quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Formigas usam estratégia militar para acabar com inimigos

O chinês Sun Tzu (544 a.C.-496 a.C.) pode ter levado a fama de pai da estratégia militar com seu livro "A Arte da Guerra". Para o americano Mark Moffett, contudo, seria bem mais justo que o título ficasse com as formigas.

Pesquisador do Museu Nacional de História Natural dos EUA e fotógrafo de mão cheia, Moffett roda o mundo há décadas documentando o comportamento das criaturas. Em seu livro "Adventures Among Ants" ("Aventuras Entre Formigas", ainda sem tradução para o português) e em artigo na revista "Scientific American" deste mês, ele defende que esses insetos sociais são o único tipo de animal que guerreia de forma semelhante aos Estados organizados por seres humanos. Ou seja: milhares de indivíduos em formação cerrada, apostando tudo num confronto que pode significar a vitória ou a aniquilação.

Questão de escala

Muitos outros animais, como chimpanzés e lobos, envolvem-se em escaramuças "de fronteira" ou tocaias, mas nem chegam perto da escala homérica que caracteriza humanos e certas formigas, diz. Entre as mais belicosas estão as asiáticas Pheidologeton diversus, ou formigas-saqueadoras, e as espécies de formiga-correição, como a Dorylus nigricans, da África.

As colônias desses bichos são a versão invertebrada dos hunos ou do exército de Gêngis Khan: hordas numerosíssimas (com até milhões de indivíduos), extremamente móveis, que não deixam pedra sobre pedra em seu caminho.  Mas elas não são devastadoras por mera força bruta. Sua primeira vantagem estratégica é a formação cerrada, ou seja, a capacidade de empacotar muitas formigas na frente de batalha, criando uma muralha impenetrável de soldados. É o que faziam os antigos gregos e macedônios, por exemplo.

As formigas-saqueadoras, além disso, desenvolveram seu próprio batalhão de operações especiais. Enquanto o grosso do ataque depende de operárias diminutas, que existem em grande número e são relativamente descartáveis para o formigueiro, os golpes de misericórdia nos inimigos mais parrudos são dados por "capitãs" enormes, que chegam a ser 500 vezes mais pesadas que as "soldadas rasas". De quebra, elas ainda servem de "tanque", carregando as operárias menores para a frente de batalha.

Guerra psicológica

Guerra psicológica? Formigas que escravizam outras espécies a praticam também, "bombardeando" o formigueiro alheio com substâncias que deixam suas inimigas em pânico.

Para Moffett, os motivos que levaram algumas espécies de formigas a adotar a guerra total são muito parecidos com os que operaram nos Estados humanos. "As sociedades menores são mais flexíveis e acabam se mudando quando o conflito aparece", disse o pesquisador à Folha. "Já as maiores conseguem armazenar mais comida, força de trabalho e tropas de reserva, criando estradas, infraestrutura complexa e exércitos para conquistar suas rivais", explica.  

Democracia na guerra

Não é raro achar elogios à sociedade das formigas nos textos de ideólogos humanos que simpatizam com o autoritarismo. Esses sujeitos não poderiam estar mais enganados, diz Mark Moffett.  "De fato, as formigas mostram devoção inquestionável à sua sociedade, mas isso é muito diferente da devoção a um líder político ou a uma hierarquia", explica o pesquisador americano. "Não existe ninguém controlando as vidas delas", diz Moffett. Nos combates, não há "oficiais" dando ordens. Cada formiga que encontra um inimigo deixa um rastro de feromônios (odores especiais que funcionam como sinalizadores químicos).

O aroma recruta outras "soldadas" para a pancadaria, as quais também liberam seus próprios feromônios.  Quanto mais formigas reforçarem o rastro, mais forte será o sinal de alarme enviado para o formigueiro.

Da mesma forma, assim como entre os britânicos, a rainha reina, mas não governa, lembra Moffett. Ela é apenas a reprodutora oficial (as operárias, de todos os tipos, costumam ser estéreis).  Moffett diz que andou por todos os países da América do Sul (além dos demais continentes) em busca dos insetos. Ele não tem uma formiga brasileira favorita. "Seria impossível escolher uma só. A melhor coisa no Brasil é a diversidade de formigas, que é maior do que em qualquer outro lugar do mundo", diz.

A próxima parada do pesquisador, na semana que vem, é a Etiópia. "Vou escalar árvores nos últimos fragmentos de floresta que restam por lá, localizados em torno de igrejas", conta.

Formiga-correição "Dorylus nigricans" em posição de alerta; insetos adotam estratégia de guerra agressiva - (Foto: Mark Moffett/Minden Pictures).

Dados do livro do pesquisador:

"Adventures among ants: a global safari with a cast of trillons"
Autor: Mark Moffett
Editora: University of California Press
Preço: US$ 16,47



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