terça-feira, 15 de outubro de 2013

Esperanto: simples, lógico e fadado ao fracasso

[O artigo traduzido abaixo foi publicado na revista The Economist de 26/9. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]

 Saluton!  Ĉu vi parolas Esperanton? - (Foto: AFP/Fonte: The Economist).

É provável que você não fale Esperanto, simplesmente. Mas, alguns leitores das duas últimas colunas -- sobre o dilema da multiplicidade de idiomas na Europa e porque impor o inglês por toda a Europa era uma ideia furada -- apresentaram o argumento do Esperanto. Numa época em que cada vez mais países precisam comunicar-se entre si, por que não deveriam a Europa ou o mundo aderir à língua internacional simples inventada por Ludwig Zamenhof em 1887?

Pessoas estranhas ao tema tendem a zombar do Esperanto como sendo uma perda de tempo idealista. Esperantistas rebatem essa crítica asperamente: com algo entre poucas centenas de milhares a 2 milhões de estudantes, o Esperanto é de longe a mais exitosa língua inventada no mundo.  Se isso soar tão estranho como "a maior banda de klezmer da Finlândia" [klezmer é um gênero de música não-litúrgica judaica], não deveria ser assim. O Esperanto se expandiu mais que alguns concorrentes.  Sonhadores têm inventado línguas durante séculos, desde a Lojban (baseada na lógica de predicado) à Ládaan (desenhada para esposar o feminismo) [a Láadan é uma língua artificial criada por Suzette Haden Elgin em 1982 para testar a Hipótese Sapir-Whorf, especificamente para determinar se o desenvolvimento de uma língua focada em expressar as opiniões das mulheres poderia moldar uma cultura]. Mas, línguas como Klingon, Elvish, Dothraki, Navií e suas aparentadas, criadas para entretenimento popular,  são as únicas línguas inventadas que podem exibir quase o entusiasmo despertado pelo Esperanto.

O Esperanto permanece no topo da pirâmide. A Wikipédia Esperanto tem cerca de 186.000 verbetes, mais do que o Hindi e o Hebreu, e algo como 87.000 usuários, disparada a maior participação entre as línguas inventadas. Pessoas que falam Esperanto se encontram também fora da Web em convenções frequentes para discutir as perspectivas da língua, fazer amigos ou se enamorar. Um serviço esperantista de compartilhamento de moradia, o Pasporta Servo, gaba-se de contar com 1.000 casas em 90 países, nas quais esperantistas podem ficar de graça com seus parceiros. A prazenteira e jovial energia da comunidade esperantista é retratada por Arika Okrent em seu livro "In the Land of Invented Languages" ["Na Terra das Línguas Inventadas"].  O orgulho dos esperantistas não é totalmente desprovido de fundamento. 

Um detalhe que está por trás do sucesso do Esperanto é obviamente sua simplicidade. Zamenhof  idealizou-o para ele se propagar. Suas raízes derivam das principais línguas europeias. Sua gramática é completamente regular (os nomes terminam em "o", os adjetivos em "a", os advérbios em "e", os plurais em "j", etc). Esperantistas são entusiasmados por ensinar: inscreva-se no Lernu! e você encontrará não apenas aulas de graça e de qualidade decente, mas também instrução gratuita vinda de pessoas experientes no idioma.  Há uns poucos falantes de Esperanto realmente "nativos", talvez cerca de mil pessoas -- muitos, filhos de pais idealistas, têm ouvido Esperanto desde o berço, mas Arika descreve apenas um, Kim Henriksen, que tem no Esperanto seu idioma predominante para se expressar. 

Dito isso, e tendo sido alertado por Arika de que "não existe nada pior do que ser ouvinte de um catequisador de Esperanto", Johnson [um colunista fictício da The Economist] tem que confessar suas dúvidas. Provavelmente, o Esperanto jamais se tornará a língua franca mundial. E por que não? Bem, uma das razões é simples: ele não conseguiu isso em quase 130 anos. O Esperanto não é tão velho quanto a The Economist [cujo primeiro exemplar foi publicado em 2 de setembro de 1843], mas é mais velho que, digamos, a Noruega [que se separou da Suécia em 1905] e a Universidade de Stanford [que abriu suas portas em outubro de 1891].  Mas, apesar disso, permanece de pouco uso.

