Até aí morreu Neves. Eis que, de repente, esse Instituto resolve fazer uma pesquisa sobre violência contra as mulheres -- "Tolerância social à violência para as mulheres". Uma pesquisa como essa é sempre justificável e meritória, desde que feita por alguém do ramo. O difícil é encaixar esse tipo de pesquisa no perfil do Ipea.
O resultado da pesquisa, divulgado oficialmente pelo Ipea, foi assustador e revoltante -- 65% dos entrevistados teriam dito que "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas" -- e repercutiu enormemente aqui e lá fora. Como um rastilho de pólvora, detonou-se no país uma campanha feminina do "não mereço ser estuprada".
O resultado da pesquisa foi divulgado pelo Ipea no dia 27 de março de 2014. Na sexta-feira, 4 de abril de 2014, o mesmo Ipea informou ao país que o resultado publicado estava errado, a porcentagem não era de 65% e sim de 26% -- aí, o Instituto aqui dentro virou piada e lá fora o Brasil foi exposto ao ridículo. Como disse a Veja, "um erro de quase 40 pontos percentuais é uma lambança inaceitável para o mais simplório dos institutos de pesquisas, quanto mais para um órgão ligado ao governo. Após o reconhecimento do erro, o diretor de Estudos e Políticas Sociais do Ipea, Rafael Osório, pediu demissão. Mas o estrago na imagem do Brasil está feito. A divulgação dos dados errados teve enorme repercussão. Deu origem a uma campanha – #eunãomereçoserestuprada – que em poucas horas viralizou nas redes sociais e foi parar em alguns dos principais veículos da imprensa internacional, como o jornal americano Washington Post e a rede britânica BBC. Neles, o Brasil foi retratado como um país onde a maioria das pessoas tolera o abuso sexual e culpa suas vítimas".
Vejam graficamente a lambança:
Fonte: site G1 Brasil
Como nada acontece de graça e à toa neste país (e alhures), principalmente em governos petistas, uma olhadazinha na história recente do Ipea ajuda a entender porquê ele se meteu a fazer uma pesquisa sobre tema que não é de sua área. Fazer pesquisa fora de seu escopo envolvendo a população feminina, num ano eleitoral de um governo presidido por uma mulher candidata à reeleição é coisa de instituição politiqueira baba-ovo, não de uma entidade séria.
No segundo governo do NPA (Nosso Pinóquio Acrobata, Lula), o Ipea foi transferido do ministério do Planejamento para o Palácio do Planalto e passou a tratar rotineiramente de temas bem diferentes da pesquisa econômica prevista em sua sigla. Com a ambição declarada de orientar políticas públicas, estudos produzidos pelo instituto não raro assumem um tom militante -- e a pesquisa sobre "tolerância social à violência contra as mulheres" é um exemplo. Em outras palavras, o Instituto tornou-se mais um órgão público "aparelhado" pelo PT.
No Planalto, o instituto passou a ser alvo de disputa política. Sob o governo do NPA, o Ipea foi presidido pelo petista Marcio Pochmann; no governo Dilma, a partir de um entendimento com o PMDB, o posto passou a Marcelo Neri, estudioso da queda da pobreza e do impacto do Bolsa Família. O país continua uma imensa capitania, dividida entre PT e PMDB.
Em artigo de 04/4 ("Uma ferida grave para a credibilidade do Brasil") de Juan Arias, seu correspondente no Brasil, o prestigioso jornal espanhol El País comenta o sério dano feito pelo erro do Ipea na credibilidade e na imagem social e humana do nosso país. Arias repete a pergunta de Reinaldo Azevedo, colunista da Folha de S.Paulo: com tantos problemas como os que estão chovendo sobre este país, em que está em jogo inclusive a credibilidade de uma empresa de prestígio mundial como Petrobras, era tão urgente que uma instituição do Governo realizasse uma sondagem sobre as saias curtas das mulheres e o que elas podem provocar nos homens?
Como em tantas outras nesses 11 anos petistas, essa pergunta ficará sem resposta. Resta nos indignarmos como a cidadã abaixo:
(Foto Google)
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