sábado, 8 de setembro de 2012

Como Lula (o Nosso Pinóquio Acrobata) passou de protetor a protegido

[O texto abaixo é de autoria do jornalista Cristian Klein, e foi publicado no jornal Valor Econômico de 06/9. Embora não concorde integralmente com o autor, acho que expõe alguns pontos dignos de interesse e análise. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]

Como Lula [o Nosso Pinóquio Acrobata] passou de protetor a protegido

Cristian Klein - Valor Econômico (06/9/2012)

Os anos Dilma Rousseff têm sido caracterizados pela queda inédita das taxas de juros e uma administração de coloração tecnocrática, mas ainda não representaram uma grande inovação. A margem de manobra da presidente é menor depois da conquista da estabilidade econômica, na era Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e do avanço social ocorrido no período de seu padrinho político Luiz Inácio Lula da Silva (PT) [o Nosso Pinóquio Acrobata - NPA].

Dilma precisa de uma marca. Até agora tem sido ela mesma, com o estilo duro, o temor que desperta nos assessores mais próximos e as demissões em série que levaram à queda de quase uma dezena de ministros. Neste ano, Dilma estava um tanto quieta e faltava esbravejar com alguém. Sobrou para Fernando Henrique. O tucano levou um pito da presidente por ter criticado em artigo a "herança pesada" que Lula [NPA] teria legado para ela. O assunto é um nhenhenhém, como diria o próprio FHC, em torno do qual ele e Lula [NPA] já debateram muito publicamente. A novidade é a resposta de Dilma e seu tom "overreacting". [Ver postagem anterior sobre a resposta de Dilma a FHC.]

A reação desperta um monte de interpretações, mas nenhuma deveria partir da premissa de que o exagero foi resultado da emoção. Para uma atitude desta magnitude, em meio às eleições municipais e com os riscos envolvidos à imagem da presidente, há pouco de impulso e muito de cálculo político. Dilma iniciou seu governo estabelecendo justamente um contraponto em relação ao padrinho. Lula [NPA], nos dois mandatos, sempre esteve às rusgas com FHC. Mas a presidente aproximou-se do tucano, conferiu-lhe um tratamento especial e até enviou-lhe carta elogiosa no aniversário de 80 anos. Era uma amizade republicana, a despeito das diferenças ideológicas e partidárias que Dilma sabia existir.

O que mudou, então?

A discussão sobre heranças malditas ou benditas poderia ter continuado entre dois velhos ex-presidentes. Lula [NPA] já recuperou a voz para correr o país, subir palanques e dar declarações de apoio a seus candidatos a prefeito. Poderia muito bem ter respondido. Dilma, no entanto, comprou a briga com FHC. Houve senso de oportunidade. O efeito simbólico é imediato. Lula [NPA], de uma hora para outra, passou de protetor a protegido. A estratégia de fortalecimento da imagem presidencial pôs Dilma em novo patamar. O bate-boca é com FHC, mas o subproduto principal é o deslocamento de Lula [NPA] como o peão do jogo. Não é pouco, uma vez que ainda há dúvidas sobre quem será o nome do PT na eleição de 2014: se criador ou criatura.

O panfleto de Dilma foi eminentemente político. Contrasta com sua atuação discreta, voltada para o gabinete. Aos poucos, a presidente amplia seu espaço, além da técnica, e entra no campo político - o que parece mostrar sua disposição de tentar um novo mandato. O duelo com Fernando Henrique é a segunda grande intervenção da presidente que claramente dispensa a participação do padrinho. A primeira foi na troca de comando de líderes do governo no Congresso, em fevereiro, quando suas decisões ainda eram vistas como dependentes de conversas com Lula [NPA]. Foi uma prova de autonomia no trato com as raposas do Legislativo. Agora, Dilma mostra independência para liderar a luta partidária/eleitoral.

 Se quiser a reeleição, Dilma precisará dominar o território e andar com as próprias pernas. Precisará falar a seu partido e aos que dão sustentação ao governo, muitos descontentes com seu estilo.

Para sua legenda, a bronca em Fernando Henrique soa como música ou, ao menos, mea culpa. Dilma tem se aproximado de uma agenda muito mais tucana - privatizações, retaliação às greves do funcionalismo - do que das preferências dos petistas. Se um partido pode ser dividido em três - filiados/simpatizantes; direção; e governo/face pública-, Dilma sabe que precisará contar com o engajamento dos dois primeiros em seu projeto. Para os aliados, o passa-fora no tucano é um aviso de que a presidente está à frente do debate e que uma romaria queremista em torno de Lula [NPA] tende a ser inócua.

A ação atinge vários objetivos ao mesmo tempo. Dilma se aproveita dos reveses de Lula [NPA] e da oposição. O ex-presidente tem posto à prova nestas eleições sua sagacidade política e sua popularidade. Em São Paulo, a candidatura do ex-ministro Fernando Haddad avança menos do que o esperado depois de iniciada a campanha na TV. Lula [NPA] não repete o que fez em 2010, com a transferência de votos para Dilma. Na batalha no Recife, está em desvantagem no duelo de padrinhos. O até pouco tempo desconhecido candidato do governador Eduardo Campos, Geraldo Julio, ambos do PSB, ultrapassou como foguete o senador Humberto Costa, apoiado pelo ex-presidente.  Para petistas que concorrem nas capitais, é a presença de Dilma que surge agora como esperança para inverter o quadro desfavorável. Em apenas duas destas 26 cidades, Goiânia e Rio Branco, há um candidato do PT na liderança.

A oposição - especialmente o PSDB, que lidera em seis - não vai mal nos municípios, mas seus caciques nacionais tropeçam, de um jeito ou de outro. O libelo de Fernando Henrique, cujo governo foi tão renegado por seu partido, surge no momento em que o senador mineiro Aécio Neves é filmado trôpego num boteco carioca e o ex-governador José Serra cai na tabela da disputa pela Prefeitura de São Paulo. FHC também teve senso de oportunidade. Quis reafirmar sua liderança e ser lembrado como principal face pública do PSDB e da oposição. Só não contava com o chega-pra-lá da "muy leal e amiga" presidente da República.

Se os atuais anos ainda não têm uma grande marca, os últimos dias, no melhor estilo Dilma, representaram tempos de violência para velhos caciques. A presidente rebate o octogenário FHC; Eduardo Campos atropela o sexagenário Lula [NPA]; São Paulo vira as costas para o septuagenário José Serra. Enquanto isso, a novidade Celso Russomanno (PRB), que diz não querer briga com ninguém, conquista o eleitorado paulistano, para desespero de ambas as partes, de tucanos e petistas. [Ver postagem anterior sobre o cenário eleitoral em S. Paulo. -- O currículo de Celso Russomano se depreciou ainda mais, depois que foi declarado o candidato preferido da Igreja Universal do Reino de Deus (leia-se "bispo" Edir Macedo).]

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