Em muitos países do Oriente Médio, as charges são armas de subversão poderosas. No passado, seus desenhistas eram frequentemente tímidos em face à censura -- um retrato ridicularizado de um monarca em um trono coberto de joias, com ar de desgosto ou ofensa enquanto examina seus súditos pode ser aceitável, mas não é a mesma coisa com representações dele obviamente mais humilhantes. É melhor focalizar assuntos de terceiros, como por exemplo o apoio americano a Israel. Entretanto, os cartunistas árabes estão ficando mais ousados. No Egito, passaram um ano ridicularizando seu presidente sitiado, Muhammad Morsi, antes dele ser deposto. Jornais sírios da oposição mostram o presidente Bashar al-Assad banhado em sangue.
A ênfase islâmica na palavra escrita em detrimento da representação visual (é proibido desenhar o profeta Maomé) fez com que as charges, de longa data populares na Europa, chegassem atrasadas ao mundo muçulmano. Elas se tornaram populares no império otomano em meados do século 19. Yacoub Sanou, um judeu sírio, começou a publicar charges no Egito em 1877. Várias décadas depois, outros fizeram o mesmo nos atuais Síria, Líbano e Iraque.
Cartunistas nesses países e nos vizinhos afirmam que ajudaram no surgimento da primavera árabe. Ali Ferzat, um caricaturista sírio, criticava seus líderes muito antes do início dos protestos em 2011. Agora, menos constrangidos, muitos outros estão se juntando a ele. Jonathan Guyer, um acadêmico pesquisador de charges baseado no Cairo, fala de uma nova idade de ouro. Ele diz: "Raramente tenho visto agora piadas infames ou metáforas antissemitas". Cartunistas jovens incorporam a cultura popular em seus trabalhos, atraindo novas audiências. Khalid al-Baih, um cartunista sudanês baseado no Qatar, tem visto seus desenhos aparecerem em Beirute e no Cairo.
As autoridades tentam ainda revidar. Em 2011 Frezat foi espancado em Damasco, depois de desenhar [o presidente] Assad tentando pegar uma carona com Muammar Kadafe, então ditador da Líbia. Ridicularizar o rei do Marrocos em um desenho pode levar você para detrás das grades. Vários cartunistas foram processados no início deste ano por ridicularizarem o presidente Morsi. "Mas, nosso trabalho vem sendo levado mais a sério pelo público", diz Andeel, pseudônimo de um cartunista do al-Masry al-Youm, um dos principais jornais egípcios.
Resta ainda um tabu a ser quebrado: ridicularizar a religião, ao que se opõem clérigos e políticos islâmicos. E poucos governantes do Golfo foram importunados por cartunistas locais, em vez daqueles que vivem em segurança no exterior. Quando isso acontecer, pode ser que comecem a ter tiques nervosos.
Todas as charges abaixo foram tiradas do artigo da revista The Economist.
Arábia Saudita - As mulheres autorizadas a andar de bicicleta. - Charge de Ali Dilem.
Esta caricatura feita por Doaa Eladl, uma egípcia proeminente, é significativa principalmente hoje, pois se refere à forte influência dos militares na política do país. A legenda no canto superior à direita diz: "O próximo presidente".
"Sequestro - O exército argelino atacou" - Ali Dilem, um argelino, já foi processado mais de 50 vezes por causa de seu trabalho, que é publicado normalmente no jornal Liberté [Liberdade]. O soldado está dizendo a um empregado da BP [British Petroleum] que está morto: "Que bom que você está livre".
Naji al-Ali foi talvez o cartunista mais conhecido no mundo árabe. Foi assassinado em Londres em 1987.
Khalidal-Baih, um cartunista baseado no Qatar, fez esta charge depois que o presidente sudanês Omar al-Bashir ordenou uma suspensão temporária da transferência de petróleo oriundo do Sudão do Sul. A legenda no alto à esquerda -- Bashir "suspende a transferência de petróleo" vindo do Sul ... -- compõe um trocadilho (só compreensível em inglês) com a figura do "mãos ao alto" da figura.
Emad Hajjaj é o cartunista de maior destaque em atividade hoje na Jordânia. Ele provocou furor quando ridicularizou com esta charge uma certa classe de mulheres jordanianas.
Z é um cartunista tunisino que permanece no anonimato. Ele fez esta caricatura do presidente Zine el-Abidine Ben Ali e sua mulher fugindo do país duas semanas antes que eles deixassem realmente o país rumo à Arábia Saudita em janeiro de 2011. [Na charge o presidente diz "adeus, povo ingrato", e seus súditos perguntam "e nós??!!" - O título "cassez vous!" pode ser traduzido por "danem-se!'.]
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