segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Crise nos EUA pós-11 de setembro atrai americanos e expatriados de volta para o Brasil

Após 11 anos vivendo nos Estados Unidos, o trabalhador da construção civil Jovino Caldeira Coutinho, de 45 anos, resolveu fazer as malas e voltar ao Brasil em 2009. Diante da estagnação do mercado imobiliário americano, os serviços de reforma, construção e demolição ficaram escassos. Em compensação, no Guarujá (SP), onde participa das obras de um condomínio, Coutinho diz que "não está dando conta" de tanto trabalho. "Lá (nos EUA) estava muito ruinzinho mesmo. Tenho amigos que estão lá, sem dinheiro para voltar, trabalhando sem receber", diz. "Falei para um deles abrir mão (do dinheiro que lhe é devido), que aqui ele vai ter trabalho".

A americana Donna Roberts, de 48 anos, que veio do sul da Flórida para o Brasil em fevereiro, relata contraste semelhante. "Lá, víamos muitos restaurantes e negócios fechando, nossos amigos perdendo suas casas", diz a documentarista e educadora ambiental. "Aqui, parece que nada está reduzindo o ritmo (da economia)".

Como maior economia do mundo, os Estados Unidos ainda têm um PIB quase sete vezes maior do que o do Brasil, e PIB per capita de US$ 47,2 mil – quatro vezes superior ao brasileiro. Mesmo no pós-11 de Setembro, a economia americana manteve taxas de crescimento entre 2% e 3,5% até 2007, e o país continua sendo um dos mais procurados por estrangeiros em busca de oportunidades e refúgio. Mas, em contrapartida, os Estados Unidos mergulharam em duas custosas guerras na última década, sofreram com o estouro de uma bolha imobiliária e chegaram a um endividamento limite de US$ 14,3 trilhões (cerca de R$ 23 trilhões), teto que foi elevado após uma desgastante votação no Congresso. Um mercado interno deprimido e o desemprego ao redor dos 9% desafiam os esforços do governo do presidente Barack Obama.

Já o Brasil veio de anos de baixo crescimento econômico, mas domou a inflação e o desemprego, estabilizou sua dívida e criou um mercado de consumo interno forte nos últimos dez anos, decorrente da entrada de milhões de pessoas na classe C. Em 2008, a Standard & Poor's, mesma agência que neste ano rebaixou a nota da dívida americana, deu ao Brasil o título de grau de investimento, o que fez com que o país fosse considerado de baixo risco para aplicações estrangeiras. O cenário se tornou mais atraente para estrangeiros: no primeiro semestre de 2011, 4.312 americanos receberam vistos do Ministério do Trabalho brasileiro, em comparação com 3.622 no mesmo período em 2010.

O professor de macroeconomia da FGV-SP Rogério Mori afirma que, enquanto os Estados Unidos tiveram um grande crescimento amparado pela expansão do crédito até 2007, no Brasil a lógica foi outra: um crescimento mais moderado, derivado do fortalecimento do mercado interno e dos altos preços das commodities. "A diferença é que, de 2008 para cá, o motor do crescimento americano se esgotou. No caso brasileiro, as bases foram preservadas", diz.

Para Rubens Barbosa, embaixador brasileiro em Washington entre 1999 e 2004, a maior relevância geopolítica e econômica já provoca mudanças de percepção sobre o Brasil nos Estados Unidos. "Antes, o Departamento de Estado (a Chancelaria americana) via a América Latina através de México ou Cuba. Hoje, me surpreende que o encarregado de negócios tenha vivido em São Paulo e que todos (na embaixada americana) falem português. Vemos que mudou o interesse". Barbosa rejeita a ideia de que a década passada tenha sido economicamente "perdida" para os Estados Unidos, mas aponta as mudanças de rumo iniciadas pelo 11 de Setembro. "Os gastos públicos aumentaram e as receitas caíram por mudanças de (George W.) Bush na legislação tributária. Os ataques tiveram também um grande efeito econômico e psicológico nos americanos. Estavam em situação excelente, com alto consumo. De repente, (se viram diante de) crises habitacional e de derivativos".

Jovino Caldeira Coutinho, trabalhador da construção civil que voltou ao Brasil após 11 anos nos EUA (Foto: BBC Brasil).



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