O Lindbergh Farias cara-pintada de 1992 - (Foto: Google).
O senador (desde 2010) Lindbergh Farias - (Foto: Google).
A revista ÉPOCA publicou ontem uma longa história sobre ele, de desvio de dinheiro, que reproduzo a seguir. Detalhe adicional da metamorfose desse político: desde 2001 é filiado ao PT, ao qual aderiu para ser cabo eleitoral do NPA. Presidente da poderosa Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, Lindbergh ostenta, segundo o site Congresso em Foco, o título de campeão de inquéritos no STF - Supremo Tribunal Federal (seriam mais de 15).]
O plenário do Congresso Nacional estava lotado no começo da noite do dia
6 de março. Esbarrando em colegas, o senador Lindbergh Farias, do PT do
Rio de Janeiro,
passou pelo deputado Pedro Paulo (PMDB-RJ) e, dedo em riste, falou
alto: “Vou brigar com os grandes. Não tenho medo das máquinas do governo
e da prefeitura”. Lindbergh tem motivos para se revoltar contra o PMDB,
principal partido aliado do governo Dilma Rousseff
e sigla que controla a prefeitura da capital e o governo do Rio. Desde
que se lançou pré-candidato a governador do Estado, no final do ano
passado, Lindbergh vinha sendo alvo do “fogo amigo” do PMDB – cujo
objetivo é fazer do atual vice-governador, Luiz Fernando Pezão, o
sucessor de Sérgio Cabral.
Agora a briga esquentou, e os golpes verbais deram lugar aos dossiês.
Desta vez, os documentos divulgados não são vazios, como costuma
acontecer com a maioria dos dossiês que circulam nas campanhas. A partir
de material obtido com o PMDB, ÉPOCA fez seu próprio levantamento e
obteve uma série de documentos com denúncias contra Lindbergh. Os papéis
constam de um inquérito a que Lindbergh responde no Supremo Tribunal Federal,
com acusações de corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro
– relativas ao período em que foi prefeito de Nova Iguaçu, entre 2005 e
2010.
A base da investigação são dois depoimentos prestados ao Ministério
Público Estadual (MPE) pela ex-chefe de gabinete da Secretaria de
Finanças de Nova Iguaçu Elza Elena Barbosa Araújo. ÉPOCA obteve cópias
das declarações, prestadas em fevereiro de 2007 e até aqui mantidas sob
sigilo. Elza disse que, logo no início do mandato de prefeito, em 2005,
Lindbergh montou um esquema de captação de propina entre empresas
contratadas pelo município. O valor podia chegar a R$ 500 mil por
contrato. O dinheiro sujo, segundo Elza, chegava à sala da secretaria em
bolsas e maletas trazidas por empresários. Depois as quantias eram
usadas, conforme ela disse, para quitar despesas pessoais de Lindbergh.
Segundo os depoimentos, o esquema ainda bancava as prestações de um apartamento da mãe de Lindbergh, Ana Maria, num edifício em Brasília.
Elza relatou que numa das ocasiões, em 11 de julho de 2005, ela saiu da
prefeitura com R$ 15 mil em dinheiro para pagar uma das prestações do
imóvel. Sobraram R$ 4.380, que Elza disse ter depositado na conta de
Lindbergh. Ela também afirmou que a propina abastecia a conta da empresa
Bougainville Urbanismo, que pertence a Carlos Frederico Farias, irmão
de Lindbergh que mora na Paraíba, terra natal de Lindbergh. A empresa
recebeu, ainda conforme a acusação, quatro depósitos que totalizaram R$
250 mil.
O MPE considerou os depoimentos “homogêneos e ricos em detalhes”. Os
procuradores disseram que receberam documentos de Elza, incluindo uma
planilha, chamada “pendências para Chico”, uma referência ao nome do
então secretário de Finanças de Nova Iguaçu, Francisco José de Souza. A
lista traz “diversos números de contas bancárias, valores de dívidas e
pagamentos que deveriam ser efetuados por Chico em favor do prefeito e
seus familiares”, diz o MPE. Com base no material, os procuradores
abriram uma investigação e pediram, em julho de 2008, a quebra de sigilo
bancário e fiscal de Lindbergh, sua mulher, sua mãe, dois irmãos e sete
empresas da família, incluindo a Bougainville.
O Tribunal de Justiça (TJ) autorizou a quebra de sigilos relativa ao
período de junho de 2004 a junho de 2008. Exatamente um ano depois, em
2009, o TJ estendeu a medida aos cartões de crédito e aplicações em
Bolsas de Valores. ÉPOCA obteve cópias das duas decisões relativas às
quebras de sigilo, que também permaneciam inéditas. De acordo com o
desembargador Alexandre Varella, os extratos dão sustentação às
acusações de Elza. Varella afirmou que o pedido do MPE não tinha como
base apenas os depoimentos da ex-funcionária. “Foram inquiridas
testemunhas que confirmaram a presença de pessoas por ela mencionadas na
referida prefeitura”, como os portadores de malas com dinheiro.
