[Sou velho admirador de Dora Kramer, que considero um dos expoentes da crônica política neste país. Mas, em sua coluna de hoje no jornal O Estado de S. Paulo ela pegou pesado -- ela botou o dedo na consciência de todos nós, lembrando-nos de que somos todos culpados pelas estultices e desatinos que Lula, o Nosso Pinóquio Acrobata (NPA), vem cometendo desde que se elegeu presidente. E o diabo é que ela está absoluta e completamente certa!!... -- Vejam a seguir a íntegra de sua coluna de hoje. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]
Criação coletiva
Dora Kramer - O Estado de S. Paulo (29/5/12)
Não, o ex-presidente Lula não perdeu o juízo como sugere em princípio o
relato da pressão explícita sobre ministros do Supremo Tribunal Federal
para influir no julgamento do mensalão, em particular da conversa com o
ministro Gilmar Mendes eivada de impropriedades por parte de todas as
partes.
Lula não está fora de si. Está, isto sim, cada vez mais senhor de si.
Investido no figurino do personagem autorizado a desrespeitar tudo e
todos no cumprimento de suas vontades.
E por que o faz? Porque sente que pode. E pode mesmo porque deixam que
faça. A exacerbação desse rude atrevimento é fruto de criação coletiva e
não surgiu da noite para o dia.
A obra vem sendo construída gradativamente no terreno da permissividade
geral onde se assentam fatores diversos e interesses múltiplos, cuja
conjugação conferiu a Lula o diploma de inimputável no qual ele se
encontra em pleno usufruto.
Nesse último e bastante assombroso caso, produto direto da
condescendência institucional - para dizer de modo leve - de dois
ex-presidentes da Corte guardiã da Constituição: o advogado Nelson
Jobim, que convidou, e o ministro Gilmar Mendes, que aceitou ir ao
encontro do ex-presidente.
Nenhum dos dois dispõe da prerrogativa da inocência. Podiam até não
imaginar que Lula chegaria ao ponto da desfaçatez extrema de explicitar a
intenção de influir no processo, aconselhando o tribunal a adiar o
julgamento e ainda insinuar oferta de "proteção" ao ministro.
Inverossímil é que não desconfiassem da motivação do ex-presidente que
anunciou disposição de se dedicar diuturnamente ao desmonte da "farsa do
mensalão" e provou isso ao alimentar a criação de uma comissão
parlamentar de inquérito no intuito de embaralhar as cartas e embananar o
jogo.
Mas, apenas para raciocinar aceitemos o pressuposto da ingenuidade,
compremos a versão do encontro entre amigos e consideremos natural tanto
o convite quanto a anuência.
À primeira questão posta - "é inconveniente julgar esse processo agora"
-, à primeira pergunta feita pelo ex-presidente - "não tem como adiar o
julgamento?" -, se o ministro Gilmar Mendes tivesse agradecido ao
convite e polidamente se retirado, não teria ouvido o que viria a
seguir, segundo o relato que fez depois ao presidente do STF, ao
procurador-geral da República e ao advogado-geral da União.
Narrativa esta que se pressupõe verdadeira. Se aceitarmos a versão do
desmentido apresentada por Nelson Jobim teremos de aceitar a existência
de um caluniador com assento no Supremo Tribunal Federal e de esperar
contra ele algum tipo de interpelação.
Tivesse dado por encerrado o encontro logo de início, o ministro Gilmar
Mendes não teria ficado "perplexo com o comportamento e as insinuações
despropositadas do presidente Lula".
Não teria ouvido alusões ao seu possível envolvimento com o esquema
Cachoeira - razão da oferta de proteção na CPMI -, não teria escutado o
ex-presidente chamar o ministro Joaquim Barbosa de "complexado".
Não teria testemunhado Lula desqualificar ao mesmo tempo o ex-ministro
Sepúlveda Pertence e a ministra Cármen Lúcia ao sugerir a existência de
uma cadeia de comando com a frase "vou falar para o Pertence cuidar
dela".
É verdade que se tivesse ido embora o ministro Gilmar Mendes teria poupado a si um enorme constrangimento.
Mas não daria ao País a oportunidade de saber que o ex-presidente tem
acesso a informações de um inquérito na data da conversa (26 de abril)
ainda protegido por sigilo de Justiça.
Não saberíamos que Lula diz orientar a conduta do ministro Dias Toffoli -
"eu falei que ele tem que participar do julgamento"- e que afirma
acompanhar de perto os passos do ministro revisor do processo do
mensalão, Ricardo Lewandowski - "ele só iria apresentar o relatório no
semestre que vem". [Que estranha coincidência: Lewandowski é vizinho do NPA em São Bernardo do Campo, e teria sido indicado pelo NPA para o STF por sugestão da ex-primeira (na época, primeiríssima) dama, Dª Marisa ...]
Em suma, ninguém fica bem nessa história, mas Lula fica pior ao deixar
que a soberba e o ressentimento o façam porta-voz do pior combate: a
desqualificação das instituições. Entre elas o papel de ex-presidente da
República.
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