Para cientista político da FGV, maioria da presidenta é mais confortável que a de seu antecessor. Mas heterogeneidade dos partidos que a apoiam dificulta definição da pauta e a faz enfrentar instabilidade maior que Fernando Henrique. Professor
analisou pesquisa encomendada pelo Congresso em Foco.
Melhor que o petista Lula, pior que o tucano Fernando Henrique Cardoso.
Para o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ) Márcio Grijó
Vilarouca, assim pode ser resumida a situação da presidenta Dilma
Rousseff (PT) em relação à sua base governista. Na avaliação do
cientista político, o grande número de partidos com perfis distintos que
integram o bloco de sustentação da presidenta no Congresso garante a
ela, por um lado, folgada maioria. Mas, por outro, dificulta a definição
de uma pauta pelo Executivo.
“Comparativamente, a situação da Dilma é melhor que a coalizão do
governo Lula, que não tinha maioria no Senado. Mas é pior que a do
Fernando Henrique, que tinha uma coalizão mais enxuta, de
centro-direita. Com Dilma, são dez partidos heterogêneos, com um elevado
número de atores para a coalizão. Não é simples levar adiante uma
agenda de governo. É um problema satisfazer a diversidade de partidos de
espectros ideológicos diferentes”, observa Vilarouca.
Em seus dois governos, Fernando Henrique Cardoso teve o apoio do PSDB,
do PFL (atual DEM), do PTB, do PPB (atual PP) e de parte do PMDB,
partidos que lhe garantiram maioria nas duas Casas legislativas. Com um
leque maior de legendas em torno de si, Lula manteve-se com folga na
Câmara, mas enfrentou ferrenha oposição no Senado ao longo de seus oito
anos de governo. Um problema que não existe para Dilma, com sua ampla
maioria entre deputados e senadores.
Márcio Vilarouca analisou os dados levantados pelo Instituto Análise, em pesquisa encomendada para a Revista Congresso em Foco, publicada por este site.
Na visão dele, as respostas dadas pelos 150 parlamentares entrevistados
revelam um Congresso bastante fragmentado e ciente de seu pouco poder
decisório. De um lado, uma oposição fragilizada e sem discurso; de outro, uma ampla
e heterogênea base governista, que busca conciliar as divergências
entre partidos que vão da esquerda à direita. De acordo com o professor,
emerge da pesquisa um Congresso que admite ir a reboque do Executivo em
função de sua pouca capacidade de definir a própria agenda.
O cientista político entende que Dilma tem condições de fazer uma agenda
política. Mas não com a pauta pretendida pelo PT. “O nosso sistema tem
uma alta fragmentação partidária e implica um perfil mais moderado, uma
agenda que avança mais devagar e de maneira mais consensual. Como Dilma
tem maior número de atores envolvidos, ela terá de buscar sempre o meio
termo”, acrescenta.
O cientista político avalia que o índice de deputados e senadores que
aprovam a forma com que o governo tem atendido às demandas dos
parlamentares é “razoável”, sobretudo, por causa da heterogeneidade e do
tamanho da base aliada. “Pouco mais de um terço diz que o governo tenta lidar com as demandas da
base. Outros 13% dizem que o governo não tem conseguido, mas tenta.
Quase metade entende que Dilma tenta lidar com divergências na base. Só
19%disseram que o governo não tem atendido. É um nível razoável de
aprovação, porque faz parte do jogo você mostrar descontentamento para
conseguir um naco maior".
Com uma oposição enxuta, destaca o cientista político, é natural que o
governo enfrente mais conflitos em sua própria base do que na oposição.
Para ele, o número de ministérios nas mãos do PT hoje é desproporcional
ao tamanho da bancada e abre caminho para a insatisfação dos aliados. “No gabinete inicial, eram 17 ministros do PT e seis do PMDB. O PSB
tinha dois, o PP, o PDT e o PCdoB tinham um cada. Isso gera conflito
dentro da base. Nos governos europeus parlamentaristas, a participação
dos partidos nos gabinetes depende do número de votos que cada legenda
recebeu. É um problema satisfazer a diversidade de partidos de espectros
ideológicos diferentes”, considera.
Se o governo tem dificuldade em estabelecer uma agenda positiva, por
causa da diversidade de sua base, a oposição esbarra no dilema de
construir um discurso que resista ao sucesso da economia, a despeito da
crise que se avizinha. Ou seja, de fazer sustentar uma agenda negativa. “Qual a agenda da oposição hoje? Não tem. O fato de o país estar em um
bom momento econômico dificulta uma agenda mais negativa. A oposição tem
dificuldade de estabelecer uma agenda para se diferenciar do governo.
Como a economia está indo bem, fica difícil estabelecer essa
contra-agenda. Às vezes, os temas são distantes da população. Os temas
apropriados pelo PT na oposição tinham mais apelo do que a reforma
tributária, por exemplo".
Márcio Vilarouca acredita que esse cenário econômico favorável
explique por que a presidenta Dilma aparece hoje como favorita para as
próximas eleições presidenciais, na avaliação dos parlamentares. “Se a
economia está indo bem, a probabilidade de reeleição é muito alta. Se
daqui a três anos a economia estiver bem, é muito provável que Dilma se
reeleja”, afirma.
O cientista político diz ter ficado surpreso com o fato de o
ex-candidato tucano José Serra não ter sido lembrado uma vez sequer
pelos parlamentares, nem mesmo por seus colegas de partido. Para ele,
isso mostra que, embora não possa ser dado como carta fora do baralho,
Serra ainda está pagando pelos erros cometidos na eleição passada,
quando foi acusado por aliados de centralizar as decisões de sua
campanha e de não saber negociar apoio nos estados.
Nome mais cotado pela oposição para a sucessão presidencial, o senador
Aécio Neves (PSDB-MG) encarna uma imagem diferente, segundo o professor.
E talvez por isso, acrescenta, seja o mais lembrado. “O nome dele
aparece com 21%da preferência na oposição, enquanto o nome do Serra
simplesmente não aparece. Serra tem uma imagem de muito confronto com o
PT e com Lula. O Aécio, como bom mineiro, faz uma plataforma mais
moderada. Isso ajuda a organizar uma imagem nova para a oposição. É
difícil fazer oposição só com agenda negativa quando você tem
crescimento econômico".
Para Márcio, é natural Dilma aparecer à frente de Lula na pesquisa feita
entre os parlamentares sobre quem estará no comando do país em janeiro
de 2015. Isso só vai mudar, acredita, se a crise econômica internacional
desembarcar de vez no país. “Se o cenário econômico se mantiver, ela
tem boas condições de se reeleger. Se ficar mal, o PT tem outra carta na
manga, que é o Lula. É uma questão estratégica. Não há porque usar
agora a carta que pode ser usada mais adiante". O professor observa que, apesar de apontarem para a reeleição de Dilma,
os parlamentares ainda preferem Lula. O ex-presidente recebeu de
deputados e senadores a maior nota entre sete instituições e
personalidades. “Lula soube negociar mais com o Congresso do que Dilma.
Ela não tinha uma socialização política, coisa que nele sobrava. Dilma
tem um perfil mais técnico".
Os parlamentares deram nota, de zero a dez, a quatro instituições e três
personalidades. Destas, a mais bem avaliada foi Lula, com média de
7,25. Na pesquisa, realizada antes da revelação de que ele tem câncer de
laringe, o ex-presidente se saiu bem inclusive na análise da oposição.
Somente o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e a imprensa receberam
notas melhores dos deputados e senadores oposicionistas.
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