O texto a seguir é de reportagem publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo, de autoria de Vinicius Mota, acessível apenas a assinantes e leitores do jornal.
O Brasil vai se tornar a 6ª economia mundial por três motivos, em ordem de importância: inflação, alta da produção doméstica, e valorização do real. De cada US$ 100 adicionados ao valor do PIB nos últimos dez anos, US$ 68 decorreram da soma do primeiro e do terceiro fatores -- variação de preços internos e câmbio. A alta física do produto responde pelos US$ 32 restantes.
No mesmo período, a trajetória do Reino Unido, a ser ultrapassado pelo Brasil, foi bem diferente. A elevação da produção física foi responsável por 67% da alta do valor do PIB em dólares. Inflação e variação cambial explicam 33% do resultado.
De 2001 a 2011 -- tomando a projeção do FMI para este ano -- o PIB brasileiro em dólares ("PIB nominal", no jargão) aumentou 355% (multiplicou-se por 4,5). Já o PIB real, sem os efeitos dos preços e do câmbio, cresceu 46%. Daí se conclui que, não fossem a inflação mais alta e os ganhos do real diante do dólar, o Brasil iria demorar muito mais tempo para ultrapassar a economia britânica.
O objetivo de medir o PIB é chegar a uma cifra que expresse o volume produzido por um país em certo período. Simplificando, o desafio é exprimir a quantidade de carros, edifícios, geladeiras, etc, fabricados num ano. O resultado pode ser comparado aos de períodos anteriores e então se sabe se o PIB, o volume da produção, caiu ou cresceu -- e quanto.
Convém expressar o PIB numa unidade de conta comum, dinheiro corrente, desde que se tome cuidado com os efeitos da inflação. Suponha o leitor que o faturamento da indústria aeronáutica, num exemplo meramente ilustrativo, subiu de R$ 100 bilhões para R$ 110 bilhões de um ano para o seguinte. Este último valor, acusando alta de 10%, vai compor o PIB nominal brasileiro. Mas, digamos que a quantidade de aviões produzidos tenha ficado igual nesse período -- e tudo o que houve foi alta de preços. Então, a contribuição do setor aeronáutico para a variação real do PIB brasileiro terá sido zero.
No Brasil, que apresenta inflação mais alta se comparado a países desenvolvidos, a discrepância entre crescimento nominal do PIB e sua alta real costuma ser grande. Em 2009, o PIB real brasileiro caiu 0,3%, enquanto o nominal cresceu 6,8%. Em 2010, o real aumentou 7,5%, contra 16,4% do nominal.
Quando a tarefa é expressar em dólares esse PIB nominal -- a fim de comparar o desempenho de várias nações --, surge a dificuldade adicional da taxa de câmbio. Tome-se de novo o exemplo dos aviões, agora supondo que R$1 vale US$1 no primeiro ano e US$ 1,10 no segundo. Como foi visto, o PIB nominal em reais daquele setor aumentou de R$ 100 bilhões para R$ 110 bilhões só em virtude da inflação. Coloque-se na conta o efeito da valorização do real, e o resultadop será o PIB nominal em dólares passando de US$ 100 bilhões para US$ 121 bilhões de um ano para o outro, alta de 21%. Isso a despeito de a variação real da produção de aviões ter sido nula.
Esse duplo efeito, da inflação e do câmbio, foi acentuado nos últimos anos. O IBGE mostra que a inflação embutida no cálculo do PIB -- chamada de "deflator implícito" -- teve alta de 138% entre 2001 e 2010. No mesmo período, tomando-se a cotação média anual, o real valorizou-se 25% em relação ao dólar.
Em outros períodos da história, inflação e desvalorização cambial caminhavam juntas, uma alimentando a outra. Se a inflação elevava o PIB nominal, a desvalorização o podava na hora de convertê-lo em dólares.
Esse padrão se alterou na década passada, porque o Brasil começou a acumular superávits expressivos no comércio e nas finanças internacionais -- em razão sobretudo da alta de cotação de produtos, como minério de ferro e alimentos, que o país exporta em abundância. Esse fato inverteu as regras do jogo, alimentou a valorização do real e ajudou a conter a inflação -- mas não a ponto de impedir que, pelo efeito da alta moderada dos preços, o poder de compra internacional do Brasil aumentasse substancialmente.
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