A pergunta-título e o texto desta postagem se aplicam, mutatis mutandis, inteiramente a nós: saberia o Brasil enfrentar uma catástrofe nuclear em Angra dos Reis?
Mesmo tendo sido controlado rapidamente, o acidente na central nuclear de Marcoule não deixou de reabrir o debatesobre a gestão de um acidente nuclear grave na França. Desta vez, as consequências ficaram restritas a uma área mínima: a do centro de tratamento de dejetos nucleares de Gard, onde a explosão de um forno deixou um morto e quatro feridos.
Mas, o que teria ocorrido se o acidente de Marcoule tivesse provocado a liberação de partículas radioativas que fossem levadas para Avignon, a uns 30 km de distância, pelo vento mistral que ali soprava naquele dia? Falando de uma maneira mais ampla, já que o drama de Fukushima deixou perceber que o impensável é possível, a pergunta que se apresenta é: como uma catástrofe nuclear dessa natureza seria administrada na França?
Segundo Jean-Luc Godet, diretor da área de raios ionizantes e da saúde da Autoridade de Segurança Nuclear (ASN) "o acidente de Chernobyl nos demonstrou os limites de uma mentalidade probabilística", que supõe que as probabilidades estatísticas de um acidentes são tão pequenas que não há necessidade de se preocupar com isso.
A tragédia da central ucraniana leva as autoridades a se debruçar enfim sobre uma doutrina francesa a ser seguida em caso de acidente ... trinta anos depois da construção do primeiro reator produzindo energia elétrica de origem nuclear na França, exatamente em Marcoule. Os planos especiais de intervenção (PPI, em francês), vieram à luz então, supervisionados no entorno de cada sítio nuclear pelos representantes oficiais do governo e enquadrados a partir de agora por um decreto de 2005. O princípio básico de ação: prever um confinamento da população, uma eventual evacuação, e a ingestão de comprimidos de iodo.
As PPI formam uma base indispensável na fase de urgência, mas é ainda limitada. Enquanto no Japão foram evacuadas cidades num raio de 50 km da central de Fukushima, na França os PPI cobrem uma área que não vai além de 10 km ou mesmo 500 m para certas instalações, lamenta Roland Desbordes, presidente da Criiad - Comissão de pesquisa e informação independentes sobre a radioatividade. Fora isso, nada está previsto para as populações. Essa não é a única limitação. Em Marcoule, por exemplo, a zona coberta pelo PPI está dividida entre as prefeituras de Gard e de Vaucluse, com os riscos de que se tenha ordens contraditórias.
Quanto ao tema importante da evacuação, não há nos PPI um planejamento claro previsto para um acidente tão importante como o de Fukushima.
Após a fase de urgência, o exército elaborou um plano "bastante confidencial" no qual está especialmente previsto, caso não seja possível nenhuma evacuação rápida, "separar para evacuação a população já contaminada e a que poderá ser levada -- uma discriminação bastante assustadora". Por outro lado, há uma verba prevista para fazer frente aos danos nucleares de cerca de 1,5 milhão de euros, metade da qual será suprida pela empresa que opera a usina. Esse montante é insuficiente, avalia o presidente da Criiad: "Não há seguro para o (setor) nuclear. E o dinheiro posto sobre a mesa equivale apenas ao preço do sarcófago instalado em torno da central nuclear de Chernobyl".
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