Após 17 horas de negociações, em 13/7/2015 os líderes da zona do euro chegaram por unanimidade a um acordo para um terceiro plano de resgate para salvar a Grécia. Esse pacote pode chegar a 86 bilhões de euros em três anos. Os credores, no entanto, exigem que Atenas aprove novas leis nas próximas 48 horas, obrigando o país a aplicar as medidas prioritárias exigidas em troca do resgate. Como disse antes, esse é um acordo de perdedores. Alexis Tsipras recuou de suas posições de campanha eleitoral, o que configura mais um estelionato eleitoral, e por isto mesmo a situação não é tranquila. O parlamento grego pode derrotar Tsipras e a UE, e tudo volta a um novo imbróglio ampliado.
Economistas dizem que a própria Grécia foi o primeiro país a dar calote de forma registrada, no ano 377 antes de Cristo, quando uma dezena de polis - cidades gregas - decidiram não cumprir com suas obrigações financeiras. Desde então, o destino financeiro dos gregos tem sido cíclico: deixaram de pagar suas dívidas em várias ocasiões.
Considerando-se uma moratória como uma crise de dívida externa produzida por instabilidade política, guerras e revoluções, historiadores econômicos consideram que o pior devedor da história é a Espanha. O país teve 14 crises relacionadas com compromissos financeiros desde 1800, segundo estudo compilado por Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart, da Universidade de Harvard, e outros investigadores como o economista Miguel Ángel Boggiano, da Universidad de San Andrés, em Buenos Aires.
Boggiano disse que, nesse ranking, default e reestruturação são considerados fenômenos similares.
Os países que mais deram calote | |
---|---|
Países | Calote ou reestruturações |
Espanha | 14 |
Venezuela, Equador | 11 |
Brasil | 10 |
França, Costa Rica, México, Perú, Chile, Paraguai | 9 |
Argentina, El Salvador, Alemanha (incluindo Prússia, Hesse, Schleswig-Holstein e Vestfália) | 8 |
Colômbia, Uruguai, Portugal | 7 |
EUA, Bolívia, Turquia, Rússia, Grécia, Império Austro-Húngaro | 6 |
Nigéria | 5 |
O não-pagamento de cerca de US$ 95 bilhões pela Argentina em 2001 é considerada por economistas como Jill Hedges como o maior default soberano da história.
Entre os diversos problemas consideráveis gerados pela crise grega estão o afloramento e/ou o agravamento das divisões entre países da zona do euro. A reportagem que traduzo a seguir, de Fabrice Nodé-Langlois, foi publicada pelo jornal francês Le Figaro. O texto ajuda a conhecer os bastidores da decisão de se dar à Grécia um terceiro plano de resgate . O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]
No sábado, 11/7/2015, o Eurogrupo caminhou para a "confrontação"- (Foto: Olivier Hoslet/AP)
Contrariando os esforços de François Hollande para assegurar a manutenção de Atenas na zona do euro, Angela Merkel e seus aliados exigiam domingo (12/7/2015) à noite medidas de Alexis Tsipras, antes de discutir um terceiro plano de ajuda europeu aos gregos.
Se não devesse existir senão um único ponto de convergência entre todos os participantes desse novo fim de semana de intensas negociações em Bruxelas sobre o destino da Grécia, esse foi de que as trocas de argumentos terão sido "extremamente duras, até mesmo extremamente violentas", segundo um participante da reunião fechada de ministros no sábado.
Os chefes de Estado e de governo dos 19 países da zona do euro prosseguiam suas discussões tarde da noite no domingo, após intercambiarem as informações de seus ministros de finanças. Estes últimos haviam disputado uma maratona de 14 horas na eurozona, interrompida pela noite. Praticamente seis meses depois da vitória eleitoral do líder da esquerda radical grega Syriza, Alexis Tsipras, a confrontação entre Atenas e seus credores devia chegar a um fim. O que estava em jogo era salvar a Grécia de uma falência iminente, ou deixá-la sair da zona do euro -- a famosa Grexit -- e mergulhar no desconhecido.
