[Ver postagem anterior. -- O texto abaixo é da autoria de Mônica Tavares e foi publicado hoje no jornal O Globo. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]
Se as usinas termelétricas do país ficarem ligadas ao longo de todo este
ano, para evitar o risco de um racionamento de energia no país, isso
vai encarecer em 15%, em média, a tarifa do consumidor no ano que vem,
considerando a geração de 13 mil megawatts (MW). O impacto é muito maior
do que a alta de até 3% calculada pelo diretor-geral do Operador
Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Hermes Chipp. Isso significa que o
consumidor teria de pagar a mais pela energia R$ 14,4 bilhões em 12
meses, o que anularia, já no ano que vem, a redução média de 20% na
tarifa, sancionada esta semana pela presidente Dilma Rousseff e que
começa a chegar nas contas em março.
[A história, na realidade, é pior do que parece: mesmo antes da crise dos reservatórios, quando açodadamente nossa afável presidente anunciou esse desconto de 20%, o governo já informava que injetaria, via Tesouro Nacional, dinheiro no setor elétrico num montante que para uns seria de R$ 3 bi e para outros de R$ 7 bi para garantir essa redução tarifária. Como o governo é transparente como alabastro, dificilmente o povão saberá quanto efetivamente está pagando "por fora" para ter um desconto de fachada em sua conta de luz.]
O valor a mais pago pelas térmicas representa 16% da receita total por
ano de R$ 90 bilhões dos fornecedores (geradores) de energia. Para
chegar ao resultado, os especialistas do setor calculam a quantidade da
energia gerada pelas térmicas, a capacidade de geração dessas usinas, o
custo médio da energia, o número de meses e horas em que as usinas ficam
ligadas, entre outros fatores.
Em 2001 e 2002, época do racionamento de energia, a fatura foi menor,
entre R$ 12 bilhões e R$ 13 bilhões. Os pagamentos naquela época foram
para contratar o seguro-apagão e para cobrir o endividamento que
geradoras e distribuidoras tiveram com a redução do consumo.
A conta elevada a ser paga pelo consumidor se deve à falta de
transparência no funcionamento do mercado livre a curto prazo, no qual
geradoras e grandes consumidores compram energia. Quando as térmicas de
segurança são acionadas, como está ocorrendo agora, um preço mais baixo
nesse mercado pode gerar prejuízo ao consumidor final. Isso porque o
preço de referência no mercado livre serve para cobrir o seguro que
garante o funcionamento das termelétricas (ESS, ou Encargo de Serviços
do Sistema), que é cobrado na conta de luz. Ou seja, quanto menor o
preço no mercado livre, maior a parcela do seguro que será paga pelo
consumidor.
Para as grandes geradoras de energia, a lógica é diferente. Para elas é
importante que o preço de referência não seja muito alto porque, neste
momento de escassez nos reservatórios, essas empresas precisam comprar
no mercado livre para honrar seus compromissos com as distribuidoras.
Por essa fórmula, as grandes beneficiadas são Eletrobras (com as
hidrelétricas) e Petrobras (que detém as termelétricas).
Analistas cobram transparência nos cálculos
O prejuízo que a fórmula de cálculo do preço no mercado livre pode
trazer para os consumidores foi detectado pela Agência Nacional de
Energia Elétrica (Aneel) em 2007, mas até agora não houve qualquer
alteração nas regras. Em fevereiro daquele ano, o então diretor-geral da
agência, Jerson Kelman, determinou que o ONS realizasse uma licitação
internacional para contratar uma empresa que fizesse um novo modelo de
cálculo, usado para as medições do setor, inclusive da hidrologia.
Em abril do mesmo ano, o então ministro de Minas e Energia, Silas
Rondeau, presidente do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE),
órgão máximo do setor, assinou uma resolução retirando o poder da Aneel
de interferir na questão, levando-o para o conselho. A partir de então, o
CNPE passou a ter a incumbência de modificar os modelos computacionais
do ONS. Especialistas do setor consideram que a medida é ilegal, porque a
legislação determina que cabe à Aneel regular e fiscalizar o setor.
No fim de 2007, o CNPE editou nova resolução, a número 8, assinada pelo
então ministro interino de Minas e Energia, Nelson Hubner, atual
diretor-geral da Aneel, que dividia a conta de custos extras com as
usinas termelétricas com todos os consumidores de energia, inclusive os
residenciais, que até então estavam livres do encargo. Com isso, o custo
de ligar as termelétricas e o risco de inadimplência dessas empresas
passaram a ser de todos.
Em fevereiro de 2008, o Ministério de Minas e Energia criou a Comissão
Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais do
Setor Elétrico (CPAMP). Presidida pelo secretário-executivo do
ministério, Márcio Zimmermann, ela não atualizou o modelo do ONS que
poderia evitar um aumento tão grande da conta dos consumidores no caso
de uso das termelétricas. Analistas criticam o modelo do ONS e cobram
transparência nos cálculos de preço da energia. Procurados, Chipp e
Zimmermann disseram que só poderiam se pronunciar hoje, por problemas de
agenda. Hubner disse “que não quer se posicionar sobre o assunto”.
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