segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Os dois livros que geraram a confusão do Prêmio Jabuti de 2010

O Prêmio Jabuti , tradicional láurea literária do país, foi criado pela Câmara Brasileira do Livro por volta de 1957 e contempla 20 categorias de gêneros literários, entre os quais se inclui o romance. Os concorrentes de cada categoria são julgados por um corpo específico de jurados. À parte dessas categorias há ainda a premiação do Livro do Ano, que envolve diferentes gêneros literários, entre os quais o da ficção e, nesta, novamente está incluído o romance. A grande diferença na escolha do Livro do Ano é que nela votam também representantes do mercado editorial, o que pode fazer com que o melhor de uma categoria não seja eleito o melhor do ano -- isto, aliás, já ocorreu 17 vezes nas 18 últimas edições do prêmio, inclusive em 2010.

Em novembro/2010, quando da divulgação dos prêmios, o livro "Se eu fechar os olhos agora" (Edney Silvestre, Editora Record, 2009) foi eleito o melhor romance, derrotando "Leite Derramado" (Chico Buarque, Companhia das Letras, 2009), mas na escolha do Livro do Ano de Ficção o vencedor foi "Leite Derramado". Apesar dos inúmeros antecedentes, e do fato do regulamento para isso ser conhecido há décadas, essa discrepância de escolhas gerou um tremendo ruído e uma manifesta insatisfação da Editora Record (que decidiu boicotar o prêmio a partir de 2010) e de seu escritor Edney Silvestre. Deselegante e injustificadamente, a Record tentou desqualificar a escolha do livro de Chico Buarque como ilegítima e de conotações políticas (pelo fato de Chico ter apoiado Dilma Rousseff). Edney Silvestre também não soube assimilar a derrota e mostrou-se visivelmente magoado com o resultado.

Resolvi ler os dois livros para fazer meu próprio juízo, e concluí que a decisão foi justa, o livro do Chico é disparado melhor que o do Edney. "Leite derramado" é um monólogo em que um senhor muito velho, num leito de hospital, narra de maneira errática sua vida de membro de uma tradicional família brasileira -- o domínio do uso da linguagem demonstrado por Chico é impressionante.

"Se eu fechar os olhos agora" é um livro muito chato, para não dizer chatíssimo, apesar da trama policial bem armada. O uso de diálogos é exagerado e muito cansativo, resultado certamente da profissão do autor -- Edney Silvestre é jornalista, que já foi correspondente da Globo nos EUA durante 11 anos e atualmente é responsável pelo programa Espaço Aberto Literatura (que, por sinal, conduz muito bem), do canal Globonews, no qual entrevista personalidades do mundo literário do Brasil e do exterior. A esmagadora maioria dos diálogos é feita por dois adolescentes, chatos e aborrescentes como só os adolescentes sabem sê-lo. A impressão final que me ficou é que Edney estruturou seu romance pensando em sua possível adaptação pela Globo ...

Um comentário:

  1. Só agora li esta postagem, e concordo com tudo que foi dito. Anda rolando nas nossas esferas "intelectuais" uma certa pauleira em cima do Chico - cheiro de inveja no ar, tipo: "um cara não pode ser bom em tudo". Uhm, uhm... O livro dele é bem melhor que o outro, mesmo.

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