[É de tendência crescente a superposição de atividades empresariais e privadas nas atividades diárias dos empregados. O texto a seguir é extremamente superficial, talvez não havendo até razão para esperar-se algo mais profundo em um jornal voltado para a área de economia e finanças, embora o tema tenha repercussões potenciais nas áreas trabalhista, de gestão, e financeira. O artigo abaixo, publicado no jornal Valor Econômico de hoje, é da autoria de Claus Nogueira Aragão, sócio de Gonçalves, Arruda & Aragão - Sociedade de Advogados. O jornal alerta que "Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor
Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser
responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer
natureza em decorrência do uso dessas informações".]
"O grande desafio é estabelecer o limite entre o privado e o corporativo, num mundo cada vez mais conectado".
A informatização reestruturou o relacionamento das empresas com os seus
empregados, o que, evidentemente, traz consigo reflexos na área
trabalhista. O telefone celular, a internet e, mais recentemente, os
dispositivos móveis, estão obrigando as empresas a reformular suas
políticas de recursos humanos.
Por seu turno, as políticas de utilização dos recursos de informática
precisam se adaptar com a mesma velocidade com que surgem novas
tecnologias e equipamentos. O grande desafio é estabelecer o limite
entre o privado e o corporativo, num mundo cada vez mais conectado.
Questões como a utilização do e-mail corporativo para fins particulares,
monitoramento de e-mails, acesso às redes sociais durante o expediente,
o trabalho à distância e a possibilidade de alcançar um empregado fora
de seu horário de trabalho por telefone ou por e-mail continuam gerando
calorosas discussões não só entre gestores de segurança, TI e de RH, mas
também nos tribunais.
Dessa forma, é essencial que as empresas estabeleçam políticas e códigos
de conduta vinculados ao contrato de trabalho e específicos para a área
de informática, deixando claro ao empregado o que pode e o que não pode
ser feito e para que fins, mitigando, mas não a ponto de tentar evitar,
que algumas dessas questões sejam levadas a deslinde aos tribunais, que
muito têm a contribuir para o aprimoramento das relações de trabalho
ante a informática.
O limite entre o privado e o corporativo começa a ficar mais frágil com o
fenômeno denominado BYOD ("Bring Your Own Device", em português: traga
seu próprio dispositivo), por meio do qual equipamentos como tablets,
laptops e smartphones, pertencentes a empregados, passam a ser usados
para fins corporativos.
O BYOD traz como principais vantagens a familiaridade do empregado com o
dispositivo e a redução de custos para as empresas, que não mais
precisam adquirir tais equipamentos nem promover treinamentos para sua
utilização, que, no fim da linha, ficam a cargo do empregado.
De outro lado, o BYOD demanda consideráveis esforços e recursos em
soluções de segurança, diversificação de tecnologias para atender às
diversas plataformas e, principalmente, na definição de uma política de
utilização que, concomitantemente, atenda às necessidades comerciais das
empresas e garanta o cumprimento da legislação trabalhista de seus
usuários.
Trata-se de movimento que representará uma profunda mudança na cultura
corporativa e que, por ser muito recente, não traz consigo experiências
passadas que possam ajudar no estabelecimento de um plano de ação.
Contudo, é certo que se trata de tema que exigirá pronta atenção das
empresas, pois sua implementação está acontecendo na mesma velocidade da
evolução tecnológica.
A definição de uma política de implementação do BYOD deve ser elaborada
em conjunto pelas áreas de TI, Jurídico e RH, que definirão questões
relacionadas à área técnica-operacional, especialmente no que diz
respeito à compatibilidade de sistemas e plataformas, softwares e de
segurança, e aquelas relacionadas aos direitos trabalhistas.
É fato que a possibilidade de receber e enviar e-mails ou de participar
de videoconferências fora do expediente e nas férias esbarra no direito
de repouso previsto tanto na Constituição Federal de 1988 como na
Consolidação das Leis do Trabalho, podendo causar condenações em
pagamento de horas extras e dano moral.
Faz-se necessário estabelecer regras claras com relação à
responsabilidade dos custos envolvidos (mormente de internet móvel) e ao
monitoramento dos dispositivos dos empregados, tanto para que a empresa
se sinta segura com relação à confidencialidade de suas informações,
assim como para o empregado, no que diz respeito às suas informações
privadas em seu próprio dispositivo.
É preciso definir, também, a situação no momento da rescisão do contrato
de trabalho, pois muitas vezes o empregado carregará, em seu
dispositivo, arquivos, informações e softwares que pertencem à empresa e
que por questões de segurança e de sigilo comercial precisam ser
removidos.
Muitas empresas já implementaram o BYOD de maneira informal (e muitas
vezes sem nem sequer ter consciência disto), ao permitir que seus
empregados, especialmente de alto escalão, utilizem seus próprios
dispositivos para desenvolvimento de seu trabalho, acessem sua rede por
wi-fi ou em casa via VPN [Virtual Private Network = Rede Privada Virtual].
Especialistas na área entendem ser o BYOD um movimento irreversível.
Assim sendo e no que diz respeito às questões trabalhistas, urge
estabelecer medidas que protejam e resguardem interesses de ambas as
partes, definindo direitos, deveres e responsabilidades, vinculando tais
diretrizes ao contrato de trabalho.
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