelos diferentes geram resultados diferentes.

Um tipo de modelo -- o modelo de circulação geral (GCM, em inglês) -- usa uma abordagem de baixo para cima. Ele divide a Terra e sua atmosfera em uma grade, que gera uma enorme quantidade de cálculos visando a imitar o sistema climático e as múltiplas influências que atuam sobre ele. A vantagem desse modelo complexo é que ele é extremamente detalhado. Sua desvantagem é que não responde a leituras de temperaturas recentes. Ele simula o modo como o clima funciona no longo prazo, sem levar em conta as observações correntes. Sua sensibilidade é baseada no grau de precisão com que descreve os processos e feedbacks no sistema climático.

O outro tipo de modelo -- o de balanço de energia -- é mais simples. Ele é do tipo de cima para baixo, tratando a Terra como uma única unidade ou dois hemisférios e representando o conjunto do clima com umas poucas equações que representam coisas tais como mudanças nos gases de efeito estufa, aerossóis vulcânicos e temperaturas globais. Esse tipo de modelo não tenta descrever as complexidades do clima, o que é uma desvantagem. Mas, ele tem uma vantagem: diferentemente do GCM, ele usa explicitamente dados de temperatura para estimar a sensibilidade do sistema climático, respondento portanto a observações climáticas reais.

As estimativas de sensibilidade climática do IPCC são parcialmente baseadas no GCM. Como elas refletem o entendimento dos cientistas sobre como o clima funciona, e esse entendimento não mudou muito, o modelo usado também não variou e não reflete o recente hiato nas temperaturas crescentes. Contrariamente, o estudo norueguês baseou-se em um modelo de balanço de energia. O mesmo ocorreu com estudos anteriores influentes, como o de Reto Knutt, do Instituto para Ciência Atmosférica e Climática de Zurique; o de Piers Forster, da Universidade de Leeds, e Jonathan Gregory, da Universidade de Reading; o de Natalia Andronova e Michael Schlesinger, ambos da Universidade de Illinois; e o de Magne Aldrin, do Centro de Computação Norueguês (que é também um co-autor do recente estudo norueguês). Todos eles encontraram sensibilidades climáticas mais baixas. O estudo de Forster e Gregory chegou a uma estimativa central de 1,9°C , com 95% de probabilidade para uma faixa de 1,0 - 4,1°C.  O de Aldrin e outros encontrou uma probabilidade de 90% para a faixa de 1,2 - 3,5°C.

Poderia parecer óbvio que os modelos de balanço de energia são melhores -- eles não se adequam, ou o que está realmente acontecendo? A resposta é sim, mas esta não traduz a história toda. Myles Aleen, da Universidade de Oxford, observa que os modelos de balanço de energia são melhores para representar mecanismos de feedback climático diretos e simples, do que os indiretos e dinâmicos. A maioria dos gases de efeito estufa é de efeito linear, aquece o clima. O impacto direto dos vulcões também é de efeito linear: eles esfriam o ar, refletindo a luz solar. Mas, vulcões provocam também alteração nos padrões de circulação na atmosfera, o que pode então aquecer o clima indiretamente, anulando parcialmente o resfriamento direto. Modelos de balanço de energia simples não conseguem capturar esse feedback indireto -- assim, podem exagerar o resfriamento provocado pelos vulcões.

Isso significa que, se, por alguma razão, houve fatores que temporariamente distorciam/amorteciam o impacto das emissões de gases de efeito estufa, os modelos simples de balanço de energia poderiam não conseguir capturá-los. Eles serão demasiado receptivos/sensíveis a retardos passageiros. Resumindo, os diferentes tipos de modelos climáticos medem coisas um tanto distintas.

(continua)

Nenhum comentário:

Postar um comentário