segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Brasil começa a acordar para a inovação, diz especialista do MIT

O brasileiro Anthony Knopp é responsável pela ponte entre o MIT (Massachusetts Institute of Technology), um dos principais centros de pesquisa nos EUA, e as empresas. Em entrevista ao articulista Nelson de Sá, ele questiona a burocracia no Brasil, a dependência que bancos e empresas têm dos juros, deixando de financiar inovação, e até a falta de meritocracia nas universidades. Mas avalia que as empresas já começam a reagir, diante da concorrência global.

Folha - Na relação com as empresas, como é a divisão dos lucros de uma patente?

Anthony Knopp  - Basicamente, para tudo que é inventado numa universidade nos EUA, pela lei, ela é dona da propriedade intelectual. Agora, os lucros são divididos entre o professor, o estudante, se tiver, o departamento e a universidade. A empresa que dá recursos para as pesquisas não ganha aí.

Como ela ganha?

Ela tem direitos exclusivos de licenciamento. Pode licenciar a propriedade intelectual, se quiser. O MIT licencia e ganha royalties.

Vêm daí os recursos do MIT?

O orçamento do MIT por ano é de US$ 2,4 bilhões. Nos últimos 10 a 15 anos, a média de lucro que o MIT fez licenciando patentes foi de US$ 70 milhões. Não é nada, é pipoca que cai no chão. O que o MIT faz é conseguir com que 25.000  empresas tenham sido iniciadas por pessoas dentro dele. E que mais de 3,3 milhões de pessoas sejam empregadas por elas. A relação do MIT com o mundo industrial não é em torno de patente. Ela faz parte, mas o que acontece é que ideias e pessoas saem daqui, começam indústrias.

Esses 2,4 bilhões são só para pesquisa?

É o orçamento geral. US$ 1,4 bilhão vai para a pesquisa.


De onde vêm os recursos?


Desse US 1,4 bilhão, 80% são de dinheiro público. Mas, o importante é que é competitivo. O governo diz "temos interesse em energia geotérmica",  e várias empresas e universidades concorrem. Do resto, 15% vêm indústria e 5% das fundações.

O MIT é um modelo que provou dar certo.

Que funciona, exato.

O que o Brasil poderia fazer, para adaptá-lo?

É uma pergunta complicada. Eu sou um gringo carioca. Saí de casa aos 18 anos, e moro nos EUA há 40 e tantos anos. Ainda tenho passaporte brasileiro, então posso falar. Um dos desafios é que o Brasil tem cultura ibérica. Quer dizer, tudo precisa ter uma regra, um processo, tem que ser permitido. E os bancos fazem mais dinheiro emprestando para Brasília, do que para um cara que quer começar uma nova ideia. Conheço empreendedores no Brasil e,  para todos o mais difícil é ir a um banco, por serem pequenos, terem um só sucesso e não 25. Se você tem 22 anos e quer iniciar uma empresa de Internet, e precisa de R$ 100 milhões,  não tem ninguém.  Aqui, ele formam fila para dar esse dinheiro.

Ainda se tem a universidade como lugar de resistência à iniciativa privada.


Eu estive no Brasil, eu entendo. Mas, isso é de 50 anos atrás. É dentro da universidade que há gente pensando, que tem a possibilidade de arriscar, pensar diferente. E, no fim do dia, o nome do jogo é criar emprego. Para isso, você tem que criar uma máquina econômica, indústria, novas ideias. Tem muita energia na universidade, é preciso abrir as portas.

O MIT tem relação com universidades emergentes?

Tem muitas. Estamos nos EUA, mas mais de 30% dos professores nasceram e foram formados em outros países. E 35%, 40% dos pós-graduados são de fora. Hoje temos interação com China, Coreia do Sul, nas próximas semanas vai sair uma grande com a Rússia.

Com o Brasil há uma relação histórica com o ITA, em São José dos Campos, que gente do MIT ajudou a criar.

Você falou que as empresas preferem os juros altos que o governo paga a investir em inovação. Elas também precisam mudar?

A resposta curta é sim, mas é um pouco mais complicado. Há 15 tento trazer empresas brasileiras para interagir com o MIT. Não havia nenhuma, hoje temos dez. O que está acontecendo é que o Brasil emergente, sendo mais global, começa a ver a importância da academia. A Embraer é um exemplo. Ela entende que os concorrentes estão envolvidos com universidades, no mundo todo. Por isso está não só no MIT, mas em Southampton, na França e em outras. A Vale também.

Se tivesse que apontar uma instituição em que vê potencial de interação, qual seria?

É outra pergunta complicada. Posso falar, pelo meu envolvimento aqui do trabalho, da fundação Certi, de Florianópolis, e da agência Inova, da Unicamp.  


O MIT é uma meritocracia, o que é muito importante para o MIT. Quer dizer, vocês têm aí o famoso vestibular, então quem entra na USP é o melhor, etc, etc. Mas eu não tenho certeza se a meritocracia desses lugares é meritocracia mesmo. Aqui no MIT você pode ser preto, branco: a única coisa que conta é o que você tem entre suas orelhas.  Eu perguntaria quais são as universidades que estão a fim de competir. Isso me dói, a cada ano vejo o que chamam aqui de "league tables" [tabelas de campeonato], quem está em primeiro, em segundo, entre as universidades do mundo. O Brasil não faz parte.

 Anthony Knopp - (Foto: MIT).










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