Apesar da crise europeia, os títulos da dívida da Itália ainda são em tese mais seguros e são negociados com juros mais baixos que os do Brasil.
A aparente contradição fica explícita na rentabilidade dos papéis.
Títulos brasileiros com resgate de dez anos chegam a ser negociados
entre os investidores com juros anuais acima de 11%, quase o dobro dos
6,7% pagos pelos similares italianos. A taxa de juros é justamente definida pelo grau de confiança dos
investidores na capacidade de pagamento do país que emite os títulos.
Quanto maior o percentual de juros, menos confiáveis são os papeis.
Os títulos brasileiros também pagam mais juros que os dos Estados
Unidos, outro país em crise, cujo retorno para o investidor é de 2% ao
ano. Para os títulos alemães de dez anos, a taxa de juros é de 1,8%,
segundo dados da agência Bloomberg.
Apesar da discrepância entre os títulos brasileiros e italianos, os
juros pagos pelos papeis da dívida do Brasil estão em curva descendente,
enquanto os da Itália atingiram nível recorde nesta terça-feira. Na semana passada, o Brasil conseguiu captar US$ 1 bilhão no mercado
externo com o leilão de títulos com prazo de 30 anos pagando 4,7% de
juros anuais, apenas 1,6 ponto percentual acima dos juros pagos por
títulos americanos de prazo semelhante.
Para o economista Raphael Martello, da consultoria Tendências, o sucesso
da captação brasileira da semana passada mostra que nas condições
atuais os títulos brasileiros vêm atraindo a atenção cada vez maior dos
investidores. No caso da Itália, o temor dos investidores, que pode custar o cargo ao
primeiro-ministro Silvio Berlusconi, é a escalada do custo de manutenção
da dívida. Desde o início da crise, a Itália só vê o percentual de
juros que paga aos seus credores aumentar.
Caso os juros da dívida italiana passem dos 7% (patamar ainda menor que a
média dos títulos brasileiros), o país ficará exposto ao risco de ser
obrigado a dar um calote em sua dívida. "Os 7% são usados como balizador da dívida. Foi quanto Portugal e Grécia
atingiram antes de pedir ajuda. É um patamar que o mercado entende que,
uma vez ultrapassado, colocará o país sob o risco de insolvência", diz
Martello.
Outra aparente contradição na comparação entre a situação fiscal dos
dois países aparece na avaliação das agências de classificação de risco.
Apesar de rebaixada pelas três grandes, a Moodys, a Standard &
Poors e a Fitch, a Itália mantem uma dívida com variações da nota A. Já o Brasil, mesmo sendo uma das potências emergentes que podem
participar de um eventual pacote de resgate à Europa, tem os títulos de
sua dívida dentro das variações da nota B. "É de fato uma classificação que chega a ser incoerente. Sabemos que
Itália tem uma indústria forte, produção importante. Isso acaba fazendo
com que a classificação de risco seja melhor", diz Martello, da
Tendências.
Já o analista Christopher Garman, diretor de América Latina do
Eurasia Group, em Washington, lembra que as as agências levam em conta o
fato de a Itália estar atrelada a uma moeda compartilhada (o euro). "Se esses países (europeus) entrarem em dificuldade, terão a ajuda dos
outros membros da zona do euro. Por isso a nota da Itália é mais alta
que a do Brasil", diz. Nos dois casos, o percentual do PIB empenhado no pagamento dos juros da
dívida soberana é similar, sendo de aproximadamente 4%, segundo dados do
FMI.
A diferença entre Brasil e Itália, segundo ambos analistas, está no montante de endividamento em relação ao PIB. No Brasil, a dívida soberana compromete 64,9% da economia, segundo dados
acumulados de 2011 do FMI (Fundo Monetário Internacional). Na Itália,
esse nível é de 121% do PIB. "O custo da Itália não é sustentável, porque a soma da dívida é muito
maior. A relação dívida x PIB na Itália é quase o dobro da do Brasil",
ressalta Garman, do Eurasia Group.
O alto grau de endividamento dos países também é considerado o calcanhar
de Aquiles de outras economias desenvolvidas. Nos Estados Unidos,
perfaz aproximadamente 100% do PIB. Na Grécia, o país mais afetado pela crise europeia, a relação dívida/PIB no acumulado de 2011 já atinge 165%, segundo o FMI.
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