[Há pouco menos de um mês, o Globo e a Folha de S. Paulo publicaram notícias preocupantes sobre o uso indevido e ilegal do FGTS e, surpreendentemente -- talvez pelo julgamento do mensalão ou porque o povão está anestesiado e deslumbrado com seu maior acesso ao consumo --, o assunto passou batido e ninguém mais falou nele. Acho bom a gente não dormir de touca e ficar bem atento, porque o assunto é sério. Dª Dilma, com a maior desfaçatez, está enfiando sua mão gorda e petista em nosso bolso, mais uma vez.]
Segundo o Globo, o
uso crescente dos recursos do FGTS pelo governo para fazer política
habitacional já põe em risco o patrimônio líquido do Fundo, uma reserva
importante que assegura o equilíbrio das contas e serve para cobrir
despesas imprevistas. Neste ano, os subsídios destinados ao programa
Minha Casa, Minha Vida já chegam a R$ 6,5 bilhões, superando o lucro
líquido do Fundo apurado em 2011, de R$ 5,1 bilhões. Integrantes do
Conselho Curador alertam que, nesse ritmo, a concessão de subsídios
avançará sobre o patrimônio líquido do FGTS, atualmente em R$ 41
bilhões, já a partir de 2013.
O
subsídio é um desconto concedido às famílias de baixa renda nos
financiamentos habitacionais. O valor chega a R$ 23 mil para moradores
de São Paulo e Brasília e, nas demais cidades, varia entre R$ 13 mil e
R$ 17 mil. Esse dinheiro é repassado às famílias a fundo perdido e não
retorna ao FGTS.
Regra para ganhar benefícios mudou
Em
2012, os subsídios do Minha Casa Minha Vida, além de consumir todo o
lucro do FGTS no ano passado, já comprometeram parte do resultado do
ano, que ainda nem está fechado. Além disso, o Executivo planeja gastar
mais R$ 4,465 bilhões em subsídios para o programa em 2013. O
orçamento do FGTS previa R$ 4,5 bilhões em subsídios para o programa
neste ano, mas, em julho, o governo destinou mais R$ 2 bilhões para esse
fim e, até agora, não houve a contrapartida do orçamento da União. "Os
subsídios estão aumentando mais depressa do que os lucros. Isso pode
criar uma bomba-relógio para o futuro", disse um técnico do governo que
acompanha as contas do Fundo.
Integrantes
do Conselho Curador destacam que, ao criar o Minha Casa, Minha Vida, o
governo retirou a trava que permitia ao Fundo fazer política social de
moradia e, ao mesmo tempo, engordar seu patrimônio. Até 2009, metade do
lucro líquido era destinada aos subsídios e a outra metade, aplicado em
títulos públicos. Além
disso, a regra de concessão do benefício às famílias de menor renda
mudou. A Lei 11.124/2005, que criou uma política habitacional para
classes de baixa renda, prevê que o FGTS deve ser usado para
complementar a capacidade de pagamento do mutuário na tomada do
financiamento. Por essa regra, primeiro é feita uma análise da renda e
da capacidade de pagamento da família, e o Fundo entra só como
complemento em caso de insuficiência de renda. Agora, o governo oferece
de saída o desconto, que chega a R$ 23 mil para quem mora em São Paulo e
Brasília. "É
a farra do subsídio. Ou a família compra um imóvel mais caro ou toma
financiamento mais baixo do que a capacidade da renda", disse uma fonte.
Com
o FGTS bancando parcela crescente dos subsídios à casa própria, o
FI-FGTS — fundo criado no bojo do Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC) para investimentos em projetos de infraestrutura — também corre o
risco de ser paralisado, dentro de três anos, segundo estimativas de
conselheiros do Fundo. Esses investimentos são cruciais para os setores
de energia, rodovias, ferrovias e portos. Em
dezembro, o valor desembolsado pelo FI-FGTS em projetos somava R$ 17,9
bilhões. Outros R$ 6,4 bilhões estavam reservados para os investimentos,
mas 21 projetos, que totalizam R$ 8,6 bilhões, não têm garantia de
liberação dos recursos. "À
medida que os subsídios avançam, o FI também é prejudicado e pode ser
paralisado, sem recursos para novos projetos", destacou outra fonte.
