terça-feira, 18 de outubro de 2011

O gelo ártico está derretendo mais rapidamente do que o previsto pelos modelos climáticos. Por que?

No dia 9 de setembro, no máximo de sua redução em época de verão, o gelo cobria 4,33 milhões de km² do oceano Ártico, de acordo com o Centro Nacional Americano de Dados de Neve e Gelo (NSIDC, em inglês). Isso não é um recorde como valor baixo, não exatamente. Mas, o recorde real de 4,17 milhões de km²  em 2007 foi o resultado de uma inusitada combinação de dias ensolarados, céus sem nuvens, e correntes tépidas originadas de latitudes médias. Este ano, apesar de condições não tão adversas, o mínimo de gelo de verão no oceano é no entanto apenas 4% maior do que aquele recorde. Acrescente-se a isso o fato de que a espessura do gelo, que é muito mais difícil de medir, é estimada em ter caído pela metade desde 1979, quando começaram os registros por satélite, e há provavelmente menos gelo flutuando no Oceano Ártico agora do que em qualquer época desde um período particularmente quente há 8.000 anos atrás, logo após a última idade do gelo.

Que o gelo do Ártico está desaparecendo, sabe-se há décadas. Acredita-se, exceto na opinião de um punhado de climatologistas, que a causa subjacente a isso seja o aquecimento global acarretado pelas emissões de gases do efeito estufa. No entanto, a velocidade com que o gelo está desaparecendo confunde os modelos dos climatologistas, que prevêem que, se o nível de dióxido de carbono, metano, etc, na atmosfera continuar a subir o Oceano Ártico não terá mais gelo flutuante no verão no final do século. Nas taxas atuais de redução, no entanto, isso parece que acontecerá em algum momento entre 2020 e 2050.

A razão é que o ar do Ártico está se aquecendo duas vezes mais rápido do que a atmosfera como um todo. Algumas das causas disso são compreensíveis, outras não. A cor escura da terra e da água comparada com o nível de reflexo de luz da neve e do gelo significa que, quando estes últimos derretem para mostrar os primeiros (terra e água), a área exposta absorve mais calor do sol e reflete menos dele de volta para o espaço. O resultado é um "loop de feedback", ou sistema fechado de reação/resposta, que acelera o aquecimento local. Entretanto, esse feedback não explica completamente o que está acontecendo. Daí a busca por outras razões que possam estar colaborando para o rápido desaparecimento do gelo.

Uma dessas razões é a mudança física do próprio gelo. Anteriormente uma massa sólida que derretia e se recongelava nas suas margens ou beiradas, o gelo agora é menos espesso, mais fraturado e, assim, mais suscetível de se derreter. Mas isto é, literalmente e figurativamente, um efeito marginal. Para preencher o gape entre modelo e realidade é preciso algo mais do que isso.

Os "candidatos" mais recentes como contribuintes para o que vem acontecendo são as "pressões climáticas de curto prazo", que são os poluentes, particularmente o ozônio e a fuligem, que não pairam na atmosfera como o dióxido de carbono mas têm que ser renovados continuamente para terem um efeito duradouro. Se essa renovação acontecer, entretanto, seu impacto pode ser tão grande como o do dióxido de carbono.

No momento, a maioria das atenções está voltada para a fuligem -- ou "carbono negro", como os pesquisadores amantes de jargões gostam de chamá-la. No Ártico, a fuligem é duplamente uma praga. Primeiro, quando liberada no ar como resultado de uma combustão incompleta (resultante de fontes variadas como motores/geradortes diesel deficientes e incêndios florestais), suas partículas absorvem a luz solar e assim aquecem a atmosfera. Depois, quando neve ou chuva as levam para um banco de gelo, elas escurecem sua superfície e fazem com que ele se derreta mais rapidamente.

Reduzir a fuligem (e também o ozônio, um poluente industrial que atua como um gás de efeito estufa) não interromperia o desaparecimento do gelo de verão, mas poderia retardar o processo por uma ou duas décadas. De acordo com um relatório recente do Programa Ambiental das Nações Unidas, a redução de "carbono negro" e de ozônio na camada inferior da atmosfera, especialmente em países árticos como EUA, Canadá, Rússia e Escandinávia, poderia reduzir em dois terços o aquecimento do Ártico nas próximas três décadas. De fato, insinua o relatório, se tais medidas -- evitar a queima de colheitas e de florestas, fazer a limpeza de equipamentos a diesel e de fornos a lenha, etc -- fossem adotadas em todas as partes, elas poderiam reduzir à metade em 2050 a faixa maior de aquecimento.

Sem medidas correspondentes para reduzir as emissões de CO₂ isso seria nada mais que uma solução temporária, mas, não obstante, é uma ideia atraente porque traria outros benefícios (a fuligem é maléfica pra os pulmões humanos), e não exigiria o rearranjo geral da produção de energia que a redução de emissões de CO₂ implica. Mas, nem todo mundo concorda em que isso funcionaria. Gunnar Myhre, do Centro para Pesquisa Internacional Climática e Ambiental em Oslo, por exemplo, observa que a quantidade de carbono negro no Ártico é pequena, e tem diminuído em décadas recentes. Ele não acredita que esse seja o fator que falta nos modelos. O dióxido de carbono, na sua opinião, é o principal culpado. O carbono negro depositado na neve e no gelo do Ártico, diz ele, terá apenas um efeito mínimo na capacidade de refletir a luz dessas superfícies.

O derretimento rápido do gelo do Ártico mostra pois a dificuldade de modelar o clima -- mas não de uma maneira que traga muito conforto para aqueles que desejam que os receios sobre o futuro climático se mostrem exagerados. Quando a realidade se altera mais rapidamente do que o sugerido pela teoria, um certo nível de nervosismo é uma resposta sensata. 

Um urso polar no Oceano Ártico (Foto: B&C Alexander/Artic Photos).

Mapa da revista The Economist, mostrando a extensão do gelo de verão no Ártico em 9/9/2011 comparativamente com a extensão média no período 1979-2000.

Veja o vídeo da revista The Economist, que mostra a diminuição da calota polar no Ártico e as rotas marítimas que ela poderá desbloquear.

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