terça-feira, 10 de setembro de 2013

Sob qualquer ângulo, o desaparecimento de Amarildo no Rio é uma agressão inadmissível a todos nós

[Há praticamente 60 dias um cidadão da favela da Rocinha, na cidade do Rio de Janeiro, foi interceptado por policiais da PM e supostamente conduzido à Unidade de Polícia Pacificadora da comunidade. Desde então, 14 de julho de 2013, ninguém mais o viu e ninguém consegue localizá-lo, apesar de ter sido registrado via GPS todo o trajeto da viatura policial que o transportava. Aliás, o país está se mostrando especialista em sequestro e envolve até diplomatas nisso, como no caso recentíssimo do senador boliviano.

Em qualquer país com um mínimo de decência e justiça, cabeças teriam rolado e responsabilizados criminalmente pelo sequestro e desaparecimento de um cidadão. Acontece que, há uma década, o Brasil não ostenta essa decência nem essa justiça. Afinal, não fica bem pressionar um governador que, além de ser do PMDB, um dos pilares de sustentação do governo petista de Dilma, a doce, vem passando coitado por um perrengue danado com manifestantes de rua zoando sua vida em casa e no palácio do governo. Monta-se então a ópera bufa -- as autoridades em geral, e o secretário de Segurança em particular, posam com caras de otários (o que em seu caso é apenas a explicitação de uma realidade), a corporação policial mostra outra vez que é dona e árbitra absoluta do que faz, e a família de Amarildo e toda a cidadania carioca e brasileira sofrem com mais um desaparecimento e outra bofetada na face. A reportagem abaixo é do Estadão de hoje.]

Quase dois meses depois do desaparecimento do pedreiro Amarildo Souza, de 43 anos, na Favela da Rocinha, zona sul do Rio, o Ministério da Justiça analisa a possibilidade de a Polícia Federal instaurar inquérito para apurar o caso. A investigação da PF seria paralela à conduzida pela Polícia Civil fluminense. 

O Estado apurou que o ministro José Eduardo Cardozo telefonou para o governador Sérgio Cabral (PMDB) e teria estipulado um prazo para que o inquérito da Divisão de Homicídios fosse concluído. Caso contrário, a PF abriria inquérito paralelo. O delegado Rivaldo Barbosa, da DH, foi chamado por Cabral ao Palácio Guanabara, que cobrou rapidez nas investigações. [Mais um ato da encenação conjunta entre os palácios do Planalto e o da Guanabara.]

Cardozo pediu parecer à Advocacia-Geral da União, após dez deputados federais do Rio solicitarem formalmente a entrada da PF no caso, no dia 4. Amarildo está desaparecido desde 14 de julho, quando foi conduzido por policiais militares de sua casa até a Unidade de Polícia Pacificadora da Rocinha (UPP). O inquérito é a prioridade "número um" na Divisão de Homicídios.

Apesar das dezenas de depoimentos colhidos e das perícias já realizadas, a DH ainda não conseguiu reunir provas suficientes para indiciar os suspeitos. Oficialmente, há duas linhas de investigação: de que o crime tenha sido cometido por PMs da UPP, ou por traficantes que ainda atuam na Rocinha. Entretanto, nos bastidores, fontes ligadas à investigação dizem que a hipótese mais forte até o momento aponta para o envolvimento de policiais no sumiço do pedreiro.

Pensão. A Justiça do Rio deferiu pedido de antecipação de tutela para obrigar o Estado do Rio a pagar um salário mínimo, a título de pensão alimentícia, aos parentes de Amarildo. O Estado também deverá fornecer tratamento psicológico, no valor de R$ 300 por consulta, aos familiares do pedreiro. A ordem é do desembargador Lindolpho Marinho, da 16.ª Câmara Cível. O magistrado modificou decisão do juízo da 4.ª Vara de Fazenda Pública, que havia negado os pedidos dos familiares da vítima. 

"Não é difícil imaginar uma família humilde, pobre, tendo como moradia apenas um cômodo, de futuro incerto e sem esperança de dias melhores, que repentinamente se confronta com angustiante e desesperador acontecimento: o seu chefe é levado pela autoridade policial, que lhe deve custodiar e simplesmente desaparece", escreveu o desembargador, em sua decisão. "Tudo isso leva a crer fielmente que esta família necessita com urgência de amparo. O Estado do Rio de Janeiro, por ato de sua Polícia Militar, é que aparece como parte deste infausto acontecimento", completou Marinho.


Um comentário:

  1. Escabrosa estória, essa do Amarildo. Ainda mais, aquela da chacina dos Pesseghini, em São Paulo. Resumindo a ópera, o cidadão comum, desarmado pelo NPA e pelo Tomás Bastos, vai sendo abatido por policiais, por bandidos e por congressistas com suas penadas com caneta Mont-Blanc. Enquanto tudo isso rola, mais Pão & Circo para um povo idiotizado.
    Rock in Rio... eu vou cheirar!

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