O presidente eleito Donald Trump conversa com repórteres - (Foto: Evan Vucci/AP)
Pra começar, uma atualização da história: durante os últimos nove anos, uns poucos americanos, na maioria liderados pelo nosso agora presidente eleito, insistiram em que Barack Obama é um muçulmano nascido no Quênia.
Durante anos, Donald Trump foi incansável em sua insistência para que Obama provasse acima de qualquer suspeita, além do já comprovado, que havia nascido no Havaí e não no país de seu pai biológico. O fato de Obama dizer que é um cristão não era suficiente para persuadir os seguidores de Trump, que aparentemente sabem distinguir quem é cristão quando veem um.
Além disso, não há fundamento lógico para presumir que uma pessoa jovem que cresceu parte de sua vida em um dado país -- digamos, Indonésia -- necessariamente adote a religião dominante nesse país. Ele(a) poderia entretanto observar que, embora as pessoas tenham seus credos de diferentes modos, somos todos essencialmente iguais. Não importa a cruel e absurda presunção de que ser um muçulmano significa que alguém, ipso facto [por esse mesmo fato - ver postagem anterior], é uma "má pessoa".
Respeitar os outros a despeito de diferenças é, falando genericamente, distintivo de uma alma iluminada assim como é desejável que caracterize um líder. Entretanto, quem apoiou Trump interpretou o lidar suave e brando de Obama com o 1,6 bilhão de muçulmanos do mundo como uma agenda secreta para estimular o Islã nos EUA -- apesar das operações um tanto duras de Obama com drones, que eliminaram um bom número de maus elementos que eram ou se diziam ser muçulmanos.
É digno de nota observar que essas mesmas pessoas que duvidam de Obama não se levantaram em suspeita quando o então presidente George W. Bush visitou uma mesquita imediatamente após o 11 de setembro. Tampouco, por enquanto, manifestaram qualquer preocupação com a abordagem indiferente de Trump com respeito ao ataque cibernético da Rússia contra os EUA.
Considerando-se essa história e as evidências recentes, não seria essa mais ou menos a hora de declarar que Trump é um espião russo?
Não, realmente não creio que ele seja um espião porque, diferentemente dele mesmo, não sou dada a ideias malucas. Mas, o que há com esse estilo de dois pesos e duas medidas? Em circunstâncias semelhantes, quanto tempo você pensa que levaria para que Obama fosse chamado de traidor por defender um país que tentou frustrar nosso processo eleitoral democrático? Isso levaria segundos.
Quão surreal é perceber que o homem que logo se tornará presidente esteve por longo tempo comprometido com um rumor saturado de paranoia e propagado por teóricos conspiratórios, cuja busca pela verdade se interrompe no ponto em que fatos e ignorância deliberada colidem.
Quão perfeitamente terrificante é isso.
E agora? O que obviamente é uma conspiração de lideranças, hackers e espiões russos Trump tem repetidamente rejeitado como exemplo de [serviço de] inteligência desprezível. Por que ele faria isso? Será porque é tão supersensível a críticas que não pode tolerar que alguém pense que foi beneficiado pelo ataque cibernético? Ou será porque sabia do ataque antecipadamente e não quer ser descoberto? É assim que começam as teorias de conspiração. E aí, novamente, algumas vezes uma conspiração é apenas uma conspiração -- e um idiota é apenas um idiota.
Consideremos o que sabemos: o que há de melhor da nossa inteligência indica que a Rússia está por trás da pirataria (hacking) contra o Comitê Nacional dos democratas. Trump, que por longo tempo tem expressado sua admiração pelo presidente russo Vladimir Putin (uma vez um agente da KGB, sempre um agente da KGB), tem suas dúvidas quanto a isso.
Obviamente, Trump quer manter a narrativa de que ganhou de maneira justa e segura. E, claramente, alegações sobre uma interferência russa perturbariam seu ego. Mas é disso que se trata? Ego e narrativa?
Sigamos além: é mais fácil Trump aliar-se com o nosso mais ameaçador adversário geopolítico (crédito para Mitt Romney) [o ex-candidato Romney à presidência americana chamou o regime de Putin de "o inimigo geopolítico número um dos EUA"] do que ele dar ouvidos ao que de melhor temos. Além disso, Trump disse que não receberá resumos diários da inteligência e alegadamente planeja reduzir o número de nossas agências de segurança.
Por favor digam, de que lado está esse homem? Quando foi a última vez que se teve que fazer esta pergunta com relação a um presidente eleito?
Na sexta-feira, 6 de janeiro, Trump se reuniu com espiões americanos reais e outras pessoas que tentaram explicar-lhe algumas coisas, deixando em aberto a pergunta: Trump pode aprender algo? Com base no comunicado dele em seguida ao encontro, parece que não.
Na quinta-feira, James R. Clapper Jr., o diretor nacional de inteligência, disse ao Comitê de Serviços Armados do Senado que a agência está "agora ainda mais determinada" e que Trump está prejudicando a inteligência americana (que não se confunda com a ausência dela, diga-se, Trump). Para completar esse estado de coisas, o ex-diretor da CIA James Woolsey saiu da equipe de transição de Trump na quinta-feira em protesto por estar sendo baipassado.
Em suma, quando o presidente eleito persiste em ficar num estado de negação, juntando-se ao inimigo contra os melhores interesses do seu próprio país, se é forçado a considerar que o próprio Trump representa uma ameaça à segurança nacional.
Na Rússia, chamariam isso simplesmente de traição.
Recebido por email de Iacilton B.Mattos em 13/01/2017:
ResponderExcluirMulçumano, comunista e bolivariano...negro também...
Recebido por email de Moyses Tomaz de Oliveira:
ResponderExcluirTem tudo para seu um dos melhores presidentes do século XXI.