quinta-feira, 17 de maio de 2012

Optoeletrônica: o grafeno se apresenta

Um material novo, muito badalado, pode mudar as telecomunicações.

O grafeno, uma forma de carbono em lâminas com a espessura de um único átomo, ganhou a reputação de um material maravilhoso. É o melhor condutor de calor à temperatura ambiente já descoberto, e é 40 vezes mais resistente que o aço. É também um semicondutor cuja condutividade elétrica é 1.000  vezes melhor que a do silício. Isto significa que poderia ser utilizado na fabricação de dispositivos muito mais sensíveis do que é hoje possível fazer, o que leva alguns a prever que se tornará um dia o material preferido para chips de computadores. Houve, portanto, pouca surpresa quando Andre Geim (ver foto) e Konstantin Novoselov, dois físicos que estavam estudando a estrutura do grafeno, ganharam o Prêmio Nobel de Física de 2010.

Na vida real, tem sido difícil converter em produtos as maravilhas do grafeno. Mas, Frank Koppens e seus colegas no Insituto de Ciências Fotônicas em Barcelona consideram que descobriram um meio de fazê-lo. Como descrevem em Nature Nanotechnology, eles acreditam que o grafeno pode ser utilizado na fabricação de fotodetetores ultrassensíveis de baixo custo.

Fotodetetores são dispositivos que convertem luz em eletricidade. São usados em câmeras digitais, equipamento para visão noturna, produtores de imagens biomédicos, sensores de poluição e telecomunicações. Um fotodetetor típico é feito de um chip de silício de poucos milímetros de espessura, sobre o qual se focaliza luz por meio de uma lente pequena. A luz que atinge o chip libera  elétrons de alguns dos átomos de silício, gerando um sinal que a eletrônica do chip converte em imagem ou qualquer outra informação útil.

Os fotodetetores de silício sofrem, no entanto, de uma desvantagem: não são maleáveis. Também não são particularmente baratos. E não são tão sensíveis, absorvem apenas de 10% a 20% da luz que lhes é aplicada. Por consequência, engenheiros têm estado há anos à procura de um fotodetetor barato, maleável e sensível. Um dispositivo como esse poderia ter muitas aplicações inovadoras -- eletrônica para se vestir (roupas "inteligentes" -- wearable electronics), por exemplo. Com um pouco de engenharia "esperta", o grafeno pode ser a solução.

O grafeno, em si mesmo, é pior que o silício para absorver luz -- de acordo com o Dr. Koppens, apenas 2,7% dos fótons que o atingem são capturados. Mas, ele e seu colega Gerasimos Konstantatos conseguiram aumentar essa absorção para mais de 50% aplicando, com spray, cristais minúsculos de sulfeto de chumbo sobre a superfície do material. Esses cristais são tão pequenos (3 a 10 nanômetros de espessura -- um nanômetro é a bilionésima parte do metro), que são conhecidos como "pontos quânticos" (quantum dots), porque em dimensões medidas em nanômetros os fantásticos efeitos da mecânica quântica começam a manifestar-se por si mesmos. Um desses efeitos é que o tamanho do ponto quântico afeta a cor da luz que ele absorve melhor. Quanto maior o ponto, mais vermelha é essa luz; inversamente, quanto menor, mais azul. Isso possibilita aos Drs. Koppens e Konstantatos abarcar todos os comprimentos de onda, do ultravioleta ao infravermelho, aumentando significativamente a utilidade de qualquer fotodetetor que possa resultar. O infravermelho, por exemplo, é importante em telecomunicações e aplicações para visão noturna. Comprimentos de onda visíveis, por outro lado, para câmeras e células solares.

De acordo com o Dr. Koppens, a interação entre os pontos quânticos e o grafeno funciona porque o grafeno possui tantos elétrons móveis em sua estrutura -- esta é a razão pela qual ele é tão bom condutor tanto de calor como de eletricidade. Essa abundância de elétrons livres torna o grafeno particularmente sensível às mudanças induzidas em um ponto quântico, quando este absorve um fóton de luz: cada fóton incidente mobiliza cerca de 100 milhões de elétrons. No jargão da engenharia eletrônica, portanto, o híbrido ponto quântico - grafeno possui um "ganho" tremendamente elevado. E isso significa que o material pode ter aplicações ainda mais amplas do que em câmeras da moda e roupas "inteligentes". Pois o que os Drs. Koppens e Konstantatos fizeram na realidade foi criar as partes mais importantes de um transistor que é regulado pela luz.