Falta regulamentação
Segundo
especialistas, nunca se usou tanto dinheiro do Fundo para subsídios, o
que não é seu papel principal. A maior crítica está no fato de o
subsídio ser oferecido pela União com recursos do FGTS, que é privado.
Um detalhe importante, segundo especialistas, é que não está previsto em
lugar algum o que fazer com os lucros do Fundo, o que permitiu que
fossem sendo criados programas que usam esse dinheiro. [Em português castiço e no jargão legal, isso se chama "apropriação indébita" -- em português do povão, trata-se de roubo mesmo. E o partido da presidente é dito "dos trabalhadores". Imaginem se não fosse ...]
O
presidente do Instituto FGTS, Mario Avelino, defende a distribuição do
lucro do Fundo entre os cotistas e lembra que há projetos no Congresso
sobre o tema. O último (PLS 580/2011) foi apresentado pela senadora
Marta Suplicy (PT-SP) no ano passado: "Quando
começou, o Minha Casa, Minha Vida era bem tímido. Como é possível
ratear o lucro se estão, com toda a liberdade, imputando ao Fundo
despesas que não são dele? Seu único gasto de verdade é o da gestão da
Caixa".
De
acordo com o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o
Paulinho, a saída para preservar o Fundo pode ser a Justiça. "Do jeito que o governo está fazendo, vai quebrar o FGTS".
Segundo
Claudio Gomes, representante da CUT no Conselho Curador, o aumento dos
subsídios com recursos do FGTS é preocupante. Mas ele ponderou que o
país passa por um momento difícil e que é preciso tomar medidas
excepcionais para preservar empregos: "Isso não pode virar uma política corriqueira", disse.
Já a Folha de S. Paulo diz que "dinheiro extra do FGTS engorda caixa do governo". Governo, trabalhadores e empresários disputam R$ 3 bilhões que entram
por ano no caixa do FGTS, arrecadados por meio da contribuição adicional
criada para ajudar a pagar o rombo de R$ 41 bilhões devido a milhões de
trabalhadores lesados nos planos Verão e Collor 1.
Essa contribuição surgiu em 2001, quando passou de 40% para 50% a multa
do FGTS paga pelas empresas nas demissões sem justa causa. O trabalhador
continuou recebendo os 40% e o restante foi para cobrir o rombo.
Após dez anos, as perdas foram pagas a quase 80 milhões que aderiram ao
acordo. Mas a contribuição adicional das empresas, que deveria ser
temporária, continua engordando o caixa do FGTS e usada para financiar
programas do governo como o Minha Casa, Minha Vida.
Em fevereiro deste ano, a Caixa Econômica Federal, administradora do
fundo, informou ao secretário-executivo do Conselho Curador do FGTS que a
contribuição de 10% já poderia ser extinta.
Desde 2002, só o adicional de 10% da multa rendeu R$ 18 bilhões ao caixa
do fundo, segundo documento encaminhado pela Gerência Nacional do
Passivo do FGTS da Caixa, obtido pela Folha.
"A conta já foi paga. As centrais sindicais querem que os 10% sejam
usados para criar um fundo anticrise para evitar demissões. O
empresariado quer o retorno da multa do FGTS para 40%. E o governo quer
que esse dinheiro continue entrando no caixa", diz Antonio de Sousa
Ramalho Jr., um dos seis conselheiros que representam os trabalhadores
no Conselho Curador.
Na semana passada [semana anterior a 02/9], foi aprovado o repasse de R$ 2 bilhões do FGTS para
custear o programa Minha Casa, Minha Vida. "Prova de que o fundo está
com superavit", diz Ramalho Jr.
Se não houver uma lei para extinguir a contribuição adicional de 10%,
ela continuará a ser cobrada, afirma o ministro do Trabalho, Brizola
Neto, que também preside o Conselho Curador do FGTS. "A multa do FGTS inibe demissões, é um instrumento importante para
evitar a rotatividade no mercado de trabalho. Acrescida do adicional de
10%, torna-se um inibidor mais forte ainda", afirma Brizola Neto.
Para Emerson Casali, gerente-executivo de relações de trabalho da CNI
(Confederação Nacional da Indústria), acordos são feitos para serem
cumpridos. "Se a conta já foi paga, se 'o maior acordo do mundo' garante
isso, por que manter a multa em 50%?"
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