Isso se deve em parte ao fato de que uma língua, mais do que qualquer outra ferramenta, se beneficia do compartilhamento por grupos de pessoas. Quanto mais pessoas falam uma língua, mais desejada ela se torna. Esta é a razão pela qual as pessoas que falam Esperanto exageram com o número mais alto possível a quantidade de de membros para sua comunidade, na esperança de que outros venham a se juntar a eles para falar Esperanto com mais gente.

Mas, além de números expressivos de falantes, as pessoas aprendem uma língua com o objetivo de desfrutar uma cultura humana vívida e real. Isto não deixa o Esperanto avançar. Se procurar na Internet "pessoas famosas que falam Esperanto" ("esperantistas"), você encontrará a lista da Wikipédia. Muitos desses não são exatamente famosos, mas um se sobressai: J. R. R. Tolkien.  Esse romancista -- e inventor de língua -- aparentemente fez uma breve incursão pelo Esperanto.  Mas, depois, escreveu a um leitor dizendo: "Volapük, Esperanto, Ido, Novial, etc, etc, estão mortas, mais mortas do que línguas antigas fora de uso porque seus autores nunca inventaram quaisquer lendas em Esperanto".

Por "lendas" podemos entender, de maneira mais ampla, "cultura". As pessoas podem aprender inglês, alemão ou chinês para conseguir um trabalho. Mas, elas aprendem línguas para vivenciar também experiências em viagens, comida, filmes, música e literatura. (...) A comunidade esperantista se orgulha de seu respeito por culturas existentes.  O Esperanto destina-se a ser, no mundo, a primeira opção para um segundo idioma de modo a proteger a diversidade, não para substituí-la.  Assim, para ficar motivado a aprender o Esperanto, você tem que estar motivado não por uma cultura viva e arejada mas por um ideal de harmonia internacional.  Esse ideal tem que competir com a comida francesa, a moda italiana, a música brasileira, a vida noturna espanhola, etc.

Talvez, se algumas celebridades deslumbrantes se tornassem fluentes nele, o Esperanto adquirisse algum toque de classe. Seria certamente interessante se algum país ou território alguma vez fizesse um esforço sério para fazer do Esperanto sua língua, como uma vez uma minúscula fatia da Bélgica quase fez.  Até esse (remoto) dia, as línguas vivas reinarão soberanamente -- e, especialmente, a língua viva que teve a chance de desempenhar o papel desejado pelo Esperanto de se tornar o auxiliar mais popular do mundo, o inglês. Os apaixonados pela diversidade de línguas talvez prefiram a sugestão recente de Johnson de que cada criança europeia aprenda pelo menos duas línguas estrangeiras. Esta parece ser uma aposta melhor que o sonho nobre do uso do Esperanto, que nunca se tornou realidade e provavelmente nunca se tornará. 

[Na citada sugestão de Johnson comenta-se o fato incômodo de que os 28 países da União Europeia falam 23 idiomas -- a figura abaixo é um pálido retrato disso.


Uma visão incompleta da diversidade linguística da União Europeia - (Foto: Alamy/Fonte: The Economist).]




Um comentário:

  1. Verdade, quando comecei a ler sobre o esperanto, como não conhecia o que seria as conlangs etc, fiquei fascinado em primeira instancia, porém ao longo do tempo, vi situações e falhas no idioma e na adoção do mesmo em qualquer nível.

    Acredito que é interessante haver um idioma suporte, que ao meu ver pode ser que, um dia o Lojban possa se tornar esse suporte, já que não possui ambiguidade, é estruturado em logica, tem apoio computacional e pode ser usado de outras tantas formas a mais que o esperanto, já que foi projetado de maneira eficiente.

    Mas sim devemos ficar no idioma popular da moda mesmo, e em mais alguns dois, e quem sabe um dia Lojban ( já que em meios técnicos, teria capacidade de fazer o que o esperanto não tem.)

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