Transistores normais são chaves em que uma corrente elétrica (usualmente baixa) é utilizada para regular a passagem de outra corrente (usualmente muito mais elevada). Qualquer sinal conduzido pela corrente baixa é assim amplificado em outro conduzido pela corrente mais elevada -- um sistema de ganho alto. Tais transistores são os "pés-de-boi" da eletrônica convencional. Mas, os transistores optoeletrônicos, especialmente os de ganho alto, são muito mais difíceis de se produzir. Isto é uma pena, porque estão em grande demanda nas redes de telecom do mundo, nas quais os sinais são processados localmente como elétrons mas são transmitidos a grandes distâncias como luz. 

No momento, o Dr. Koppens e seus colegas dizem que seu objetivo é criar "o detetor mais fino (delgado) e mais maleável do mundo".  É de se notar, entretanto, que eles depositaram seu fotodetetor ponto quântico - grafeno experimental sobre uma peça de silício. Seu propósito ao fazer isso era mostrar que a tecnologia se encaixa com as técnicas padrões de processamento de silício usadas para fazer chips de computadores.

Muitos têm tentado superar as barreiras que se apresentam no caminho da integração sem "ressaltos" das tecnologias de informação baseadas em elétrons com as baseadas em fótons, e ninguém foi inequivocamente bem sucedido. Resta ver se o Dr. Koppens é o homem para conseguir isso. Mas, se ele o for, ele certamente terá justificado o alvoroço que o grafeno tem provocado.

Dr. Andre Geim, um dos dois ganhadores do Prêmio Nobel de Física de 2010, por seu trabalho sobre a estrutura do grafeno - (Foto: SPL).

[Em agosto de 2011, Brasil e China negociavam um convênio sobre nanotecnologia em que o grafeno estava envolvido. Mas, para mostrar que o Brasil é muito mais o país dos contrastes e da visão rasteira, miúda, do que o projetado por Stefan Zweig, a decisão burra do governo Dilma de reduzir em 2012 a dois terços do que era em 2010 (!...) a verba do MCTI - Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação colocou em altíssimo risco pesquisas importantíssimas para o país, entre elas as que envolvem o grafeno.]

2 comentários:

  1. Para os leitores desta postagem gostaria de acrescentar a referência "Painéis fotovoltaicos e LEDS à base de grafeno mais perto da realidade", de Ricardo Pinto ( http://wikienergia.com/~edp/index.php?title=Pain%C3%A9is_fotovoltaicos_e_LEDs_%C3%A0_base_de_grafene_mais_perto_da_realidade ).

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  2. Amigo VASCO:
    Dois comentários:
    1) estou acompanhando com carinho toda essa evolução tecnologica, por uma simples razão: estamos muito próximos da fronteira entre os DOIS MUNDOS descritos pela RELATIVIDADE e pela MECÂNICA QUÂNTICA. Ainda temos muito que aprender e investigar. Não tenha dúvidas, outras novidades aparecerão;
    2) a limitação de verba, aqui no Brasil, para pesquisas em geral, está obrigando a que os "cérebros" brasileiros procurem abrigo em outros países, na forma de cursos de doutorado em instituições sérias existentes no mundo civilizado. O maior problema para esses alunos/cientistas é a volta ao BRASIL. Não encontrarão em quase nehuma instituição brasileira, condições para dar prosseguimento aos seus estudos. Isso é mais penosso quando se vê que professores das universidades brasileiras vão fazer mestrado/doutorado nos exterior e, ao voltarem, só têm como ferramentas de trabalho, o mesmo quadro-negro e o mesmo giz que SEMPRE foram usados aqui no país. O ganho é, simplesmente, pessoal, não revertendo para a sociedade que pagou por seus estudos lá fora, algum benefício.
    O filho de um grande amigo, formado pela UFES, está hoje, na Inglaterra, trabalhando nessa área de3 pesquisa. O garoto já tem alguns trabalhos publicados, em colaboração com pesquisadores lá residentes. Qual a esperança dele, em retornando ao Brasil, continuar nessa linha investigativa, e de descobertas? A resposta é ZERO ou próximo a isso.
    O que fazer para transformar essa "republica das bananas" em algo sério, se os que nos comandam só entendem de .....BANANAS!!!

    Abraços - LEVY

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