Resignado com o novo comportamento do Banco Central, o mercado refez cálculos e ampliou a percepção que o Brasil pode voltar a ter juro de um dígito em breve. Usando modelos de previsão semelhantes aos adotados
pelo Comitê de Política Monetária (Copom), alguns economistas preveem
Selic abaixo de 10% no início de 2012. E, se a crise externa piorar
muito, a taxa poderia cair rapidamente para perto de 5%.
Mesmo sem terem sido convencidos pelas explicações para o corte do juro,
analistas passaram os últimos dias refazendo contas para entender o que
deve acontecer com a economia comandada por esse "novo BC". Nesse
cálculo, foi preciso aumentar a dose da influência da crise global,
colocar uma porção da promessa do governo de rigor com os gastos, além
de incluir uma inédita pitada de ousadia do BC. Feitas as contas, alguns
resultados causam espanto.
Uma das estimativas mais surpreendentes é a do banco Credit Suisse, de
que a Selic deve cair de 12% para 9% em dezembro - 1,5 ponto a cada uma
das duas próximas reuniões, em outubro e novembro. O corte continuaria
em janeiro de 2012, quando o juro recuaria para 8,5%. "Assumindo que a avaliação do Copom sobre o cenário global seja
confirmada, mantemos a leitura que a resposta de política monetária mais
adequada seria a de implementar um corte de juros expressivo de forma
acelerada", diz o economista-chefe do Credit Suisse, Nilson Teixeira, em
relatório. Estimativas como essas ainda são minoria no mercado,
dominado por previsões que a Selic deve ficar entre 10% e 11% na virada
do ano.
A hipótese de redução mais forte presume inflação mais próxima de 6,5%
para favorecer o crescimento da economia. E avança no mesmo ritmo em que
piora o quadro internacional. Na ata, o BC explica que cortou o juro
para reagir ao efeito da turbulência externa, que já equivale a um
quarto da crise de 2008. O raciocínio dos analistas é: se piora a tensão
na Europa e nos EUA, será preciso uma resposta mais forte, um corte
maior do juro.
Na LCA Consultores, o economista-chefe Braulio Borges estima que a
possibilidade de o Brasil ter juro de um dígito no início de 2012 é de
um terço, mas tende a crescer. "Se houver calote na Grécia ou se a
resistência alemã em ajudar outros países ganhar força, a hipótese
aumenta bastante". Estudioso dos modelos de previsão usados pelo BC, o professor de
economia da USP Fabio Kanczuk admite que ficou impressionado com o
resultado da projeção feita para o juro caso os problemas externos
piorem. "Se o Brasil sofrer o mesmo baque, seria preciso derrubar o juro
para cerca de 5% para impedir uma depressão profunda da economia. É
impressionante", diz ele.
Um BC mais imprevisível e disposto a correr riscos ganhou forma depois
da surpreendente decisão de reduzir a Selic em 0,5 ponto porcentual. O
ambiente de incerteza no mercado global e as dificuldades fiscais nos
países da zona do euro, a estagnação da economia dos EUA e a fase aguda
da crise na Grécia fundamentaram a decisão da diretoria do BC, mas
desnortearam economistas e analistas.
Essa dificuldade pode ser evidenciada no descompasso entre a grita do
mercado contra a decisão do BC e as apostas no mercado futuro. Os juros
com vencimento em 2021 estão com taxas em torno de 11,25% e 11,3%, nível
bem inferior aos de antes da decisão do Copom, quando giravam em 12,4% e
12,6%. Para integrantes do governo, esse seria um sinal que o mercado
teria "comprado" a aposta que o juro real cairá mais do que a inflação
vai subir.
11,3% é a taxa para os juros no mercado futuro com vencimento para 2021. 12,6% era a mesma taxa há cerca de dez dias, antes da decisão do Copom de reduzir a taxa Selic em 0,5 ponto porcentual
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