François Hollande preveniu ao chegar a Bruxelas: "O que está em jogo não é somente a Grécia, o que está em jogo é a Europa. A França fará de tudo para chegar a um acordo nesta noite". À sua frente, o tom de Angela Merkel era outro: "Haverá discussões duras, e não haverá acordo a qualquer preço".
A sequência havia, no entanto, começado sob bons auspícios. Após a adoção das últimas propostas de reformas gregas pelo parlamento de Atenas, na sexta-feira, a troika [União Europeia (UE), Banco Central Europeu (BCE) e o FMI] as haviam acolhido de modo "positivo". Logicamente, já que essas reformas visavam a sanear o orçamento grego (aumento do IVA - Imposto sobre Valor Agregado, aumento da idade mínima de aposentadoria, criação de uma autoridade fiscal independente, entre outras medidas), elas retomavam em grande parte as exigências europeias do 25 de junho, exatamente a prescrição austera rejeitada por 61,3% dos votantes gregos no dia 5 de julho.
Mas, no sábado, o Eurogrupo caminhou para a confrontação, nas palavras de Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu, convidado para a reunião. Na linha de frente do núcleo duro, a Alemanha e a Finlândia. Berlim considerava insuficientes as medidas de Atenas, argumentando principalmente que a situação econômica da Grécia "havia se deteriorado consideravelmente desde vários meses". Quanto ao governo finlandês, ele se opunha a um novo plano de ajuda financeira, que não passaria pela barreira de seu parlamento. Na realidade, "uma parte dos ministros tinha claramente na cabeça a ideia de que a melhor solução era a saída [da Grécia] da zona do euro", comenta um participante desse enfrentamento. Segundo essa fonte, Mario Draghi não gostou que a opinião da troika não fosse respeitada.
"Um plano muito ruim", avaliam os gregos
Chefiada pelo novo ministro das Finanças, o muito policiado Euclide Tsakalotos, a delegação grega ao Eurogrupo multiplicou esforços para dar garantias de seriedade. Tratava-se de restaurar a confiança e a credibilidade, duramente deterioradas entre os parceiros. A Grécia se comprometeu a fazer votar leis em um prazo recorde -- antes de 15 de julho! -- imposto pelos credores sobre as principais reformas [ver aqui a lista destas reformas].
O Eurogrupo finalmente produziu um texto, do qual os chefes de Estado deveriam eliminar os últimos pontos de divergência. Uma medida, entre as colocadas sobre a mesa, é doravante considerada indispensável pela Alemanha. Trata-se de um fundo que geriria os ativos gregos a serem privatizados. O projeto de acordo menciona 50 bilhões de euros. Uma cifra muito exagerada segundo Martin Schulz, tendo em vista o valor dos bens suscetíveis de serem privatizados. Esses ativos seriam postos sob arresto ou embargo judicial pelos credores, a fim de resgatar a dívida. Uma perspectiva humilhante para o governo de Tsipras, que se fez eleger prometendo escapar da tutela da troika [Este fundo será estabelecido na Grécia e gerido pelas autoridades gregas sob a supervisão das instituições europeias pertinentes]. Por volta das 22h do domingo, um delegado grego qualificava de "muito penosas" as medidas do Eurogrupo. Os chefes de Estado tentavam achar um meio-termo, especialmente sobre o tema muito sensível desse fundo.
Em troca dessas garantias tangíveis, os chefes de Estado esperavam dar mandato à Comissão e ao Eurogrupo para que se abrissem negociações sobre um terceiro plano de ajuda à Grécia. Esse sinal político forte permitiria ao BCE aumentar sua injeção de recursos financeira e contínua aos bancos gregos desde segunda-feira. A Grécia batalhava para que fosse mencionada a reestruturação de sua dívida no documento final.
A negociação do novo plano de resgate, cujo montante é quantificado pelo Eurogrupo entre 74 e 86 bilhões de euros (dos quais uma parte destina-se ao resgate da dívida dos bancos) poderia durar até o final de julho, explicou uma fonte próxima às negociações. Vários parlamentos, entre os quais o da Alemanha e o da Finlândia, terão que autorizar essas tratativas. Um prazo um pouco longo, avalia uma fonte grega, tendo em vista a situação crítica dos bancos e do Tesouro gregos. Uma "ponte" financeira estava sob análise para permitir à Grécia escapar do calote frente ao BCE no dia 20 de julho.