Outra decisão judicial revelou indícios de corrupção em contratos de
pelo menos uma empresa. Elza dissera que a 7R Comércio de Materiais de
Escritório, detentora de cinco contratos com a prefeitura que somavam R$
1,1 milhão, recebia pagamentos, mas não entregava as mercadorias, entre
elas o gás de cozinha para preparar merenda escolar. Segundo ela, a empresa era ligada a Fausto Severo Trindade,
ex-secretário de Planejamento e atual assessor de Lindbergh. Ao estender
a quebra de sigilo aos cartões de crédito de Lindbergh, o desembargador
Nildson Araújo da Cruz destacou que a 7R “não tinha qualquer empregado,
só vivia de celebrar contratos com o município de Nova Iguaçu e, além
de não ter outros clientes, não tinha autorização para vender gás”. Quem
entregava os botijões era outro fornecedor, mas a emissão da nota
fiscal era feita em nome da 7R. Pelo relato do desembargador Cruz, a 7R
aparentava ser uma empresa-fantasma.
A 7R foi aberta em setembro de 2005, com endereço na periferia de
Niterói. Dois meses depois de sua criação, já assinava seu primeiro
contrato com o município de Nova Iguaçu, no valor de R$ 530 mil, para
fornecer gás a preços superfaturados, segundo uma auditoria do Tribunal
de Contas do Estado. A 7R encerrou as atividades em junho de 2008, com a
investigação do MPE já em curso. O material da quebra de sigilo, entre
extratos de bancos e declarações de Imposto de Renda, está em 35
volumes, tem 7 mil páginas e chegou ao STF no fim de 2011. Em fevereiro
de 2012, o ministro Gilmar Mendes decidiu que a legalidade das provas
até agora produzidas será analisada pelo Supremo.
Os peemedebistas compilaram outras acusações contra Lindbergh.
Documentos destacam que a Vitrine Empreendimentos, cujo sigilo foi
quebrado, conseguiu do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social um financiamento de R$ 10 milhões para a construção de um hotel
em Natal. A empresa, a exemplo da Bougainville, pertence a Carlos
Frederico, irmão de Lindbergh. O dinheiro saiu em 22 de novembro de
2011. Duas semanas antes, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho,
participara de uma audiência no Senado convocada a pedido de Lindbergh
para discutir a política industrial do banco.
Lindbergh reagiu aos ataques do PMDB. “Ao contrário deles, não sou
patrimonialista. Não tenho mansão incompatível com meus rendimentos. Se
eles pensam que vão me intimidar com dossiê, estão enganados. Vou ser
candidato com tudo aberto, minhas contas, meu patrimônio. Resta saber se
eles podem fazer o mesmo”, disse Lindbergh. Indiretamente, ele se
refere ao governador Sérgio Cabral, principal líder do PMDB no Estado e
dono de uma casa em Mangaratiba, na Costa Verde fluminense, avaliada em
R$ 1,5 milhão. Cabral nega qualquer irregularidade na compra do imóvel,
que declarou à Justiça Eleitoral por R$ 200 mil. “O que fizeram comigo
foi uma violência, uma covardia”, afirma Lindbergh. “Quebraram o sigilo
de toda a minha família e até de meu pai, morto há mais de 17 anos.
Fizeram uma devassa em minha vida e de minha família. Não vai aparecer
nada.” Ele disse que ofereceu a abertura de seus sigilos em 2009, mas
que, na época, a Justiça já tomara a decisão de quebrá-los.
Os advogados de Lindbergh disseram que o apartamento em Brasília citado
por Elza chegou a ser de propriedade da mãe de Lindbergh – mas, na época
dos pagamentos relatados, o imóvel pertencia a Francisco José de Souza,
então secretário de Finanças de Nova Iguaçu. Os defensores negam
qualquer esquema de corrupção, repasse de dinheiro às empresas da
família e dizem que a 7R prestou todos os serviços contratados.
Procurado por ÉPOCA, Carlos Frederico, irmão de Lindbergh e sócio da
Bougainville e da Vitrine Empreendimentos, disse que a Bougainville
jamais recebeu dinheiro público. “A acusação é mentirosa. Nunca tive
qualquer relação com a prefeitura de Nova Iguaçu”, afirmou. A Vitrine
Empreendimentos, segundo ele, obteve legalmente créditos no BNDES. O
banco informou que o pedido de financiamento foi feito em julho de 2010 e
“submetido aos trâmites usuais do BNDES, obedecendo a um processo
rigoroso que passa por órgãos colegiados”. Também disse que a liberação
dos recursos não guarda relação com a audiência no Senado, convocada
também por outros cinco senadores, além de Lindbergh.
O lado peemedebista parece que não dará trégua ao desafeto petista. O
presidente do partido no Rio, Jorge Picciani, dá o tom da agressividade.
Em entrevista à imprensa no fim do mês passado, ele chamou Lindbergh de
covarde, moleque e carreirista. Disse ainda que ele “destruiu Nova
Iguaçu”. Lindbergh já decidiu que partirá para o contra-ataque. A guerra
já começou – e começou para valer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário