[O texto abaixo é da autoria de Roberto Pereira d'Araujo (Engenheiro Eletricista, Diretor do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético – ILUMINA) e foi publicado em 25/4 no jornal Valor Econômico. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]
A conta de luz do Sr. Cândido
Roberto Pereira d'Araujo
O senhor Cândido é um consumidor fictício do Rio de Janeiro. Paga sua
conta de luz religiosamente em dia, e, como muitos outros cidadãos, além
de achar a tarifa cara, não consegue entender o setor elétrico
brasileiro, que mais parece um rolo de barbante embaraçado que piora a
cada "puxão".
Ele sabia que as tarifas seriam reduzidas, mas, considerado o tom
teatral dos anúncios, ficou decepcionado quando recebeu sua fatura de
março. Apesar do desapontamento, ele leu que a Lei nº 12.783/13
diminuiria as tarifas por meio de manobras contábeis entre o Tesouro e
Eletrobrás, uma estatal que, segundo o próprio governo, estava cobrando
fortunas por usinas que já tinham sido pagas por todos, ele inclusive. O
senhor Cândido ainda desconfia que paga um preço que não condiz com um
país que tira sua energia principalmente da água. Imaginem sua decepção
se tivesse a curiosidade de examinar outras contas. [O autor, que é aposentado de Furnas, faz uma menção capciosa em relação à Eletrobrás, típica do velho e rançoso ódio freudiano do pessoal dessa subsidiária contra sua holding. Como homem competente do setor consultor da Eletrobrás e ex-chefe do Departamento de Estudos Energéticos e de Mercado de Furnas , ele está cansado de saber qual é a política tarifária e de remuneração de investimentos do setor elétrico estatal. Ele está cansado de saber também que a Eletrobrás sempre foi vítima de fisiologismo político, especialmente do PMDB, de José Sarney et caterva, e sempre fez o que o governo quer e permite, principalmente depois que a doce Dona Dilma foi ministra de Minas e Energia de 2003 a 2005. Dizer que a Eletrobrás cobrava fortunas por usinas já amortizadas -- o que inclui todas as usinas construídas e operadas por Furnas, ex-empresa do autor, várias delas com a chancela direta ou indireta do autor -- foi uma molecagem irresponsável e demagógica da ex-guerrilheira, e ao repetí-la sem ressalva o autor nivela-se à Dona Dilma, o que não enaltece seu currículo.]
Os números da tabela abaixo são os da Light. Mas, apesar de pequenas
diferenças, podem ser repetidos por qualquer cidadão de qualquer Estado
comparando a sua fatura de março de 2012 com a do mesmo mês deste ano.
Os números correspondem a um hipotético consumo de um único megawatt
hora (MWh) realizado pela família.
Segundo informações das suas faturas, o consumo de 1 MWh custava R$
522,30 em 2012. A fatura de março passado mostra o valor de R$ 462,70
para o mesmo MWh. Portanto, um desconto de 11,4%, inferior aos 18%
prometidos. Mas a conta do senhor Cândido tem muitos outros números. Por exemplo, o
quanto a energia, a transmissão, a distribuição, os encargos e os
tributos contribuíram para esse custo final que lhe causou decepção.
Como se pode ver, as parcelas mais importantes aumentaram ou se
reduziram muito pouco. A distribuição, que pesava 22%, agora vai pesar
27%. Os tributos tiveram um recuo insignificante passando de 34% para
32%. O valor da energia consumida não decresceu, muito ao contrário,
passou de 30% para 34%. Os encargos e a transmissão, esses sim, não têm
percentuais importantes, mas caíram de 14% para 7%.
O senhor Cândido ouviu dizer que a Eletrobrás tem suas atribuições
principalmente na geração e transmissão de energia. Portanto, se
considerados apenas esses itens, a redução foi de R$ 11,85 num total de
R$ 179,13, ou seja, 6,6%. O cidadão ficaria ainda mais confuso, se
soubesse que os números oficiais da Eletrobrás, a tal que lhe [sic] explorava,
reconhecem uma perda de receita de 70% em consequência da aplicação da
Lei n º12.783! Ora, mesmo ele se perguntaria: uma redução tão pequena perante um sumiço
de receita dessa ordem? Ficaria desconfiado, mas, continuaria incapaz
de entender o que está por trás dessa confusão.