No final da noite de domingo, a possibilidade de um fracasso não estava apesar de tudo descartada. O documento do Eurogrupo previa explicitamente o "final ruim", ou seja a Grexit.
Mas, no sábado, o Eurogrupo caminhou para a confrontação, nas palavras de Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu, convidado para a reunião. Na linha de frente do núcleo duro, a Alemanha e a Finlândia. Berlim considerava insuficientes as medidas de Atenas, argumentando principalmente que a situação econômica da Grécia "havia se deteriorado consideravelmente desde vários meses". Quanto ao governo finlandês, ele se opunha a um novo plano de ajuda financeira, que não passaria pela barreira de seu parlamento. Na realidade, "uma parte dos ministros tinha claramente na cabeça a ideia de que a melhor solução era a saída [da Grécia] da zona do euro", comenta um participante desse enfrentamento. Segundo essa fonte, Mario Draghi não gostou que a opinião da troika não fosse respeitada.
"Um plano muito ruim", avaliam os gregos
Chefiada pelo novo ministro das Finanças, o muito policiado Euclide Tsakalotos, a delegação grega ao Eurogrupo multiplicou esforços para dar garantias de seriedade. Tratava-se de restaurar a confiança e a credibilidade, duramente deterioradas entre os parceiros. A Grécia se comprometeu a fazer votar leis em um prazo recorde -- antes de 15 de julho! -- imposto pelos credores sobre as principais reformas [ver aqui a lista destas reformas].
O Eurogrupo finalmente produziu um texto, do qual os chefes de Estado deveriam eliminar os últimos pontos de divergência. Uma medida, entre as colocadas sobre a mesa, é doravante considerada indispensável pela Alemanha. Trata-se de um fundo que geriria os ativos gregos a serem privatizados. O projeto de acordo menciona 50 bilhões de euros. Uma cifra muito exagerada segundo Martin Schulz, tendo em vista o valor dos bens suscetíveis de serem privatizados. Esses ativos seriam postos sob arresto ou embargo judicial pelos credores, a fim de resgatar a dívida. Uma perspectiva humilhante para o governo de Tsipras, que se fez eleger prometendo escapar da tutela da troika [Este fundo será estabelecido na Grécia e gerido pelas autoridades gregas sob a supervisão das instituições europeias pertinentes]. Por volta das 22h do domingo, um delegado grego qualificava de "muito penosas" as medidas do Eurogrupo. Os chefes de Estado tentavam achar um meio-termo, especialmente sobre o tema muito sensível desse fundo.
Em troca dessas garantias tangíveis, os chefes de Estado esperavam dar mandato à Comissão e ao Eurogrupo para que se abrissem negociações sobre um terceiro plano de ajuda à Grécia. Esse sinal político forte permitiria ao BCE aumentar sua injeção de recursos financeira e contínua aos bancos gregos desde segunda-feira. A Grécia batalhava para que fosse mencionada a reestruturação de sua dívida no documento final.
A negociação do novo plano de resgate, cujo montante é quantificado pelo Eurogrupo entre 74 e 86 bilhões de euros (dos quais uma parte destina-se ao resgate da dívida dos bancos) poderia durar até o final de julho, explicou uma fonte próxima às negociações. Vários parlamentos, entre os quais o da Alemanha e o da Finlândia, terão que autorizar essas tratativas. Um prazo um pouco longo, avalia uma fonte grega, tendo em vista a situação crítica dos bancos e do Tesouro gregos. Uma "ponte" financeira estava sob análise para permitir à Grécia escapar do calote frente ao BCE no dia 20 de julho.
No final da noite de domingo, a possibilidade de um fracasso não estava apesar de tudo descartada. O documento do Eurogrupo previa explicitamente o "final ruim", ou seja a Grexit.
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