domingo, 21 de julho de 2013

A segurança do Papa Francisco no Rio aumenta a tensão entre o Vaticano e o Brasil

[Reproduzo a seguir a reportagem publicada ontem pelo respeitado jornal espanhol El País. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]

As palavras estão marcadas pela suavidade da linguagem diplomática, mas não encobrem a tensão entre Roma e o Brasil por causa da segurança do papa Francisco, que visita o Rio de Janeiro na semana que vem [é um equívoco mencionar "Roma" e não Vaticano -- Roma é a capital de outro Estado, a Itália]. O papa argentino chega num momento especial. O Brasil está vivendo uma espécie de revolução social e política marcada por manifestações de protesto contra os políticos nas ruas e praças.

Os serviços secretos brasileiros detectaram que a presença do primeiro papa das Américas em território latino-americano levará novamente às ruas milhares de pessoas para reivindicar direitos sociais, e considera as manifestações, que já estão sendo convocadas pelas redes sociais, “o maior perigo para a sua segurança”. O temor fez as autoridades aumentarem de 10.000 para 14.000 o número de policiais e militares encarregados dia e noite da proteção do pontífice numa cidade que, em si, já é violenta. [O Papa precisa inquietar-se, e muito, com a eficiência desses tais "servicos secretos brasileiros" -- o que eles dizem ter "detectado" é uma obviedade ofuscante e nada secreta. Esses caras estão há dois meses mais perdidos que cego em tiroteio com as manifestações de rua em si e com seus bastidores.]

Em Roma, o porta-voz do papa, Federico Lombardi, limitou-se a declarar “confiança total” na segurança do Brasil, ao mesmo tempo em que foi taxativo: “não haverá mudanças no programa da visita”. Foi a sua resposta à ideia das autoridades do Rio de modificar alguns pontos do itinerário papal ao saberem que os protestos sociais se intensificarão.

As autoridades brasileiras tentaram evitar o encontro de Francisco com a presidente Dilma Rousseff, o governador do Rio, Sérgio Cabral e o prefeito da Cidade, Eduardo Paes, no Palácio Guanabara, sede do governo do estado do Rio de Janeiro, onde está prevista uma manifestação de protesto contra o governador e o prefeito. Pensaram que seria melhor o papa se encontrar com as autoridades no aeroporto Tom Jobim, longe da cidade e das manifestações, mas Francisco não cedeu.

As forças de segurança culpam as manifestações pelo possível perigo para a segurança do papa, mas em Roma mandaram dizer que os protestos “não são contra o papa, mas contra os políticos”. Além disso, afirmou o cardeal arcebispo de São Paulo, Odilo Scherer, Francisco “apoia as reivindicações sociais dos jovens” e inclusive dedicará a elas um dos discursos que fará ao milhão de jovens que vai se concentrar na cidade na Jornada Mundial da Juventude (JMJ).

O papa dispensou o papamóvel blindado e anunciou que usará o jipe aberto que usa em Roma para encontrar com os fieis. O papamóvel blindado também foi trazido para o Rio, mas o papa pediu que o “desblindassem”, isto é, que retirassem os vidros à prova de balas. Além disso, Francisco mandou dizer que “não quer homens armados com fuzis” ao seu lado quando desfilar pelas ruas ao encontro dos jovens e dos fieis. Diplomaticamente, o ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, respondeu a Roma que no Brasil “o povo protegerá a vida do papa Francisco”.

O prefeito do Rio tentou convencer a população a não aproveitar a presença do papa e dos cerca de 6 mil jornalistas do mundo todo para irem às ruas com reivindicações sociais. “O papa não é culpado pelos pecados dos políticos. Ele é um elemento de união”, disse ele em uma conferência de imprensa. O prefeito chegou a dizer que os políticos acusados de corrupção pela opinião pública “deviam aproveitar a ocasião e confessar os seus pecados ao papa”. [Dudu Paes, prefeito e humorista.]

Se os serviços secretos não se equivocarem, os desejos do jovem prefeito carioca não serão atendidos. As pessoas apresentarão reivindicações sociais ao papa Francisco mesmo com toda a blindagem militar, e provavelmente os políticos manterão os seus pecados bem guardados nos bolsos.

Em resposta às acusações populares de desperdício de dinheiro público dos políticos, o presidente do Senado, Renan Calheiros, decidiu não cobrir os gastos de muitos deputados e senadores que tinham solicitado transporte para o Rio para encontrar o papa Francisco à custa do erário público. [Era só que faltava, o contribuinte pagar romaria de político! A questão dos custos da viagem do Papa em território brasileiro tem sido enfocada erroneamente, reclamando-se deles por sermos um Estado laico. O problema é que o Papa é também, e indissoluvelmente, um chefe de Estado e como tal tem que ser tratado. Essa dualidade papal tem sido usada dubiamente pela Igreja para "justificar", por exemplo, a visita a ditaduras e ditadores, como no caso da visita de João Paulo II ao Chile e a Pinochet em abril de 1987. É a velha e inexplicável "dificuldade" da Igreja Católica para lidar com problemas terrenos, como por exemplo a pedofilia disseminada de cardeais, bispos e padres, acobertada há décadas pelo Vaticano.

Por falar em custos da viagem papal ao Brasil, só a recepção no Palácio Guanabara custará R$ 850.000,00 aos cofres públicos. Prevista para 650 pessoas, cada participante custará cerca de R$ 1.300,00 ao contribuinte fluminense. Pergunta inocente: que critérios nortearam a escolha desse mundão de 650 pessoas?!]

2 comentários:

  1. Não acredito que seja por inspiração do Espírito Santo que o Papa confia na segurança do Rio de Janeiro. Deve ser inspiração de um outro espírito pouco abençoado. Quanto ao fausto da recepção, pelos seus R$ 850.000,00, não me parece condizente com as palavras que Jesus Cristo pregava. Bem... fica por conta do chefe de estado e não por conta do sucessor de Cristo. De resto, se a idéia de Dudu Alcaide fosse seguida, para a confissão de pecados dos políticos, o Papa não voltaria pro Vaticano esse ano, eu acho.

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