O que Cândido continuará ignorando é que, segundo reportagem do jornal Valor Econômico (28/03), dois números chamam muita atenção:
1. A
Eletrobrás registrou o Ebitda (resultado antes dos juros, impostos,
depreciação e amortização) em 2012 negativo em R$ 6,173 bilhões.
2. Se fossem expurgados os efeitos da lei, o Ebitda de 2012 atingiria R$ 5,520 bilhões positivos.
A própria Eletrobrás admitiu uma queda de R$ 10 bilhões na receita. Ora,
o consumo total do sistema interligado brasileiro, lugar onde a empresa
exerce seu principal negócio (gerar e transmitir energia) gira no
entorno de 500 milhões de MWh. Portanto, cada MWh consumido tem embutido
um pedaço do "prejuízo" da Eletrobrás. Fazendo as contas, chega-se a R$
20/MWh. Um desses MWh foi parar na casa do senhor Cândido, mas, como só chegou
um pouco mais da metade, outras razões fizeram a tarifa decepcionar.
Vale a pena explicar ao senhor Cândido que a perda da Eletrobrás, que
foi notícia internacional no mercado de capitais, só lhe proporcionou
6,6% de redução na conta da parcela de energia? O que isso importa se o
governo diz que ela é a "grande vilã" das tarifas altas? Vale a pena
lembrar que essa empresa, alguém, algum dia declarou ser a "Petrobrás do
setor elétrico".
[O autor deveria ser mais fiel à verdade e citar a afirmação correta :"O fortalecimento da Eletrobrás foi discutido pelo presidente [o NPA], nesta
quarta-feira (22), em uma reunião com nove ministros sobre
infra-estrutura. Foi mais uma etapa na elaboração do pacote fiscal
destinado a incentivar a economia. O presidente manifestou a intenção
de reforçar o papel da Eletrobrás, quer que ela se consolide cada vez
mais. Para ele, a ‘Eletrobrás tem de ser a Petrobras do setor elétrico’”, disse o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo". E o autor deveria também ser transparente e dar nome aos bois, pois ele sabe quem foi, informando que o autor da afirmativa foi o NPA (Nosso Pinóquio Acrobata, Lula) em novembro de 2006, em um de seus inúmeros surtos de irresponsabilidade demagógica. O mesmo governo petista -- mudou apenas o capataz, do NPA para a supersimpática Dona Dilma -- tratou de aniquilar o setor elétrico estatal (leia-se Sistema Eletrobrás) via MP 579. Vale a pena ler a entrevista de Luiz Pinguelli Rosa e o artigo do próprio autor (Roberto Pereira d\'Araujo.pdf ) sobre os efeitos dessa MP].
Pode ser melhor esperar a conta das térmicas, que, com grande chance,
devem permanecer ligadas o ano todo. Quando receber as contas com a
novidade da "bandeira tarifária", o senhor Cândido vai ficar chocado.
Talvez ele perceba que, no final das contas, a história foi muito mal
contada.
De certa maneira, todos nós somos como o senhor Cândido. Atônitos, mas
complacentes, aceitamos uma inédita intervenção numa tradicional
instituição do Estado como algo normal. Entre tantos problemas de
segurança, transportes, saúde, educação e inflação quem vai se importar
com a Eletrobrás? Pensando bem, talvez o governo conte com a ingenuidade
do senhor Cândido!
Sr. Vasco:
ResponderExcluirUm amigo meu me mandou sua crítica e fiquei surpreso! Acho que você não entendeu a ironia do texto. Eu contra a Eletrobrás????
Estou tentando explicar que a derrocada da ELB provocada pela maluca da presidenta só resultou numa redução de 6,6%...
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