[A redução acentuada das populações de abelhas em várias partes do mundo vem assustando e preocupando cientistas e governos, que buscam encontrar as razões para isso e meios para eliminar ou minimizar o problema. Já fiz três postagens sobre o assunto: uma em janeiro de 2011, outra em setembro de 2011 e uma terceira em março de 2012. Agora, surgem resultados de novos estudos que indicam que o problema não se limita apenas às abelhas e envolve também outros insetos polinizadores. É o que nos conta a notícia do jornal espanhol El País, numa reportagem de Javier Sampedro que traduzo a seguir. E a humanidade continua opaca e insensível aos avisos do planeta Terra.]
O despovoamento das colmeias, uma doença que elimina a maior parte de uma colônia de abelhas, já vem há uma década angustiando os apicultores de toda a Europa e de metade dos EUA, e não têm sido poucas as pesquisas sobre os parasitos, vírus, bactérias e condições ambientais que castigam esses insetos domésticos. Dados recentes, entretanto, indicam que esses trabalhos miraram o alvo errado. Não é que estejam mal feitos, mas sim que o problema realmente grave está em outra área: nos insetos polinizadores silvestres, que são os responsáveis por "administrar" a maior parte dos cultivos essenciais para a alimentação mundial e que estão sofrendo mais que aquelas suas parceiras domesticadas.
Um consórcio internacional coordenado por Lucas Garibaldi, do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas de San Carlos de Bariloche, Argentina, revelou em uma pesquisa volumosa sobre 41 das principais plantas de cultivo nos cinco continentes que não são as abelhas mas os insetos silvestres -- muitos deles também abelhas -- os que polinizam essas culturas com maior eficácia. O trabalho dos polinizadores silvestres produz o dobro de frutos que o de suas colegas "assalariadas". Esta é a melhor forma de medir o rendimento desses insetos: o fruto é o resultado direto da polinização de uma flor, e as sementes, o indireto.
A conclusão principal do macroestudo é que, apesar do fato de que as colmeias dos apicultores podem ajudar na polinização dos cultivos, curá-las de suas enfermidades pode ser uma tarefa demasiado cara. Ainda que consiga nisso um êxito de 100% -- e, na realidade, nos aproximamos mais do outro extremo da escala -- a apicultura não conseguirá nunca cobrir a baixa de polinizadores de campo aberto, se esta vier a ocorrer. E o pior é que já há sinais disto.
"A sobrevivência humana depende de muitos processos naturais, ou serviços dos ecossistemas, que não costumam ser contabilizados nos estudos de mercados", escrevem Garibaldi e seus colegas em artigo na revista Science [ver aqui]. "A degradação global desses "serviços" empobrece a capacidade da agricultura de satisfazer a demanda de uma população humana cada vezmais numerosa e com mais recursos". A polinização pelos insetos silvestres é um paradigma entre esses serviços ecossistêmicos, e um dos mais vulneráveis, segundo os cientistas do consórcio. Não apenas a abundância, mas também a diversidade desses trabalhadores "expontâneos" está declinando em todos os tipos de campos de cultivo.
Outra pesquisa, de Laura Burkle e de seus colegas nas universidades de Washington, Montana e Illinois, publicada no mesmo dia na revista Science, mostra um bom exemplo dos processos implicados nesse empobrecimento geral. Os pesquisadores aproveitaram os registros históricos sobre interações planta-polinizador particularmente minuciosos no estado de Illinois, que remontam ao final do século 19. O resultado mostra que o "serviço" de polinização silvestre não fez mais do que diminuir desde então, tanto em quantidade como em qualidade.
A principal razão dessa perda, concluem os pesquisadores, é o desaparecimento ou erradicação de metade das abelhas silvestres que predominavam na região no século 19, ou talvez desde há 10.000 anos. Outro fator é a mudança climática, que defasou a temporada de floração dos períodos de atividade máxima das abelhas. Este é, porém, exatamente um dos inconvenientes que poderiam ser evitados se as espécies de abelhas fossem mais diversificadas. A variedade garante que haja pelo menos uma espécie para cada temporada -- ou para cada imprevisto causado pela criatividade humana.
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