segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Ministério Público busca donos de R$ 600 milhões no FGTS

O Ministério Público do Trabalho (MPT), por meio de uma tarefa inusitada, está à procura dos donos de R$ 600 milhões referentes a depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). O montante foi acumulado desde a criação do fundo, em 1967, por empresas ou prefeituras que não identificaram quem seriam os trabalhadores beneficiados no momento dos depósitos. Em abril, a Caixa Econômica Federal (CEF) e o MPT firmaram uma parceria para encontrar os proprietários desse dinheiro, mas de lá para cá pouco se avançou. Segundo o MPT, a busca desses trabalhadores evitará que se reclame na Justiça o FGTS não depositado. Muitos descobrem no curso dos processos que os valores estão na Caixa, mas não foi realizada a discriminação do beneficiário.

O problema foi descoberto em 2010. Naquele ano, a Caixa e o MPT iniciaram um projeto-piloto no pequeno município de Monsenhor Tabosa, no Ceará, que na época registrava uma população de 16,7 mil pessoas, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE). Segundo o procurador do trabalho Francisco José Parente Vasconcelos Júnior, alguns servidores da prefeitura procuraram o Ministério Público alegando que o FGTS não estava sendo depositado em suas contas vinculadas. Vasconcelos Júnior afirma que, posteriormente, foi constatado que a verba era depositada, mas o município não informava à CEF os nomes dos servidores e os respectivos valores. "Eu notifiquei a Caixa. A instituição informou que o problema estava ocorrendo em todos os municípios do Ceará", diz.

O MPT pediu à Caixa um levantamento do montante a ser individualizado no Ceará e Piauí. Segundo Vasconcelos Júnior, os valores mais antigos encontrados foram depositados na década de 1970. Após receber os dados, o órgão realizou audiências, nas quais as empresas e prefeituras eram informadas sobre os procedimentos para regularizar a situação. Foram assinados também termos de ajustamento de conduta (TACs), nos quais as partes se comprometiam a identificar os beneficiários.

De acordo com a CEF, de 2010 a 2012 foram encontrados, nos dois Estados, 23 mil trabalhadores donos de aproximadamente R$ 7 milhões. "Os municípios ganham duas vezes porque passou a circular mais dinheiro na economia local e o poder público deixou de ser condenado por não ter depositado o FGTS corretamente", afirma Vasconcelos Júnior.  Para o procurador João Batista Machado Júnior, do Piauí, a parceria ainda apresenta a vantagem de ser extrajudicial, trazendo agilidade ao processo. Ele diz que não identificar os depósitos sem individualização é problemático para os dois lados. "É um dinheiro que não volta para o empregador nem chega ao destino final", diz.

O advogado Fábio Berbel, do Bichara, Barata & Costa Advogados, afirma que, em situações como essa, os trabalhadores correm o risco de nunca receberem. "Se ele entrar com uma ação judicial e a empresa para a qual trabalhava faliu, o trabalhador poderá ficar sem o dinheiro, ainda que depositado".

De acordo com a Caixa, um aplicativo chamado Sistema Empresa de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (SEFIP), obrigatório desde 2001, impossibilita que valores sejam depositados sem individualização. O órgão informou que essa situação ocorria principalmente nas prefeituras, que faziam acordos para parcelar valores do fundo atrasados. A Caixa pedia ao Tesouro Nacional a retenção de parte do Fundo de Participação dos Municípios para pagamento das parcelas, e cabia aos municípios enviarem a relação dos beneficiários. Quando eles não mandavam, os valores ficavam parados.

Em abril, após a celebração do convênio, a Caixa se comprometeu a encaminhar ao MPT os nomes das empresas e prefeituras de todo o país que depositaram valores sem identificação. A parceria, entretanto, parece ter sido pouco disseminada. No Estado do Rio Grande do Norte, onde há R$ 6 milhões nessa situação, as audiências com as empresas e prefeituras acontecerão nos dias 24 e 26. Segundo o procurador Gleydson Gadelha, que atua no Estado, cerca de R$ 3,6 milhões foram depositados por uma única empresa, a Urbana Companhia de Serviços Urbanos. A empresa, de economia mista, realiza a limpeza urbana de Natal.  A companhia, por meio da assessoria de imprensa, informou que entre 1986 e 1988 o FGTS dos servidores deixou de ser recolhido, sendo feito, posteriormente, o parcelamento da dívida. A Urbana disse que está realizado um levantamento para detectar a situação de cada funcionário.

No Rio Grande do Sul, segundo o procurador Paulo Juarez, há entre R$ 20 milhões e R$ 25 milhões de FGTS sem dono. O MPT do Estado já realizou reuniões com a Caixa e as audiências devem ocorrer neste mês. Por meio de sua assessoria de imprensa, o MPT de São Paulo, Estado que ocupa o primeiro lugar na lista dos maiores valores a serem individualizados - mais de R$ 163 milhões -, afirmou que já foram realizadas reuniões com a CEF, mas ainda não foi estabelecido um plano de ação.

O Rio de Janeiro, que ocupa o segundo lugar da lista, possui R$ 80 milhões. O Ministério Público deve iniciar as pesquisas em 40 prefeituras, que depositaram aproximadamente R$ 20 milhões sem identificar os trabalhadores. As primeiras reuniões entre a Caixa e os procuradores devem começar no fim de outubro.

Já Goiás está na terceira posição do ranking, com aproximadamente R$ 63 milhões não identificados. O MPT do Estado não soube informar se já foram iniciadas as buscas. Segundo dados do órgão, todos os Estados do país, exceto Tocantins, possuem valores de FGTS sem identificação.

Francisco José Vasconcelos Júnior: com a identificação dos beneficiários, passa a circular mais dinheiro na economia - (Foto: Valor Econômico).




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