Levantamento feito pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados comprova que o governo vem atrasando o repasse de recursos, em valores consideráveis, para o pagamento do seguro-desemprego e o abono salarial. Em dezembro, o atraso foi de R$ 1,56 bilhão e, em fevereiro, de R$ 1,48 bilhão. Em março e abril, houve pequenas insuficiências de recursos transferidos pelo Tesouro.
Em maio, o atraso voltou a crescer, atingindo R$ 443 milhões. Em junho, o governo pode ter pago os débitos anteriores. Não é possível saber, advertiu a consultoria, o que aconteceu em julho, pois o Tesouro ainda não divulgou o seu resultado no mês passado.
Gráfico: Valor Econômico
O cálculo foi feito comparando as ordens bancárias emitidas pelo Tesouro em determinado mês para o pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial e a despesa efetiva registrada nas contas da União com esses dois benefícios. Quando essa diferença é negativa, significa que o Tesouro não pagou no mesmo mês todas as ordens bancárias que emitiu. Ou seja, parte do pagamento do gasto foi postergado ou "pedalado" para o futuro, como se diz na área técnica. Quando isso ocorre, é a instituição financeira responsável pelo pagamento dos benefícios que arca com a diferença, pois os trabalhadores não podem ficar sem receber os recursos.
No caso do seguro-desemprego e do abono, a instituição financeira responsável pelo pagamento dos benefícios é a Caixa Econômica Federal. Ao não repassar todos os recursos devidos em cada mês, o Tesouro reduz as suas despesas e melhora artificialmente o seu resultado primário. Com a ajuda da instituição financeira responsável pelo pagamento, no caso, um banco estatal.
Segundo a Consultoria de Orçamento, até novembro de 2013 as ordens bancárias para pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial eram emitidas e pagas, razoavelmente, dentro do próprio mês. Em dezembro de 2013, contudo, o Tesouro postergou o pagamento de R$ 1,56 bilhão do seguro-desemprego e do abono salarial para janeiro. Com esse expediente, melhorou o superávit primário do ano passado. Com a ajuda financeira da Caixa.
A consultoria advertiu que não é possível afirmar se o total pago pelo Tesouro, independentemente do mês de impacto no seu caixa, é suficiente para fazer frente ao total de benefícios pagos pela Caixa no respectivo mês. A análise que fez, ressaltou a consultoria, restringe-se à diferença entre as ordens bancárias emitidas e a despesa efetiva registrada.
Em seu blog na internet, o economista Mansueto Almeida colocou ontem uma informação - que disse ter obtido com fontes no governo federal- segundo a qual, de que de janeiro a maio deste ano, o Tesouro atrasou o repasse de recursos para o pagamento do programa Bolsa Família em quatro meses. Mansueto publicou uma tabela mostrando que em todo o ano passado, o governo atrasou o repasse dos recursos em apenas quatro meses, o mesmo ocorrendo em 2012. Em 2011, não houve atraso. Os benefícios desse programa também são pagos pela Caixa.
Ontem, em Porto Velho (RO), a presidente Dilma Rousseff disse discordar da avaliação de que o Tesouro esteja adiando repasse de recursos ao Banco do Brasil para pagamento de subsídios concedidos no crédito agrícola, com a finalidade de elevar o superávit primário. "Meu querido, eu não concordo com essa análise. Não concordo, não concordo. Sinto muito", disse a presidente ao ser questionada reiteradamente sobre o assunto.
O Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, revelou na segunda-feira que o balanço do BB, referente ao segundo trimestre, registrou crédito a receber do Tesouro de R$ 7,944 bilhões. O dinheiro diz respeito à equalização de taxas de juros da safra agrícola. O valor quase dobrou em relação aos R$ 4,158 bilhões registrados há um ano, na demonstração financeira de junho de 2013.
Tesouro pode por Caixa em apuros
Ao utilizar recursos próprios para pagar benefícios sociais, a Caixa Econômica Federal pode ter cometido uma infração às leis de Responsabilidade Fiscal (LRF) e do Colarinho Branco. Isso teria ocorrido porque o Tesouro Nacional tem retardado a liberação de recursos suficientes para pagamento de despesas como seguro-desemprego, abono salarial e benefícios do Bolsa Família.
Se o procedimento for considerado um operação de crédito, caracteriza-se crime, porque a LRF proíbe que um banco estatal faça empréstimos a seu controlador. Os recursos da Caixa oferecem folga ao Tesouro Nacional para fechar suas contas e atingir o superávit primário previsto.
Já o Banco Central avalia se incluirá nas estatísticas fiscais esses créditos detidos por bancos públicos e privados, sobretudo a Caixa, perante o Tesouro. Está em jogo a transparência das contas públicas, já que o governo estaria se endividando sem os devidos registros estatísticos.
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